Jacarta afunda-se e uma nova capital ameaça a ilha do Bornéu
A capital da Indonésia está situada na mais populosa ilha do mundo, Java. Jacarta alberga mais de 10 milhões de pessoas, a região tem o triplo e a ilha uns 145 milhões de habitantes. O crescimento populacional foi muito mais rápido do que a capacidade de resposta em infraestruturas e em transportes. Jacarta é uma megalópole poluída (no topo do sudeste asiático, segundo a Greenpeace) e congestionada. E como se não bastasse está a afundar-se devido à extração de água subterrânea, estando em consequência exposta a graves inundações. Em 2050, 95% do norte de Jacarta estará submerso, segundo um estudo do Instituto de Tecnologia de Bandung.
Durante a campanha eleitoral, o presidente Joko Widodo prometeu um desenvolvimento económico mais equitativo. Agora quer investir 30 mil milhões de euros numa nova capital fora de Java. Para financiar a empresa, o Ministério das Finanças estuda um esquema que permite a participação de investidores privados.
Não foi Widodo quem trouxe o tema a terreiro. Foi Sukarno, o primeiro chefe de Estado das mais de 17 mil ilhas, quem viu em Palangkaraya, na província de Calimantão Central, na ilha do Bornéu, a urbe que poderia não só ser a capital do país mas também de uma confederação que juntaria ainda as Filipinas e a Malásia. Mais de 60 anos depois vários presidentes reconheceram os problemas de Jacarta e falaram no assunto, mas nenhuma decisão foi tomada.
No final de abril, o ministro do Planeamento, Bambang Brodjonegoro, anunciou que a decisão final sobre a nova capital iria ser tomada até ao fim do ano. "O presidente optou por mudar a capital para fora de Java, uma decisão importante. Estamos em processo de finalização dos estudos para decidir este ano onde será transferida a capital para que o processo de construção possa começar dentro de um ano ou dois", disse, tendo adiantado que esperam ter as obras concluídas em 2024.
Jacarta vai continuar a ser a capital económica da Indonésia. Como disse Brodjonegoro, foi tomado em linha de conta que 60% da população vive em Java e é aí que as atividades económicas estão concentradas.
A decisão do presidente Joko Widodo foi anunciada duas semanas depois de ter sido dado como vencedor das eleições presidenciais de 17 de abril, embora os resultados oficiais só devam ser anunciados na quarta-feira.
Widodo visitou entretanto vários locais possíveis na ilha de Bornéu. "Queremos pensar de uma forma visionária para o progresso deste país e mudar a capital requer uma preparação minuciosa e detalhada", disse o presidente.
O local favorito é Palangkaraya, a tal cidade que fez Sukarno sonhar. As autoridades locais reservaram 300 mil hectares para o caso de a escolha recair ali, noticiou a agência Antara.
O Bornéu é uma ilha de características únicas - tem uma das mais importantes e antigas florestas tropicais - e já de si está ameaçada pela desflorestação para extração madeireira ou pelas plantações para extração de óleo de palma (e ameaçando a fauna como o orangotango de Bornéu) nos três países dividem o território (Brunei, Malásia e Indonésia).
Às províncias indonésias da ilha já pende a ameaça para o meio ambiente e os povos nativos da ideia de "progresso". Em 2015, as autoridades centrais iniciaram uma série de obras (estradas, autoestradas e caminhos de ferro numa região que tem 6% da flora e da fauna mundial. Para investigadores universitários da Austrália e Indonésia, que estudaram o impacto das infraestruturas, estas obras são "a mais assustadora ameaça ambiental do mundo". Para Mohammed Alamgir, da Universidade James Cook, em Queensland, as infraestruturas são como "um peixe esventrado o que permite que colonos ilegais, caçadores furtivos e mineiros invadam a floresta e causem ainda mais destruição".
A ideia de criar uma capital nesta região só iria multiplicar as ameaças ao meio ambiente. Em momento algum, os políticos indonésios aludem aos cuidados ambientais no que se refere à futura capital.
A ideia de mudar uma capital de um Estado para outra cidade está longe de ser inédita. Se a capital se mudar para Palangkaraya, os indonésios estarão a seguir o exemplo de Astana (Nursultan desde há dois meses, no Cazaquistão), Otava (Canadá) ou Ancara (Turquia), cidades já existentes que foram promovidas a capital. Se a opção for a construção de raiz, a sucessora de Jacarta entrará na lista de Abuja (Nigéria), Washington (EUA), Brasília (Brasil), Naipidó (Birmânia), Gaborone (Botswana), Islamabad (Paquistão), Nova Deli (Índia) ou Camberra (Austrália).
A mudança da capital não acontece só em países com milhões de habitantes. O microestado de Palau, no Pacífico, com pouco mais de 20 mil habitantes, trocou Koror por Ngerulmud, em 2006.