"O PS não deve entregar-se a sessões de catarse e autoflagelação"
João Galamba deixa de ser porta-voz do PS, garante que foi por decisão própria. Diz que a escolha feita em 2015 não foi conjuntural e poupou muitos dissabores ao PS, mas não antecipa se será para repetir. E defende que uma "catarse coletiva" por causa de Sócrates seria um exercício pouco útil ao partido.
Saiu da Comissão Permanente e deixa as funções de porta-voz do partido. Porquê?
Foi-me feito um convite para o Secretariado Nacional, aceitei e pedi para ficar só no Secretariado.
Porquê?
Porque quero dedicar-me mais ao Secretariado Nacional e porque tenho duas filhas pequenas, são muitas reuniões, normalmente à noite.
Foi uma saída a pedido, portanto.
Pedi para sair da Comissão Permanente, portanto... Não posso ser porta-voz de um órgão ao qual não pertenço.
Entrou no PS e assumiu protagonismo no tempo de José Sócrates. Este maior resguardo agora tem alguma relação com isso?
Não. Posso mesmo garantir que não tem nenhuma relação.
Este congresso decorre antes de um ciclo eleitoral que terá europeias, legislativas e autárquicas. O que espera destes dois dias?
Que seja um grande debate do partido e o momento em que se inicia a mobilização para o ano que falta até às [legislativas]. Vai ser um ano muito importante, em que se espera que o PS tenha grandes vitórias.
O PS deve pedir maioria absoluta?
O PS deve procurar apresentar o resultado das suas políticas e um programa que as pessoas identifiquem como sendo merecedor do seu voto.
O congresso não discute a liderança, mas o PS parece estar já a preparar o pós-Costa. Também é o congresso que entroniza o pedronunismo?
Este congresso é sobre a liderança do António Costa, sobre as moções a debate, não se debaterão futuras lideranças. A liderança que importa neste momento é a que temos.
Mas o pré-congresso não foi um momento de afirmação de uma nova geração e de um protagonista, Pedro Nuno Santos?
Há afirmação de uma nova geração no debate de ideias, o Pedro Nuno Santos apresentou uma moção... Uma das coisas de que o PS deve estar satisfeito é o debate suscitado antes do congresso. Confesso que me agradou muito acordar de manhã, abrir jornais e ver todos os dias artigos de militantes mais ou menos destacados do PS. Foi bom ver um congresso antecedido de um debate de ideias desta natureza.
E nesse debate o PS deve seguir mais à esquerda ou por uma via mais moderada, como defendeu Augusto Santos Silva?
O PS deve interpretar as razões do seu próprio sucesso. Na minha opinião, a escolha feita em 2015 não foi conjuntural, foi uma escolha existencial. O PS não fez apenas uma aliança para garantir a maioria, deu a resposta de que o país precisava, mas também que a história do PS exigia para continuar a ser uma força política relevante e dominadora à esquerda. Não ter viabilizado um governo de direita e ter constituído uma maioria alternativa não é um evento circunstancial cuja importância devamos desvalorizar. Foi uma escolha fundamental que evitou ao PS muitos dissabores, que estão a atingir quase toda a nossa família política na Europa.
O PS deve repetir essa solução?
Quero que o PS tenha o melhor resultado possível, mas há sempre necessidade de compromisso e diálogo, e o diálogo prioritário deve ser à esquerda.
Prioritário não significa exclusivo?
Não há nenhum cordão sanitário [à direita], o que há é o entendimento de que em matéria de proteção social, educação e saúde é mais fácil um diálogo produtivo à esquerda.
Há uma área em que não é assim, em que BE e PCP acusam o PS de seguir políticas de direita, que são as leis laborais.
Vejo essa declaração mais como uma tentativa de forçar diferenças com o PS. O facto de o PS ter apostado no reforço do salário mínimo e da contratação coletiva mostra que estamos nos antípodas das políticas do PSD e do CDS.
Nestas matérias, o PS tem votado mais vezes ao lado do PSD e do CDS do que da esquerda.
São propostas que BE e PCP já sabem que vão ser chumbadas pelo PS. Na minha opinião, são deliberadamente apresentadas para isso.
O tema José Sócrates deve ser discutido no congresso?
Não é uma moção, não é um tema do congresso. Obviamente que os militantes são livres de fazer as intervenções que entenderem, se alguns entenderem falar desse tema são livres de o fazer.
O PS não tem uma reflexão a fazer sobre o que se passou, como defendeu Ana Gomes?
Não penso que o PS deva aderir a sessões de autoflagelação e de catarse coletiva, não me parece que seja um exercício muito útil. O PS tem é de orgulhar-se das leis e instrumentos legislativos que aprovou e tornaram possível e mais robusta a investigação a casos como este e outros. Não se trata de fazer qualquer depuração anímica ou psicológica, um partido apresenta propostas, defende soluções, e nesta matéria o PS tem muitas propostas e soluções que estão, aliás, em vigor.