Ivanka: a "primeira-filha" e conselheira que é mais do que uma piada

Conselheira do presidente Trump, tal como o marido, não precisou de passar pela confirmação no Senado e não recebe um salário. Mas acompanha o presidente para todo o lado.
Publicado a
Atualizado a

"Se ela quisesse concorrer a presidente. Acho que seria muito, muito difícil de bater." A frase é do presidente norte-americano, Donald Trump, e a mulher a que se refere é a sua filha mais velha, Ivanka Trump, de 37 anos. Foi proferida numa entrevista com a revista The Atlantic, onde ficou claro que se há uma herdeira política entre os seus cinco filhos é ela.

Ivanka voltou a estar em destaque este fim de semana, quando acompanhou o pai à reunião do G20, em Osaka, no Japão, mas também à Coreia do Sul e ao encontro improvisado de Trump com o líder norte-coreano, Kim Jong-un. Tal como o pai, também deu um passos no interior da Coreia do Norte, considerando a experiência "surreal" .

A filha do presidente norte-americano, a first daughter ou "primeira-filha", acabou ridicularizada na Internet por ter tentado participar numa conversa informal com o presidente francês, Emmanuel Macron, a primeira-ministra britânica, Theresa May, o líder canadiano, Justin Trudeau, e a diretora do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde.

Oficialmente assessora especial do pai desde março de 2017, Ivanka tem trabalhado principalmente na área do empoderamento económico de mulheres, empreendimento e criação de emprego. "Ela entrou nesta história de ajudar as pessoas com empregos, e não tinha a certeza de que esse seria o melhor uso do seu tempo, mas não sabia quão bem-sucedida ela seria", disse Trump naquela mesma entrevista à The Atlantic. "Ela criou milhões de empregos, não fazia ideia de que seria tão bem-sucedida", acrescentou.

Mas no G20 e nas viagens que faz ao lado do pai, é no papel de diplomata que se tenta colocar, com Trump a alegar que seria uma "diplomata natural" e que "seria ótima nas Nações Unidas, por exemplo". Mas quando a ocasião apareceu, não a nomeou. "Se o tivesse feito, diriam que era nepotismo, quando não teria nada a ver com nepotismo. Ela seria incrível", indicou na entrevista, acrescentando que chegou a pensar nomeá-la para o Banco Mundial "Ela teria sido ótima, porque ela é muito boa com números", disse.

Já na cimeira do ano passado, em Hamburgo, na Alemanha, Ivanka tinha ficado debaixo dos holofotes, depois de ter ocupado por dias vezes o lugar do pai nas sessões oficiais (enquanto ele participava em reuniões bilaterais). Antes, participou num fórum para um fundo que facilita o empreendedorismo feminino nas economias em desenvolvimento, com Trump a mostrar-se "muito orgulhoso" da filha. "Se não fosse minha filha seria muito mais fácil para ela. Pode ser que ter-me como pai é a única coisa má que tem", ironizou Donald Trump, entre sorrisos dos presentes.

Ivanka, filha do primeiro casamento de Trump, com a ex-modelo Ivana, licenciou-se em Economia na Wharton, na Universidade da Pensilvânia, a mesma que o pai, e criou a sua marca de joias e de moda (que fechou em julho de 2018, após acusações de conflito de interesses). Mas ao mesmo tempo esteve sempre ao lado do pai, quando este dava os primeiros passos na ideia de uma candidatura presidencial.

É muitas vezes apresentada como uma "força moderadora" de Trump, tendo alegadamente atuado em plena crise da separação de pais e filhos migrantes na fronteira com o México, mas não tendo sido capaz de mudar as ideias do pai em relação à saída do Acordo do Clima de Paris.

"Vou continuar a fazer o que fazia antes no setor privado, a defesa do fortalecimento económico das mulheres. Estou muito focada no papel da educação... Ainda sou a filha do meu pai. (...) Mas vou pressionar o meu pai sobre os assuntos que me são caros", disse pouco tempo após ser nomeada numa entrevista a Gayle King, uma das apresentadoras do programa This Morning da CBS.

Uma falha na Lei Federal Contra o Nepotismo

A nomeação de Ivanka, tal como do marido Jared Kushner, de 38 anos, para cargos de destaque dentro da Casa Branca só foi possível por Trump ter encontrado uma falha na Lei Federal Contra o Nepotismo. Esta, que foi criada nos anos 1960 depois de o presidente John F. Kennedy ter nomeado o irmão, Bobby, como procurador-geral, só se aplica a cargos nas agências federais, que a Casa Branca não era. Além disso, nem ela nem o marido são pagos pelo trabalho como conselheiros de Trump, um cargo para o qual nenhum dos dois teve que obter a confirmação no Senado e que inclui, contudo, uma autorização de segurança ao mais alto nível.

Na entrevista da CBS, Ivanka também falou do marido, dizendo que ele é "muito inteligente, muito talentoso, com uma enorme capacidade", sublinhando que ele foi "fundamental na ajuda para o sucesso da campanha".

Jared, que casou com Ivanka em 2009 e com quem tem três filhos, tem atuado como uma espécie de secretário de Estado (foi o ex-detentor do cargo, Rex Tillerson, que contou vários episódios de encontros oficiais que ele tinha sem o seu conhecimento), nomeadamente no que diz respeito às relações com o México e o Médio Oriente. Ainda na semana passada, apresentou na capital do Bahrein a primeira parte do plano norte-americano para revitalizar o processo de paz no Médio Oriente. O plano de Jared inclui um investimento de 50 mil milhões de dólares para desenvolver as economias palestiniana e dos países árabes à volta. Mas o plano não foi bem recebido por todos.

Nascido em Livingston, Nova Jérsia, numa família abastada, neto de sobreviventes do Holocausto que fugiram da Polónia durante a II Guerra Mundial e chegaram aos EUA em 1949, Kushner tem muitas semelhanças com Trump. Tal como o sogro, cedo ficou à frente do império imobiliário do pai. Uma fortuna pessoal que lhe permitiu, aos 25 anos, e já licenciado em Harvard -- alguns alegam que só entrou graças a uma generosa doação do pai -, comprar o então muito prestigiado New York Observer e juntar os media aos setores de atividade do clã Kushner.

Judeu ortodoxo, leva a religião muito a sério. Numa entrevista à revista Vogue, em 2015, Ivanka, que se converteu ao judaísmo antes de se casar, explicou que a família respeita o sabat, o descanso semanal dos judeus: "De sexta-feira a sábado não fazemos mais nada a não ser estar uns com os outros. Nem fazemos telefonemas", explicou a mãe de três filhos.

Ivanka e Jared, junto com Don Trump Jr., já tinham feito parte da equipa de transição de Trump, que delegou neste último, e no outro filho, Eric, os negócios da família - também indo contra a regra de que estes deviam ser geridos por um fundo independente, para evitar qualquer conflito de interesses. Trump tem ainda mais dois filhos, Tiffany Trump (filha do segundo casamento com a atriz Marla Maples), que está a estudar Direito em Washington, e Barron Trump, o mais novo, de 13 anos, filho de Melania.

A confiança de Trump nos filhos não é de agora: tanto Ivanka como Don Jr. eram presença regular nos programas "The Apprentice" e na versão com celebridades, como braço-direito do pai. Trump limita-se a tratar a Casa Branca como mais um dos negócios da família, confiando mais na filha e no genro do que em alguns dos seus colaboradores.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt