Líderes políticos envolvidos em lavagem e fuga de capitais

Investigação revela que importantes dirigentes políticos, seus familiares ou colaboradores próximos utilizaram sociedade de advogados no Panamá para esconder rendimentos.
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São mais de 214 mil empresas offshore que surgem associadas a 12 atuais e antigos chefes de Estado e outras 130 figuras públicas naquela que é considerada a maior e mais importante revelação de informação confidencial até hoje ocorrida e que compromete nomes como o dos presidente da Rússia, Ucrânia e Argentina, respetivamente Vladimir Putin, Petro Porochenko e Maurício Macri, o do rei da Arábia Saudita, Salman Al Saud, e o dos primeiros-ministros do Paquistão e da Islândia, Nawaf Sharif e Sigmundur Gunnlaugsson.

Conhecida como Panama Leaks, a documentação é constituída por cerca de 11,5 milhões de registos e ficheiros trabalhados pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ, cujas principais conclusões foram ontem reveladas em simultâneo por mais de cem órgãos de comunicação. A lista completa de personalidades e empresas constantes da documentação será conhecida em maio. Esta abrange desde os anos 1970 até finais de 2015 e foi desviada de uma conhecida sociedade de advogados panamiana, a Mossack Fonseca. Foi originalmente cedida há cerca de um ano por um funcionário da Mossack Fonseca ao Süddeutsche Zeitung, que a passou posteriormente ao ICIJ. Aquele elemento, segundo o jornal alemão, além de estritas medidas de segurança, não pediu nada em troca.

No Brasil, a empresa está sob investigação no quadro da Operação Lava-Jato.

A documentação é constituída por registos contabilísticos e financeiros, além de correspondência referente a 214 488 empresas sediadas em offshores. Nela se mostra como aquela sociedade de advogados opera em conjunto com bancos e empresas do setor financeiro, para garantir a aplicação em segredo de importantes somas por dirigentes políticos, seus familiares, nomes constantes nas listas dos multimilionários mundiais, figuras do mundo do futebol e outras celebridades. A conclusão é que a grande maioria dos Estados nacionais são privados de significativos rendimentos fiscais por esta prática concertada.

Entre os dados revelados constata-se que nomes do círculo próximo de Vladimir Putin têm depósitos estimados em mais de dois mil milhões de dólares em paraísos fiscais, o mesmo se aplicando a empresas alvo de sanções dos Estados Unidos, por terem negócios com países como a Coreia do Norte e o Irão, os cartéis do narcotráfico mexicano. Uma dessas empresas é citada como tendo vendido combustível para os aviões de combate sírios. No caso russo, há pelo menos sete empresas offshore que estão ligadas a um próximo de longa data de Vladimir Putin, o violoncelista Sergei Roldugin.

Um aspeto a salientar é que a grande maioria da atividade da Mossack Fonseca e seus parceiros se integra no quadro da legalidade, mas, por vezes, não são seguidos todos os procedimentos delineados pela lei, em particular quando existe a dúvida ou a certeza de que as pessoas ou entidades que recorrem aos serviços daquela sociedade poderão estar envolvidas no crime organizado, em situações de evasão fiscal ou de corrupção, lê-se numa sinopse do ICIJ, em que se passa em revista algumas das descobertas mais relevantes. Em si, como nota o ICIJ, operar a partir de uma empresa com sede num paraíso fiscal não é uma ilegalidade - a origem dos fundos e a forma como são usados, e o facto de se fugir a obrigações fiscais nos países de origem é que configura o ato ilícito ou ilegal.

Entre as revelações ligadas a dirigentes mundiais está o facto de familiares próximos do presidente chinês, Xi Jinping, e familiares da grande maioria dos elementos do órgão de topo do Partido Comunista Chinês terem investimentos em offshore. O setor bancário surge em lugar de destaque no processo de criação de empresas fantasmas em paraísos fiscais - como o próprio Panamá, as Bahamas, a ilha de Man, o Belize, a Nova Zelândia, o Wyoming, o Nevada e mais de uma dúzia de outros locais da mesma natureza - para garantir total segredo e privacidade às contas dos seus clientes. A sinopse do ICIJ cita especificamente a UBS e o HSBC.

Num comunicado, a Mossack Fonseca garante "não promover quaisquer atos ilegais".

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