Já há mais mulheres disponíveis para trabalhar do que homens

A recuperação pós-covid está a evidenciar a transição de gerações, com as mulheres a superarem os homens na população ativa. Na UE, Portugal é por enquanto caso único.
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O número de mulheres disponíveis para trabalhar terá no arranque deste ano ultrapassado o universo dos homens que o podem fazer, pela primeira vez em contexto de recuperação do emprego após a chegada da pandemia, indicam as últimas estimativas do Instituto Nacional de Estatística (INE).

Os novos dados mensais do INE sobre o mercado de trabalho, publicados ontem, apontam para que o número de mulheres na população ativa tenha atingido em março quase 2,6 milhões, com pequenos crescimentos desde janeiro. Já o dos homens tem caído, com a diferença a traduzir-se no início da primavera em mais 14,7 mil mulheres capazes de integrar o emprego.

Esta diferença já existia, mas era residual em fevereiro, quando as mulheres na população ativa eram apenas mais 1200 do que os homens na mesma situação. Os dados de ontem confirmam e alargam a ultrapassagem feminina.

Esta situação também se terá verificado ao longo da segunda metade de 2020, nos meses de julho a dezembro, mas em menor dimensão e ainda no contexto de um mercado de trabalho abalado pela covid, com cerca de mais duas centenas de milhares de trabalhadores involuntariamente afastados ou temporariamente indisponíveis para o emprego do que aqueles que se registam atualmente.

Agora, com as estimativas do INE a apontarem para as taxas de desemprego mais baixas em duas décadas e para um nível de emprego inédito, a roçar os 4,9 milhões de trabalhadores, consolida-se a perceção de que elas já são mais do que eles na população ativa.

Esta tendência evidencia-se sem interrupções desde o final de 2019 nas séries estatísticas trimestrais do Eurostat, que consideram apenas os indivíduos até aos 64 anos de idade, quando o INE alarga as estimativas a quem tem até 74 anos. Nos dados europeus que excluem as gerações mais velhas, aliás, Portugal destaca-se atualmente como o único país da União Europeia no qual há uma vantagem absoluta feminina na população ativa. Apenas Letónia e Lituânia se aproximavam do mesmo cenário no trimestre final de 2021, a última disponível.

A feminização da população ativa tem vindo a aumentar com a renovação de gerações, à medida que desaparecem os grupos etários mais velhos, onde prevaleciam mulheres sem ligação ao mercado de trabalho, e se afirmam os mais jovens, nos quais as taxas de atividade de homens e mulheres já andam praticamente a par.

Essa realidade, porém, ainda não é visível na taxa de atividade média das mulheres. Em março, ficou nos 64,6%, comparando com 70,7% nos homens. No caso das mulheres, a taxa de atividade avançou 1,7 pontos percentuais desde fevereiro de 2020, antes do impacto da pandemia. Já nos homens, a taxa de atividade cresceu em 1,2 pontos percentuais.

O maior número de mulheres disponíveis para trabalhar também não se traduz em maior emprego. Segundo o INE, em março haveria ainda mais 28,5 mil homens do que mulheres a trabalhar, com ambos os sexos a superarem os 2,4 milhões de trabalhadores.

Mas, esta é uma diferença que, à semelhança do que sucede com a população ativa, também se tem vindo a esbater ao longo dos anos, refletindo o maior peso do sexo feminino entre a população, a maior integração das mulheres no mercado de trabalho e também a progressão nas qualificações, onde elas surgem em vantagem.

As taxas de emprego dos dois sexos, porém, mantêm-se ainda distantes. Segundo o INE, a taxa de emprego feminina terá ficado em 60,5%, bastante abaixo dos 67,2% da percentagem registada nos homens. Há ainda mais mulheres desempregadas, sendo mais 35,5 mil do que os homens, num total superior a 165 mil. A taxa de desemprego feminina estava em março em 6,4%, com a dos homens nos 5%, segundo as estimativas.

Em março, e no conjunto da população, a taxa de desemprego ficou em 5,7%, com mais uma décima do que a estimativa feita para fevereiro. A população desempregada subiu 1,2%, para 295,9 mil pessoas, enquanto a população empregada recuou 0,2%, para 4 877 mil trabalhadores.

A população ativa, entretanto, registou uma diminuição mensal ligeira de 0,2%, ainda perto dos 5,2 milhões de pessoas. É ainda um dos números mais elevados de sempre no histórico do INE, alimentado pela participação feminina no mercado do trabalho. Segundo estudos do Banco de Portugal, com base nas projeções demográficas, a contribuição das mulheres deverá continuar a ter efeitos positivos na taxa de atividade nacional até 2040, prevendo-se um recuo a partir daí.

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