Jarek Jakubcek: "Os investigadores portugueses estão no Top-10 da Europa"

Lidera uma equipa de 130 pessoas, na maior corretora de criptoativos do mundo, que tem a tarefa de ajudar as autoridades policiais. Jarek Jakubcek veio a Portugal para uma ação de formação com a PJ e conversou com o DN sobre segurança. E ainda deu umas dicas.
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Trabalhou mais de sete anos na Europol e, antes, cinco anos na An Garda Siochana, a Polícia Nacional irlandesa, onde recebeu prémios pelo uso criativo de programas em código aberto para combater o crime. Depois, deu o salto para o setor privado. É o diretor de Formação da maior corretora de criptomoeda do mundo responsável pelas relações com as autoridades policiais, cujo objetivo é auxiliar as investigações no combate ao cibercrime. Jarek Jakubcek veio falar com os investigadores portugueses e, como aliás esperava, não saiu desiludido.

Esteve em Portugal a aconselhar as nossas autoridades policiais, designadamente o ramo de cibersegurança da Polícia Judiciária...
Sim, fizemos uma sessão de treino de três dias na sede deles com 45 participantes. O principal objetivo foi falar sobre o uso legítimo e criminoso das criptomoedas. Também passámos em revista muitos casos diferentes, vimos como rastrear criptomoedas, como tirar proveito da natureza transparente do block- chain usando ferramentas de rastreio quer disponíveis a nível comercial, quer em código aberto e, claro, concentrámo-nos no volume de trocas e em como as corretoras podem ajudar no trabalho policial. E, claro, passámos quase metade do tempo a ver como é que a Binance pode, exatamente, ajudar os investigadores.

E como encontrou os nossos investigadores? Já atualizados?
Sim. Devo dizer que eu já sabia um pouco ao que vinha, porque já tinha tido experiência anterior à Binance. Trabalhei durante mais de 12 anos em investigação policial, incluindo sete anos e meio na Europol, e durante esse tempo tive muitos colegas de Portugal e apoiei investigações aqui, pelo que sabia muito bem quais eram as capacidades das autoridades nacionais. Claro que com um grupo de 45 pessoas há sempre um grau misto de experiências - havia pessoas que já estavam familiarizadas com investigações de cibercrime, mas tinham uma exposição limitada a investigações de cripto- moeda, e outras que já eram muito qualificadas e experientes em investigação de criptomoeda.

Com base na sua experiência, como nos comparamos com outros países da Europa?
Os investigadores portugueses estão certamente entre os mais experientes e mais qualificados da Europa.

Colocá-los-ia no Top-10?
Definitivamente no Top-10. Os investigadores portugueses são certamente dos que apresentam melhor desempenho entre os seus homólogos europeus.

Nesta área muito exigente, provavelmente se perguntar a qualquer agente da lei, até do FBI, dir-lhe-ão que não têm recursos suficientes para fazer o trabalho. A Binance, uma empresa privada, fez um esforço para aumentar seu número de funcionários em Conformidade e Investigação em mais de 500% (de acordo com seus próprios dados). Quantas pessoas emprega nesta área agora?
Deixe-me abordar, em primeiro lugar, a questão dos recursos policiais. Há um enorme aumento dos crimes de cibercrime em cripto, ano após ano, e a questão da falta de recursos está a ser abordada, não só neste país, como de forma transversal. Mas, claro, leva tempo para as polícias e os órgãos de aplicação da lei diversificarem os recursos. No entanto, ao mesmo tempo, não devemos ser ingénuos, não podemos esperar que a polícia alguma vez tenha recursos suficientes para investigar todas as fraudes que acontecem online, pelo que, por definição, os investigadores de cibercrime terão de definir prioridades, que casos investigar, porque simplesmente não terão recursos suficientes para investigar todas as atividades ilícitas.

Depois, é verdade que a Binance está a aplicar muitos recursos em Conformidade e, sim, aumentámos o número de pessoas que estão na Conformidade em várias centenas por cento. Neste momento, posso dizer-vos que temos mais de 750 funcionários e que cerca de 130 não tratam de outra coisa senão inquéritos policiais. É aí que colocamos muitos recursos e muito esforço, para apoiar as investigações policiais e deixar as autoridades satisfeitas. E não sou só eu que o digo: pode ir falar com investigadores policiais aqui em Portugal e tenho certeza que lhe dirão que ficaram satisfeitos com o nível de assistência que estão a receber da Binance. E se compararmos a assistência da Binance às autoridades policiais, certamente seríamos, senão a melhor, uma das duas principais corretoras que prestam serviços às autoridades.

A Binance é a maior corretora de criptomoeda do mundo e o Jared já estabeleceu uma parceria com a polícia de Hong Kong. Que outras iniciativas de segurança estão a promover?
A coisa mais importante que fazemos, naturalmente, é assistir as investigações policiais em curso. Fornecemos rapidamente as informações solicitadas, informações prá- ticas, e isso não deve ser dado como certo neste tipo de indústria. Muitas corretoras ou não cooperam ou simplesmente colocam obstáculos à cooperação, mesmo para pedidos básicos de dados dos subscritores, ou pedem aos investigadores que apresentem uma ordem judicial ou uma ordem judicial internacional. Isso é algo que não fazemos. Quando a Binance recebe uma solicitação legítima de aplicação da lei, nós respondemos. Prestamos assistência voluntária às iniciativas policiais, embora não sejamos obrigados a responder. Queremos ser bons cidadãos corporativos. É por isso que tivemos mais de 40.000 solicitações vindas de agências policiais em todo o mundo - em parte, claro porque, como diz, somos a maior corretora do mundo, que tem mais de 70% de quota do mercado em volume de negócios. Somos, de longe a maior bolsa de criptomoeda, o que significa que, naturalmente, haverá utilizadores envolvidos em atividades criminosas.

Mas este nível de cooperação não o coloca, também, numa posição delicada? Se receber um pedido de uma agência de um país não-democrático para dar pormenores sobre pessoas ? Como decidir se está a lidar com uma investigação criminal legítima ou se há outras intenções, políticas inclusive?
Os pedidos de aplicação da lei que recebemos são todos considerados caso a caso e, sim, também recebemos pedidos provenientes de jurisdições mais sensíveis. Depende realmente do que se trata o pedido. Do que recebemos, talvez 80% ou 90% estejam relacionados com diferentes fraudes ou esquemas de investimento. Por vezes, estão relacionados com outras atividades. Se recebermos um pedido de aplicação da lei, mesmo para uma das jurisdições mais sensíveis, mas virmos que existe uma investigação legítima sobre uma das atividades habituais de cibercrime, podemos dizer que as investigações parecem legítimas.

Mas tenho de mencionar que na Binance temos cerca de 30 ex-investigadores policiais a trabalhar connosco, o que é um número muito maior do que encontra em qualquer outra corretora, o que realmente joga a nosso favor, porque temos a experiência para distinguir entre os pedidos legítimos de aplicação da lei dos que podem não ser legítimos. Este é um dos nossos grandes pontos fortes.

Tem alguma forma de medir a sua taxa de sucesso? Número de casos resolvidos, número de ataques evitados, etc.?
Estatísticas como essa são basicamente impossíveis de obter. Mesmo quando trabalhava na Europol, recebendo perguntas dos estados-membros a quem fornecíamos apoio, não era capaz de dizer quantos casos foram resolvidos através da nossa assistência, porque fazemos o nosso trabalho e depois transmitimos a informação a outros. Isso também é algo que acontece na Binance. É-nos pedido que prestemos assistência, por vezes congelamos os fundos, mas não temos forma de saber o que se passa mais adiante, na investigação. Mas posso dizer, com base na minha experiência da Europol, que há um grande número de casos que não seriam resolvidos de outra forma, se não fosse o trabalho das pessoas nas corretoras.

Tal como entendo os seus objetivos, um deles é aumentar a consciência pública de que a criptomoeda pode ser segura. Mas o que significa realmente seguro, neste contexto?
Sim, é claro que significa coisas diferentes para diferentes pessoas. Para os acionistas, seguro significa que elas não entrarão numa situação como aconteceu com outras corretoras, que faliram.

Já o cliente quer ter a segurança de que está a lidar com instituições com um grande número de ativos. E que a instituição não joga no casino com os seus depósitos. Este foi um dos principais problemas que aconteceu na FTX [corrretora de criptomoeda que faliu em novembro de 2022], porque eles estavam a usar os fundos dos clientes para investimentos muito duvidosos, ativos extremamente arriscados. Este não é o caso da Binance. Se os clientes depositam Bitcoins, a Binance simplesmente detém a quantidade equivalente de Bitcoin e Ethereum.

Deve saber que há algumas semanas houve notícias negativas sobre a Binance e, como resultado, os clientes começaram a retirar fundos da corretora. No espaço de alguns dias, houve uma saída líquida de mais de seis mil milhões de dólares em criptomoeda. Pode perguntar-se quantas instituições financeiras seriam capazes de aguentar isto! Passámos por um verdadeiro teste de stress.

Por fim, que conselhos daria a alguém que quisesse começar a investir em criptomoeda?
Não posso dar oficialmente conselhos, mas, sim, se as pessoas decidirem de facto investir, devem ignorar quaisquer pessoas que os contactem de forma não-solicitada (spam) sobre um investimento atraente. Ninguém salta da cama de manhã decidido a ajudá-lo a ficar rico! E não há necessidade de passar por intermediários duvidosos num momento em que se decide investir. Se as pessoas querem estar envolvidas em criptomoeda, devem fazer a sua própria pesquisa, não devem confiar na avaliação de outrem.

Depois, deve-se escolher corretoras que lhe deem transparência. A queda da FTX teve um impacto positivo, houve uma pressão para que as empresas se tornassem mais transparentes - começaram a divulgar os seus ativos, o que é absolutamente fantástico. Hoje, pode ver-se quantos ativos algumas das maiores têm. E se se vir que, por exemplo, 50% dos fundos numa corretora não estão em grandes criptomoedas, como Bitcoin ou Ethereum, mas são investidos em algumas moedas marginais, isso será um grande sinal de alerta.

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