Jogos perigosos

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A certa altura da conversa com Abel Ferrara, houve um pequeno desvio motivado pela importância que a música, em particular as canções, sempre têm nos seus filmes. Falámos de Dangerous Game (1993), em que, apesar de ter o principal papel feminino, Madonna não canta. E perguntei-lhe se era verdade a informação que tinha circulado sobre a desilusão de Madonna e do próprio Ferrara quanto aos resultados do filme: "Não, pelo contrário, fiquei muito contente com o filme, ela é que não - na altura, pelo menos; não sei o que pensa agora." Em boa verdade, talvez seja a mais extraordinária performance de Madonna no cinema. Seja como for, o caso é sintomático de várias formas de banalização das convulsões internas da história dos filmes e do cinema. Madonna, precisamente, continua a ser excluída dessa história, apesar de ter participado num dos símbolos mais puros do cinema independente da década de 1980 (Desesperadamente Procurando Susana, 1985, de Susan Seidelman), num momento decisivo da evolução estilística e técnica dos blockbusters (Dick Tracy, 1990, de Warren Beatty), ou ainda num dos mais elaborados "desvios" da história do musical (Evita, 1996, de Alan Parker) - isto sem esquecer o prodigioso e quase sempre esquecido Sombras e Nevoeiro (1991), de Woody Allen. Ferrara, por sua vez, consegue em Dangerous Game uma rara exposição dos meandros de uma rodagem cinematográfica, em particular através do confronto, de uma só vez mental e anímico, entre um cineasta (Harvey Keitel) e a sua atriz principal (Madonna). Jogo perigoso, sem dúvida, como sugere o título. Para a história pitoresca que estas coisas sempre envolvem, registe-se que Dangerous Game nunca teve exibição comercial em Portugal, tendo sido lançado em DVD com o título Linha de Separação. Como?

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