Liberdade de criação é basilar
O artigo 19.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem é claro todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e expressão. Sobretudo tratando-se de caricaturas, sublinharam, ontem, os especialistas em direito penal e constitucional, no debate sobre Liberdade de Expressão, na Universidade Católica, que ficou marcado pela polémica em torno dos cartoons de Maomé (ver pagina 3).
Foram muitos os exemplos sobre a mesa e as comparações com outros casos, muitos os argumentos esgrimidos para explicar que, apesar de não ser ilimitada (a própria análise dos limites varia consoante os países), a liberdade de expressão deve ser defendida a todo o custo, independentemente do conteúdo da ideia ou da reputação de quem a divulga. É nisso que se traduz o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões ou por difundir informações por qualquer meio de expressão.
"Não se protege a mensagem pelo seu valor intrínseco, sob pena de se atentar contra a consagração da própria liberdade e fomentar a censura", explica o penalista Pedro Garcia Marques, adiantando que os cartoons de Maomé não violaram a ordem jurídica nem incitaram à violência, apesar de ela ter estalado entre os muçulmanos. E compara "O Fernando Rocha também conta anedotas sobre ciganos e eles contestam-nas, sem que com isso haja violação jurídica."
Os limites à liberdade de expressão são definidos para proteger outros direitos constitucionalmente garantidos (como o direito à vida privada, à identidade e ao bom nome), mas cada caso é distinto. "A caricatura usa uma linguagem satírica, é aí que reside o seu valor", advoga o constitucionalista Jorge Pereira da Silva, sustentando que a liberdade de criação cultural goza de uma amplitude ainda maior que a liberdade de expressão. Por isso mesmo as reacções não podem tornar a conduta do caricaturista criminosa, "sob pena de se dar demasiada importância a hipersensibilidades", conclui.