O juiz Carlos Alexandre não irá a julgamento pela distribuição manual do processo Operação Marquês, decidiu esta sexta-feira o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) na conclusão do debate instrutório aberto a pedido do advogado de José Sócrates. O defensor do ex-primeiro-ministro, entretanto, admitiu que vai analisar um eventual recurso para o Supremo Tribunal de Justiça..Em declarações aos jornalistas à saída da leitura da decisão instrutória, proferida pelo juiz desembargador Jorge Antunes na terceira e última sessão da fase de instrução, o advogado Pedro Delille queixou-se de deixar a Relação de Lisboa sem a sentença e vincou que a distribuição manual do processo Operação Marquês, em 2014, não foi esclarecida.."É uma decisão que posso dizer que não me surpreende, nem pela parte corporativa de manterem a não pronúncia, nem pela parte das limitações que estão a dar à publicidade deste processo. Saio daqui sem a sentença. Não sei se há motivo para recurso, mas parece-me que sim. Vamos analisar isso e juntaremos os recursos internos, vamos tentar que o sistema português também reconheça que este tipo de processos não pode ficar por esclarecer", disse..Na leitura da decisão, no salão nobre do TRL, o juiz desembargador Jorge Antunes entendeu que o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) e a escrivã Maria Teresa Santos não têm de responder pelos crimes de abuso de poder, falsificação por funcionário e denegação de justiça pelos quais vinham acusados pela distribuição manual do processo, ocorrida em 2014.."A resposta é clara: Perante o acervo probatório não é de todo provável que o tribunal em julgamento se convença, além de toda a dúvida razoável, dos factos imputados pelo assistente aos arguidos. Os factos não estão indiciados nos autos. Nada mais se revelou suportado, quer por meios de prova direta, quer indireta", afirmou o juiz desembargador..Durante pouco mais de uma hora foi feita a explicação dos factos considerados suficientemente indiciados e não suficientemente indiciados, acabando por concluir que a tese de alegado conluio entre o juiz de instrução e a escrivã para o primeiro ficar com o processo Operação Marquês a seu cargo é "manifestamente incongruente e inconciliável" e que "não se mostra minimamente fundamentada" nestes autos.."Em fase de julgamento seria merecedora de igual aceitação. Tudo aponta (...) para a mais que provável absolvição dos arguidos quanto aos crimes imputados pelo assistente", observou o juiz desembargador, continuando: "Em face do exposto decido não pronunciar os arguidos Carlos Alexandre e Maria Teresa Santos pelos crimes de abuso de poder, falsificação por funcionário e denegação de justiça imputados pelo assistente José Sócrates"..Na fase inicial da leitura, o juiz desembargador do TRL rejeitou duas nulidades invocadas pelo advogado do antigo governante, nomeadamente em relação ao despacho que decidiu o segredo de justiça no caso Operação Marquês e sobre uma alegada "manifesta insuficiência do inquérito", uma vez que o assistente no processo apontava a existência de falhas.."Só ocorre nulidade quando no inquérito se omitem atos legalmente obrigatórios e não é o caso. O Ministério Público [MP] tem, nos termos legalmente previstos, autonomia para determinar no âmbito do inquérito os atos de investigação a que deve proceder. Não sendo atos de realização obrigatória, o MP usa a sua autonomia e dirige o inquérito, sujeitando-se às consequências e possíveis impugnações que o inquérito possa suscitar", explicou..Considerando que "a instrução não corresponde a um prolongamento do inquérito", o juiz desembargador Jorge Antunes lembrou que esta fase processual "tem as suas finalidades previstas na lei" e que iria apreciar apenas "o acerto da decisão de arquivamento", rejeitando a sua transformação num novo inquérito: "Não se trata de enxertar no processo penal um segundo inquérito que tenha as mesmas finalidades do inquérito do MP"..Quanto à distribuição do processo Operação Marquês, o juiz do TRL reconheceu ter ficado suficientemente indiciado que "entre setembro e novembro de 2014 a plataforma Citius teve constrangimentos técnicos que afetaram a sua operacionalidade, quer em termos de acesso, quer em termos de utilização", na sequência da reorganização judiciária de 2014..Também observou que, apesar da existência de problemas no acesso e funcionamento da plataforma eletrónica, houve apenas um pedido em 06 de setembro de 2014 ao IGFEJ da parte da então presidente da Comarca de Lisboa -- após solicitação da escrivã Maria Teresa Santos -- para que os "contadores fossem colocados a zeros" entre os dois juízes de instrução do TCIC (à época, Carlos Alexandre e João Bártolo), algo que foi efetuado nesse mesmo dia..Jorge Antunes recuperou ainda o que disse ser o "cerne da acusação alternativa que o assistente apresentou" e imputou aos arguidos no requerimento de abertura de instrução, no qual o antigo primeiro-ministro defendia que o juiz Carlos Alexandre teria agido "pelo gosto em ter poder, vaidade e fazer cumprir intenções políticas".."Combinaram entre si planear e vieram a conseguir, em comunhão de esforços e diligências que, aquando da primeira remessa do processo Marquês pelo DCIAP, a senhora oficial de justiça garantisse que juiz requerido ficasse a exercer as funções e os poderes sobre o processo, tendo em vista prolongar a devassa da sua vida", relembrou o desembargador..O debate instrutório deste caso decorreu no TRL, depois de o advogado do ex-governante, Pedro Delille, ter pedido a abertura da instrução, o que foi deferido em 11 de fevereiro. O juiz desembargador Jorge Antunes confirmou então a constituição de Carlos Alexandre e Maria Teresa Santos como arguidos na distribuição do inquérito da Operação Marquês em 2014..A primeira sessão, em 28 de março, ficou marcada por acusações mútuas de perseguição entre as defesas, com a advogada do juiz Carlos Alexandre a defender que é o ódio que move o ex-primeiro-ministro José Sócrates..O Ministério Público e os advogados de defesa pediram a não pronúncia dos arguidos pelos crimes que lhes são imputados pelo assistente José Sócrates..O pedido de abertura de instrução de José Sócrates ocorreu depois de o MP ter arquivado o inquérito sobre esta matéria. Antes, também o Conselho Superior de Magistratura (CSM) havia realizado um processo de averiguações e um procedimento de inquérito que culminaram igualmente em arquivamento..O juiz Carlos Alexandre foi constituído arguido no caso da distribuição do processo Operação Marquês, depois de o Tribunal da Relação de Lisboa ter aceitado o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo ex-primeiro-ministro José Sócrates..Por despacho do juiz desembargador Jorge Antunes, no passado dia 11 de fevereiro, foi declarada aberta a instrução pedida por José Sócrates, passando assim o juiz Carlos Alexandre e a escrivã Maria Teresa Santos a assumir a qualidade formal de arguidos neste processo e ficando sujeitos a termo de identidade e residência.