Justiça que protege é a mesma que expõe
A Justiça portuguesa faz agora o pleno no que diz respeito aos grande poderes instituídos. Tem em mãos processos que atingem a política, a banca, o futebol e a própria Justiça. A mão-cheia de nomes sonantes que passaram à condição de arguidos - com particular destaque para o juiz Rui Rangel e o presidente do Benfica Luís Filipe Vieira - mostra que há determinação do Ministério Público (MP) em investigar e combater o fenómeno da corrupção nos territórios onde ele potencialmente pode germinar.
Que desfecho vão ter os processos de José Sócrates, de Ricardo Salgado ou este da Operação Lex, ou ainda o de dois antigos secretários de Estado da Justiça acusados de uso indevido do dinheiro público, este caso também ainda quentinho a sair do forno das novidades do MP de terça-feira, está longe de se saber. Se as suspeitas de corrupção serão ou não provadas só se conhecerá no final do jogo, perdão, dos julgamentos destes casos (e se todos forem à barra do tribunal).
A determinação do Ministério Público e de quem o lidera, a atual procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, é inquestionável na tentativa de tornar o ar mais limpo neste país que ainda é muito poluído por muitas moscambilhas, só que algumas consentidas socialmente. Práticas que minam a democracia e tornam a sociedade mais desigual, ainda que só se perceba quando escancaradas.
Mas como diria o recém-eleito líder do PSD, Rui Rio, se o ar promete ficar mais limpo, as práticas do MP, dos agentes que lá trabalham, ainda são muito questionáveis. Os casos de ontem são prova disso mesmo. Os processos e o número de arguidos foram tornados públicos sem revelar nomes. A reserva da Justiça, com prejuízo para o nosso trabalho de jornalistas, era proporcional à presunção de inocência dos suspeitos. Mas ao mesmíssimo tempo que o MP emitia comunicados anódinos, os nomes dos arguidos saltavam como pipocas nos meios de comunicação. E, como não foram confirmados judicialmente, prestaram-se a desmentidos - no caso do Benfica, que assegurava que o presidente do clube não era arguido - e a alguma hesitação no tratamento jornalístico dos casos. A PGR só ontem, pressionada pela notoriedade de Luís Filipe Vieira, confirmou que o dirigente desportivo é suspeito no processo Lex.
Temos um Ministério Público a fazer de conta que há segredo de justiça quando não há. E se não há pede-se transparência quando suspeitos de crimes vários passam à condição de arguidos. Caso contrário só alguns são julgados na praça pública e há especulação porque não se sabe de que crimes são acusados. Isto não é compatível com uma Justiça determinada e corajosa.