"John Wick 2", uma elegante coreografia da violência

A inestimável personagem de Keanu Reeves está de regresso. John Wick adiou a reforma para nos dar mais e melhor ação.
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"O homem. O mito. A lenda." Ainda que o cinema se encontre recheado de figuras assim, não se pode dizer que John Wick seja apenas mais uma personagem na categoria. Porquê? Porque os melhores filmes de ação vivem do carisma de indivíduos que, empunhando uma arma com atitude, lutam e reagem aos adversários num singular gesto coreográfico. Em John Wick esse gesto é, simultaneamente, adestrado e selvagem, uma linguagem corporal que se liberta e molda o jogo da violência. Keanu Reeves, de regresso neste segundo capítulo da franchise lançada em 2014, enquanto assassino titular, continua a dar bem conta do recado e é dono e senhor de uma rara elegância performativa.

Com a morte da mulher ainda presente no espírito, John Wick mantém uma postura melancólica nas horas vagas que, embora não seja suficiente para traduzir o filme num conto de solidão, confere-lhe uma base narrativa indispensável. Sabemos que o realizador Chad Stahelski está mais preocupado em arrancar aquele corpo da turbulência emocional para a física, mas não deixamos de apreciar os escassos momentos em que vemos Wick vulnerável, entregue às memórias e dedicado ao único amigo fiel... o cão.

Como seria indispensável para o prosseguimento da saga, a tentativa de se aposentar da atividade do crime (depois de uma vigorosa cena de abertura, com uma perseguição automóvel) acaba mais uma vez gorada. O passado vem atrás dele, na figura de um gangster italiano que o obriga a honrar um antigo juramento de sangue, cobrando uma missão indesejável. E, já que o código de honra entre criminosos é coisa séria, o essencial é despachar o assunto em grande estilo.

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Para o efeito, John Wick segue para Roma, o local do crime, onde começamos por assistir a requintados preparativos, a saber, a escolha de um fato com talhe específico para a circunstância, e uma conversa sobre o armamento, que se desenvolve pela metáfora da ordem de pratos numa refeição... Ainda que os diálogos não sejam o forte de John Wick, os poucos que existem convertem-se em preciosos detalhes humorísticos. Por falar nisso, é de esperar igualmente um pitoresco reencontro entre Reeves e Laurence Fish-burne, a piscar o olho à sua história partilhada em Matrix...

Operática, intensa e visualmente sugestiva, esta ação dirigida por Stahelski (que começou no cinema como duplo) tem todas as qualidades de um filme inspirado tanto no universo das artes marciais com no género do musical. Por estranho que pareça, o realizador é um confesso entusiasta de musicais, e o movimento incessante que vemos em John Wick 2 tem muito que ver com a possibilidade de um cenário graciosamente violento (daí que a música seja aqui tão importante). De um tiroteio em catacumbas romanas a outro numa sala de espelhos - que nos lembra A Dama de Xangai (1947), de Orson Welles -, eis um filme de frenética sofisticação.

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