Júlio Machado Vaz devolve medalha da cidade
Júlio Machado Vaz devolveu hoje à Câmara Municipal do Porto a medalha da cidade. O psiquiatra utilizou ontem o Facebook para explicar que a Comunidade de Inserção Paulo Vallada, a que preside, vai fechar as portas e para denunciar a falta de apoios que teve para assegurar a manutenção da mesma.
"Se a Paulo Vallada fecha as portas no concreto, é minha obrigação defender-lhe a dignidade, de que sou um dos garantes, e que não será devolvida com as chaves. E por isso, amanhã mesmo, a minha Medalha será devolvida à Câmara. Dir-me-ão que se trata de um mero gesto simbólico. É verdade, mas por trás dos símbolos vivem ideias, maneiras de ver o mundo e de nele estar", defende Júlio Machado Vaz, no final de um texto longo em que diz que, racionalmente, considera ter esgotado todas as portas em que podia bater, embora, no fundo, se questione se realmente fez tudo ao seu alcance para salvar a instituição.
A Comunidade de Inserção Paulo Vallada tinha por missão acolher jovens grávidas ou com filhos recém-nascidos em situação de risco. "Neste momento as nossas meninas/mães vão sendo encaminhadas para outras instituições ou seguem os trajetos de vida já iniciados", anuncia o psiquiatra e sexólogo, que, depois de agradecer a todos os que deram apoio, se volta para os "que muito prometeram e nada cumpriram", a quem deixa "o que já lhes pertence - espelhos e consciências". A exceção é a Câmara do Porto, a quem, diz, deixa algo seu, a medalha.
Júlio Machado Vaz conta que, há quase dois anos, conseguiu resposta positiva para um pedido de ajuda que fez à Câmara mediante "a legítima exigência de uma redução de custos do funcionamento". "O que foi feito em três meses, com dois despedimentos e redução da restante massa salarial", diz. Só que depois disso, queixa-se, "nada aconteceu, de um momento para o outro os canais de comunicação deixaram de funcionar; silêncio absoluto".
Quando contactado para ser agraciado pela Câmara com a Medalha Municipal de Mérito - Grau Ouro, em julho de 2015, diz, "as promessas foram renovadas". Mas o tempo foi passando e, garante, nada aconteceu. Até que em janeiro, quando aceitou apresentar um livro nos Paços do Concelho, "todas as promessas foram repetidas". Mas, quando no início deste ano surgiu a notícia de que a Paulo Vallada precisava de mudar de instalações, lembra, um pedido de reunião ficou sem resposta.
Sem saber se de uma reunião poderia surgir a solução, Júlio Machado Vaz diz que agora "na Comunidade já se 'lavam os cestos'". "Quero acreditar que fiz tudo o que podia pelas nossas meninas/mães e seus cachopos e pela minha equipa. Preciso de acreditar, em minha casa também há espelhos", afirma. "Está tudo dito e feito; é tempo de luto", remata.
Manuel Pizarro, vereador da Câmara do Porto a quem Machado Vaz se refere especificamente no texto, afirmou, numa resposta escrita enviada à Lusa, que a Câmara é "alheia ao facto de a Comunidade ver-se privada das suas instalações", o que terá a ver com a venda do imóvel onde esta funciona, que era propriedade da Fundação da Juventude.
No entanto, reforça "a disponibilidade já assumida de ajudar a resolver os problemas de acordo com os recursos ao seu alcance". "A Câmara conhece a situação e as dificuldades que atravessa a Comunidade de Inserção Paulo Vallada, que faz um valioso trabalho de proteção de mães em dificuldades e dos seus filhos", refere Manuel Pizarro.
Ricardo Carvalho, presidente executivo da Fundação da Juventude, explicou à Lusa que aquela instituição acolheu a Comunidade Paulo Vallada durante dez anos mas que o projeto foi "autonomizado há três". Apesar disso, disse o responsável, a Fundação da Juventude continuou a apoiar a Paulo Vallada, nomeadamente mantendo a cedência das instalações onde o projeto funcionava.
"No final de 2015 deixou de ser possível manter esse apoio e informamos a Comunidade, tendo mantido a disponibilidade para ajudar e o acompanhamento do processo", indicou.
Contactado pela Lusa, o Instituto de Segurança Social (ISS) assegura que, "no âmbito das suas competências, vai continuar a acompanhar o processo em curso e em total colaboração com a Associação Acolher e Cuidar para a Cidadania", a IPSS constituída para gerir a Paulo Vallada quando esta se autonomizou da FJ.
O ISS acrescenta que, estando a "decorrer o processo de venda do imóvel" onde estava o projeto, a FJ "comunicou a denúncia do contrato de comodato, sendo o prazo para desocupação das instalações o dia 01 de outubro".
De acordo com o ISS, "até à data, a instituição não encontrou instalações alternativas adequadas".
"O eventual encerramento não tem por fundamento qualquer decisão do ISS, sendo os motivos do encerramento da resposta social totalmente alheios a este Instituto", acrescenta.