Legislativas francesas:uma macronite aguda

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AFrança está a ser atingida por uma macronite aguda? Um entusiasmo contagiante pelo novo e jovem presidente Emmanuel Macron, vencedor das presidenciais de 7 de maio? Os franceses são chamados a ir às urnas, no domingo 11 de junho, para a primeira volta das legislativas e estão prestes a dar uma maioria absoluta ao La République En Marche (LREM), segundo as sondagens. O chamado LREM, ou às vezes REM, é composto pelo partido do presidente e pelo Modem, do centrista François Bayrou, atual ministro da Justiça, que se juntou entre as duas voltas das presidenciais ao dinâmico Macron. O resultado até agora assimila-se a um plebiscito: os deputados LREM ficariam com 385 a 415 das 577 cadeiras que cabem no Palácio Bourbon, sede da Assembleia Nacional. A confirmar-se, o jovem presidente, que precisa de uma forte maioria no Parlamento para levar a cabo a sua "política diferente", poderia ficar tranquilo. Emmanuel Macron tem a intenção de avançar rapidamente, muito rapidamente em várias áreas, mas sobretudo com a reforma do Código do Trabalho. Até agora manteve uma certa neblina sobre o conteúdo das suas reformas, mas tinha anunciado a intenção de usar as ordonnances para impor a mudança da lei do trabalho e impor novas regras de flexissegurança.

Macron tem como objetivo retirar ou limitar o poder dos sindicatos na negociação coletiva, para permitir a aplicação de medidas de flexibilidade dentro da empresa, até por referendo entre funcionários, se for necessário. As empresas teriam a iniciativa do diálogo social. Mas o presidente tem outro projeto em vista: o fundo de desemprego. O chefe do Estado francês quer entregar a gestão das indemnizações aos desempregados sob a cúpula do Estado. E quer aumentar a contribuição social geral para poder pagar indemnizações aos trabalhadores que não tinham direito ao subsídio de desemprego até agora. As ordonnances são um instrumento que permite à Assembleia delegar o seu poder legislativo ao primeiro-ministro e ao seu governo. Nos termos da Constituição, esta ferramenta é frequentemente utilizada em particular para aspetos altamente técnicos. Mas raramente para questões estruturais e tão delicadas como o Código do Trabalho. Nos últimos dias, os media franceses têm anunciado que o projeto do presidente vai ser bem mais pesado do que aquilo que ele tinha afirmado na campanha eleitoral e, em particular, a sua intenção de confiar às empresas a definição e o quadro do contrato de trabalho, a sua forma e duração. O primeiro-ministro, Édouard Philippe, e a ministra do Trabalho, Muriel Pénicaud, negam a existência de um plano escondido. Porém, apenas uma Assembleia Nacional quase inteiramente rendida ao macronismo vai aceitar desistir do seu papel como válvula de segurança entre o governo central e o povo. Um povo que sempre reagiu de acordo com as sondagens está-se a preparar para votar a favor dos deputados que apoiam o presidente.

O charme de Macron, que advém do seu discurso claro e direto, da sua juventude e dos seus primeiros sucessos na diplomacia internacional (ah, os apertos de mão viris de Manu com Trump, Putin, etc...), funcionam bem com o povo francês. O mesmo povo que se manifestou longamente e, às vezes, de forma brutal, como em 2016, contra a lei do trabalho da ministra El Komri, que era fortemente apoiada pelo ministro da Economia da época, um tal... Emmanuel Macron.

Na França de hoje é difícil ser-se um pouco crítico do En Marche! e falar dos riscos reais de se ver aparecer uma terceira volta das legislativas, desta vez nas ruas. De facto, o vento sopra a favor do presidente, como comprova a primeira volta antecipada das legislativas para os franceses que vivem no estrangeiro. Em dez dos 11 círculos eleitorais que reúnem os meus compatriotas fora de França, o REM está em primeiro. Em Portugal (o 5.º circuito, com Espanha e Mónaco), a senhora Cazebonne obteve 50,36% dos votos na primeira volta do escrutínio. Mas menos de 25% dos eleitores inscritos votaram na candidata que terá de se apresentar na segunda volta a 18 de junho. Note-se que em Portugal 125 votos foram para a Frente Nacional, votos de pessoas que optaram por viver em Portugal - portanto, que decidiram adotar, de certa forma, um estatuto de imigrante - e que escolheram o representante do partido mais anti--imigração e antiestrangeiro. As razões para isto estão ainda por determinar com precisão, mas Macron não deverá esquecer que ele foi eleito em grande parte pelo voto contra a Frente Nacional de Marine Le Pen. No domingo 11 de junho, o nível de abstenção será um verdadeiro teste para o golden president.

Correspondente de media franceses

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