Liberty: pressão para vencer antes de casos de doping

Dopagem planeada tendo em conta a Volta a Portugal, com injecção de CERA aos ciclistas com mais hipóteses de vencerem e ao corredor mais forte nos momentos complicados
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A sucessão de acontecimentos que levou à detecção de três casos de doping na Liberty Seguros revela que o uso de dopantes foi planeado e organizado de modo que o desempenho dos ciclistas na Volta a Portugal de 2009 fosse manipulado, ludibriando os controlos antidopagem. Antes dos positivos que levaram ao fim da equipa, os dirigentes da União Ciclista da Charneca foram avisados de que o patrocínio da Liberty estava em risco por falta de resultados.

A indicação de que o clube estava sob pressão foi dada pelo próprio administrador-delegado da Liberty Seguros, José António de Sousa, no depoimento que prestou ao instrutor do processo, Nuno Ribeiro, que o DN consultou. O ciclista português e os espanhóis Hector Guerra e Isidro Nozal acusaram uso de CERA em testes pré--competição realizados antes da Volta a Portugal. No seu testemunho, António de Sousa contou que, após a Volta ao Alentejo, enviou e-mail ao presidente do clube, Vítor Paulo Branco, "dizendo-lhe que achava inadmissível que a equipa, com o plantel e o orçamento de que dispunha, não ganhasse as provas em que participava. E que, por isso, após a Volta a Portugal, teriam de fazer um balanço para decidir se justificava à empresa Liberty continuar a apostar naquela equipa".

Questionado sobre se o patrocínio se manteria caso a equipa não vencesse a principal prova do calendário português, o administrador-delegado da seguradora garantiu que "certamente o contrato seria revisto" e "não seria de excluir a hipótese de abandonarem mesmo o apoio à equipa". Mas António de Sousa admitiu não ter uma cópia do e-mail que enviou a Vítor Paulo Branco, e o presidente do clube negou ter recebido esta mensagem ou outras pressões, argumentando que o contrato de patrocínio terminaria apenas este ano.

No relatório final, apesar da falta de provas contra outros dirigentes que não o médico, o instrutor do processo destacou vários dados que indiciavam a "existência de uma prática organizada dentro da equipa", incluindo o facto de Nuno Ribeiro ter acusado positivo na véspera da Volta e não nos testes seguintes: "Isto demonstra-nos inequivocamente que a administração da substância dopante foi feita tendo em atenção a data de início da Volta, altura em que, à partida, o arguido seria controlado mas em que a substância já não seria detectada na urina." Estratégia que passava por dopar os ciclistas com melhor historial na prova (Ribeiro e Guerra) e o mais forte nos momentos difíceis (Nozal), mas que falhou devido aos controlos surpresa.

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