Já não há 'votos moles' no decisivo círculo de Aveiro

Publicado a
Atualizado a

"Venha ver! Venha ver! Eu só vendo artigo do melhor", arengava, microfone em punho, um vendedor de soutiens e boxers. Na "Feira dos 28", em Aveiro, as campanhas que já estavam no terreno cruzavam bandeiras no meio das tendas de lona e entregavam manifestos a feirantes e a fregueses. Todos sabem que, em terra de ovos moles, é duro convencer os eleitores.

MENDES MARCou TERRENO. Há quatro semanas em acções de propaganda, com visitas aos 19 concelhos, mais de uma dúzia de entrevistas à imprensa e rádios regionais, Marques Mendes promoveu, no sábado, uma das três iniciativas mais importantes da sua campanha o comício em Anadia, destinado aos militantes do Sul do distrito. O candidato, que pretende segurar os oito deputados do PSD, tem o comício mais a Norte marcado para dia 4, em Santa Maria da Feira, e depois, a 11 de Fevereiro, será o nacional, com Santana Lopes, no Pavilhão dos Congressos - o maior recinto coberto da cidade foi o palco escolhido por PSD e PS.

"Começámos muito antes dos outros", conta o cabeça de lista, que distribui um postal com o seu rosto e o lema "sempre com Aveiro" (que é, simultaneamente, um site na Net). No labirinto da feira onde se vendem pintos vivos, calças de lycra e almotolias de azeite, o candidato até perguntava o concelho dos correligionários, comentando que o autarca lá do sítio tem "feito um bom trabalho".

"Estou muito descontente", queixa-se uma senhora, laranja desde Sá Carneiro. "Não queria muito a esquerda, mas olho para a cara dele [Santana Lopes] e não me apetece ir votar num candidato que não me dá confiança", desabafa. Confrontado com a situação, Marques Mendes desvaloriza. "Surgem sempre comentários curiosos, concordantes ou discordantes", comenta ao DN. E, no entanto, é apontado como potencial sucessor do líder, em caso de uma derrota eleitoral? "Fui crítico no último Congresso, mas, dois dias depois da dissolução, apelei a todos os militantes para se unirem em torno do projecto, da identidade e dos valores do PSD", conclui.

PINHO ARRANCOU ESTA SEMANA. A agenda dos adversários não parece incomodar os socialistas, que iniciaram a propaganda na semana passada e só desde segunda-feira é que contam com a presença do cabeça de lista e potencial ministro das Finanças num governo de Sócrates. Ao transpor a gigantesca entrada envidraçada da Reitoria da Universidade, Manuel Pinho marcou o tom da sua actuação, privilegiando contactos com instituições e empresas, em detrimento de feiras e mercados. Optimista quanto ao resultado, enaltece a "belíssima equipa" e aposta numa campanha "pela positiva".

A partir de terça-feira, o distrito onde o PS quer recuperar dois deputados para atingir os sete que derrotariam o PSD (caso o PP mantenha os seus dois lugares), passou a ser percorrido por duas caravanas a de Manuel Pinho, que irá fazer vários dias temáticos, como a "rota da economia" ou a "rota do ambiente"; e a de Maria Rosário Carneiro, o segundo nome da lista.

E a presença da "máquina" nacional não se resumirá ao dia 14, quando José Sócrates vai acabar a jornada com um comício no Pavilhão dos Congressos - podendo-se, então, conferir a adesão militante de PS e PSD. Antes, vão subir à tribuna, ao lado de Manuel Pinho, os carismáticos António Costa, num comício no Norte do distrito (ainda sem lugar definido), a 9 de Fevereiro, e Jorge Coelho, que vai aparecer em Ílhavo, no dia 12.

PORTAS em duplo papel. Apesar de manter a mesma gravata ao longo do dia, até ao início oficial da campanha Paulo Portas vai trocando de estatuto e de carro, para nunca se confundirem funções nem haver uso indevido da viatura do Estado em iniciativas partidárias. Depois do mega-almoço na Feira, com que marcou o arranque da pré-campanha, a primeira iniciativa no distrito, "fértil para a democracia cristã", foi no mercado de Oliveira de Azeméis. Logo a seguir, programa oficial em Fajões, fardas de bombeiros e danças de folclore, beneméritos e comendadores, placas para descerrar e fitas para cortar.

A partir de sábado e até ao comício de encerramento - como é costume no Largo do Mercado do Peixe, em pleno centro de Aveiro -, Paulo Portas diz que irá "tentar estar o máximo de tempo no distrito", conciliando com o trajecto nacional. De resto, minimiza o facto de não participar em debates locais, respondendo ao desafio lançado por Marques Mendes. Alega que "é tradição os líderes nacionais debaterem entre si", independentemente do círculo por que concorrem. "Mas vamos cruzar-nos; se não for no café, será na rua, nas associações ou nas fábricas, numa convivência e tolerância democráticas. E tenho a certeza que nos vamos encontrar todos na Avenida Dr. Lourenço Peixinho."

ILDA confiante. "Em 15 deputados do distrito de Aveiro, não há nenhum da CDU. Desta vez, vamos eleger uma mulher que luta pelos vossos direitos. Quem é que vai lutar por esses direitos? É o Paulo Portas, é o Marques Mendes e companhia?", vai questionando, no seu timbre forte, Ilda Figueiredo. "Não! É preciso castigá-los!" A eurodeputada e ex-candidata a Belém diz ao DN que se sente "descontentamento, um anseio de mudança." Depois, vai proclamando o que os comunistas fizeram pelo distrito, na AR e nas lutas laborais. "E sem nenhum deputado", remata, para justificar que um eleito daria "mais força à CDU" para apoiar as reivindicações de Aveiro e defender os trabalhadores.

A APU - a CDU surgiu em 1987 - só elegeu Vital Moreira (hoje, compagnon de route do PS) e Zita Seabra (actual cabeça de lista do PSD em Coimbra). Agora, a eleição "é difícil, mas possível - e gosto de lutas difíceis", conclui Ilda Figueiredo, há muito na estrada, duas vezes acompanhada por Jerónimo de Sousa, que vai subir ao palco do comício do dia 11, em Espinho.

ANDREA DISCRETA . "Posso-lhe oferecer? As propostas do BE." A jovem bloquista Andrea Peniche, editora e feminista, já escutou recusas com justificação "Não, porque sou de direita." A certa altura, um cigano faz parar o grupo. "Vou votar em vocês. Mantenham-se assim. O próprio Mário Soares entende que estão bem. Vão longe." O BE não considera que tenha grandes hipóteses, para já, no distrito e nem sequer agendou um comício. Louçã esteve, domingo, em contactos com a população em Espinho e num jantar em Ovar. A caravana nacional vai passar por Aveiro no dia 10, mas Andrea Peniche entende que já se começa "a impor um comício" na cidade.

O que todos temem é que se multiplique a atitude da mulher que rejeitava os folhetos "Olhe, eu não ponho [o voto na urna] em ninguém. Já estou farta!"

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt