Jordi Savall recebe prémio na Gulbenkian
Músico mundialmente famoso e um dos absolutamente consagrados especialistas em música antiga dos nossos dias, Jordi Savall , de 74 anos, foi homenageado ao final da tarde de segunda-feira no Auditório 3 da Fundação Gulbenkian, local onde se realizou a cerimónia de atribuição do Prémio Europeu Helena Vaz da Silva para a Divulgação do Património Cultural, organizada pelo Centro Nacional de Cultura, entidade que criou este prémio em 2013.
A escolha de Jordi Savall como "sucessor" de Orhan Pamuk (2014) e Claudio Magris (2013) foi anunciada em meados de julho, conforme o DN noticiou na altura, e reconhece o seu "contributo para a celebração da história multicultural da Europa", conforme se lê na laudatio.
A cerimónia contou com intervenções de Guilherme de Oliveira Martins (presidente do CNC e presidente do júri) e do musicólogo Rui Vieira Nery - um amigo de longa data do maestro catalão -, além de uma mensagem do tenor e maestro Plácido Domingo (lida na ocasião), enquanto presidente da Europa Nostra, principal organização europeia de defesa do património e parceira deste Prémio.
Também presentes estiveram os jornalistas Adrian Lloyd Hughes e Rafael Fraguas, que receberam Menções Especiais do Júri.
Este evento ocorreu escassas 24 horas após um concerto de Jordi Savall no Grande Auditório da Fundação, ao lado do seu mítico agrupamento Hespèrion XXI. Em "formato" octeto, alinhava nomes como os dos gambistas Philippe Pierlot e Sergi Casademunt, do organista Michael Behringer ou do companheiro de sempre, o percussionista Pedro Estevan. Juntos, empreenderam uma viagem pela Europa da música entre os anos de 1500 e 1700, afinal, os 200 anos centrais na carreira de mais de quatro décadas de Jordi Savall. Carreira que, afortunadamente, passou numerosas vezes por Portugal: do Porto e Póvoa de Varzim a Loulé ou Santiago do Cacém, sem contar as muitas visitas a espaços vários de Lisboa, quase sempre sob os auspícios da Fundação Gulbenkian.
Grande especialista da viola da gamba (instrumento aparentado ao violoncelo muito popular na Europa entre os séculos XVI e XVIII), maestro, humanista, Jordi Savall tem dedicado a sua vida à música dos séculos XV a XVIII, com especial ênfase na do mundo europeu mediterrânico, tendo sido responsável pela redescoberta e devolução aos ouvidos modernos de um vastíssimo repertório esquecido, desde os mistérios medievais espanhóis à música da diáspora sefardita, passando pelas tradições musicais arménias ou turcas otomanas. A abrangência do repertório de Savall é de tal ordem que ele pode ser designado como "o músico enciclopédico" destes séculos da história da música ocidental e mediterrânica.
Savall criou os agrupamentos Hespèrion XXI, Capilla Reial de Catalunya e Le Concert des Nations; criou um festival de música antiga num lugarejo no sul de França, em Fontfroide; e criou a sua própria editora, a Alia Vox, no final dos anos 90. A Alia Vox, que incorporou o catálogo anterior do músico (no total, já são quase duas centenas e meia de discos que ostenta no catálogo!), é o perfeito mostruário da atividade multifacetada de Savall no domínio dos repertórios, cuja pesquisa aturada transparece invariavelmente dos textos incluídos nas edições (amiúde, são mesmo livros-CD).
Companheira de sempre da sua carreira foi, até à sua morte (em 2011), a mulher Montserrat Figueras. Os filhos do casal, Arianna e Ferran, são também músicos (Arianna esteve há uma semana na Gulbenkian), embora num domínio mais de fusão com tendências world music.
Savall é Embaixador da UE para o Diálogo Intercultural desde 2008 e Embaixador de Boa Vontade da ONU ("Artistas para a Paz") desde 2009. Em Portugal, é doutor honoris causa da Universidade de Évora.
Dele é a frase: "A medida da importância e significado da música é determinada apenas pelo seu grau de intensidade expressiva, riqueza interior e humanidade". A fusão de música e humanismo, em suma, que este Prémio reconheceu.