João Baião: "Tenho um curso de pimba como mais ninguém tem!"
Chegou à SIC há dois anos e houve quem o visse como salvador da pátria. Está a ser frustrante este regresso?
Não, nada disso (gargalhada). As pessoas receberam-me com tanto entusiasmo, que eu até fiquei um bocadinho assustado. Aliás, eu disse isso mesmo: "Espero que não me venham chamar como salvador da pátria" Odeio criar essa expectativa e depois se as coisas não correram bem, é péssimo.
Há quem possa estar desiludido?
(pausa) Não sei. Hoje em dia, o panorama televisivo está muito diferente. As caras já não têm o peso que tinham. A televisão mudou muito. Há uma maior dispersão. Mas sinto que as pessoas têm um grande carinho por mim.
Um carinho que ainda vem dos tempos do Big Show SIC? Passaram 15 anos.
(sorriso) É incrível, não é? Parece que o programa ainda está no ar. E ainda tinha sido a Grande Noite. Foram duas pedradas no charco.
Já parou para pensar o que teria sido a sua carreira se não se tivesse cruzado com o La Féria e, mais tarde, com o Ediberto Lima?
(longa pausa) Só nunca parei para pensar porque eu não sou muito dessas análises. O La Féria foi fundamental na minha carreira. Se eu não tivesse tido a sorte de ter feito um café-concerto da minha autoria, e que foi visto pela Teresa Guilherme e pelo Filipe La Féria, se não fosse isso, de facto... (pausa)
... hoje não seria apresentador?
Não sei, se calhar, não. Eu já fazia teatro, já tinha estado no Teatro Aberto e no Teatro Experimental de Cascais, portanto, se calhar, tinha seguido por aí. Mas foi preciso muito trabalho, não são só umas larachas.
Acha que as pessoas percebem isso?
As pessoas pensam que nós vamos para o ar, fazemos umas brincadeiras, dizemos umas palhaçadas e chega. Não chega.
Quando diz as pessoas está a referir-se ao público, ou está a olhar também para dentro da classe?
(sorriso) Estava a pensar no público, mas é óbvio que há um grande preconceito. Hoje isso está um bocadinho mais esbatido, mas bem nos lembramos do tempo em que atores de teatro juravam a pés juntos que nunca fariam novela porque era uma arte menor.
Sente que os programas do day time sofrem do mesmo estigma?
Claro que sim, mas o day time é uma prova de fundo, todos os dias é única e tem de ser diferente.
Foi fácil adaptar-se aos programas da manhã e da tarde?
Tive de baixar um pouco à terra, porque eu estava habituado a um registo mais galopante (gargalhada). A minha querida Tânia (Ribas de Oliveira) dizia que ela era o talk e que eu era o show. Fomos muito felizes ali: eu puxei pelo lado mais divertido dela e ela puxou pelo meu lado mais sério e sereno.
Foi fácil aprender a partilhar o palco? Atores e apresentadores são normalmente egos fortes. E às vezes chocam.
Sim, mas no nosso caso foi muito fácil. Tal como é agora com a Andreia (Rodrigues), ou com a Rita (Ferro Rodrigues). Como foi com a Luciana (Abreu). Até porque eu tenho a escola do teatro, da contracena, que é fundamental. Gosto da partilha, do convívio, dos afetos. Sou assim na vida real.
Genuíno?
Sim, não sei ser de outra forma. As pessoas dizem-me muitas vezes na rua que eu sou muito simpático (risos). E dizem-me com ar surpreendido, como se fosse normal as pessoas serem simpáticas na televisão e antipáticas na rua.
Se calhar, é normal.
Se calhar é normal, por ser norma. Mas não é normal, no sentido de fazer sentido. Não faz sentido. Uma pessoa que faz televisão passa a vida a querer agradar o público. E depois quando está na rua não quer agradar a esse seu público? Isso faz algum sentido?
Não está cansado deste registo?
Não. Gosto muito. Tenho crescido muito. Aprendido muito.
O quê, por exemplo?
(pausa) Aprendi a falar com as pessoas, aprendi a serenidade das conversas. Eu era incapaz de estar no silêncio. Era incapaz de estudar sozinho no meu quarto e estudava sempre no meio de uma grande confusão. Sempre fui uma pessoa que me procurei isolar dentro do barulho. Nos últimos anos, aprendi a saborear aquilo que sou com os outros.
Mas isso tem a ver com a idade...
(gargalhada) Também, também. Agora tenho uma forma diferente de me relacionar com as pessoas. Menos fugidia. Eu sempre passei pelas pessoas de uma forma muito alegre, mas muito pela rama. Hoje, procuro mais a profundidade das coisas e das pessoas.
Esse aprofundamento da relação com o outro ajuda-o a conhecer-se melhor a si?
(pausa) Ajuda, ajuda. Quem vive pela rama nunca se aprofunda. Nesse aspeto, cresci muito. Entrego-me mais, exploro mais. Gosto mais das pessoas.
Também se desilude mais com as pessoas?
Pois, é da natureza humana. Mas eu não partilho nada daquela frase muito popular "Posso perder um amigo, mas não perco a piada". Prefiro sempre manter um amigo e refletir bem nas respostas (sorriso).
Há que diga que este meio não é bom para manter amizades.
Para mim, é completamente ao contrário. Tenho feito imensos amigos para a vida. A Tânia, a Rita Ferro Rodrigues, a Maria João Abreu, o José Raposo, a Marina Mota e tantos outros. São pessoas que estão no meu coração e que partilham a minha casa. São pessoas que eu amo, de uma integridade, de uma humanidade. Portanto, é possível.
Porque é que se diz tanta vez que não é possível?
Porque anda muita gente iludida. Somos muito vedetas. O meu objetivo, Nuno, nunca foi aparecer na capa das revistas. Não vou ser hipócrita: é claro que é bom, que é um reconhecimento público, mas não vivo para isso.
Vive para quê?
Para fazer aquilo que amo (pausa). Mas eu não quero dar aqui uma falsa ideia de mim próprio. Claro que é bom aparecer na televisão. Adoro chegar à rua e as pessoas conhecerem-me. Adoro abraçar e beijar as pessoas. Mas não é pelo lado fútil. Eu sou assim. Gosto de andar aos saltos e em festa (gargalhada).
Não o incomoda esse rótulo?
Nada, nada. Aliás, não me incomoda nenhum rótulo que me possam colocar. Só me incomoda a crítica gratuita, que se faz só para chatear. Agora, rótulos? Por amor de Deus! Há quantos anos eu levo com rótulos? Se apresento programas com música pimba, então tenho de ser pimba. Eu tenho um curso de pimba como mais ninguém tem (gargalhada).
Mas o rótulo não mói?
Nunca. Nem nunca me preocupei muito em dizer que sou diferente do que as pessoas pensam, que também sei fazer Shakespeare ou Tchekhov. Já fui o João Baião maldito, no pior sentido, o homem do telelixo. E hoje sinto que há uma opinião mais equilibrada a meu respeito. Continuará a haver gente que não gosta de mim, mas isso é normal. Mas não foi preciso estar aos gritos e em bicos dos pés. Fui fazendo o meu trabalho.
E o que é que gostava de fazer a seguir?
Gostava de fazer uma sitcom em direto. Já sonho com isto há muito tempo. Tenho aqui a cabeça a fervilhar.
Nunca para?
Paro. Às vezes, sinto necessidade de parar. Estive 15 dias de férias e não fui para lado nenhum. Fiquei em casa.
É o seu refúgio?
É, é o meu refúgio. Fiquei lá a ler, a brincar com os meus animais.
É quase um Zoológico, não é?
(gargalhada) Agora são muitos, são. São 15 cães. Ainda agora, ofereceram-me o Alfredo (risos).
Têm todos nomes de pessoas?
Todos. Tenho também uns póneis lindos... E adoro estar por lá, longe de tudo.
A usufruir o momento em que as luzes se apagam?
(pausa) A usufruir o momento em que as luzes se apagam, exatamente. É isso mesmo. Isso é bom. É uma das coisas que eu aprendi com a idade. Passei a apreciar o silêncio, que era uma coisa que eu detestava. Até tinha medo do silêncio.
Medo?
Ui, sou muito medroso (gargalhada). Tenho medo de andar de avião, tenho medo do desconhecido, do risco, das aventuras. Tenho medo de montanhas russas.
Portanto, se o convidasse para fazer esta entrevista de pára-quedas...
... jamais aconteceria. Morria de medo.
Fique descansado, que eu também (gargalhada).