Isolado, Assange continua na embaixada do Equador
Há "circunstâncias excecionais" que justificam a manutenção do mandado de captura contra Julian Assange, decidiu ontem a justiça britânica. Isto significa que se o fundador da WikiLeaks sair da embaixada do Equador em Londres, onde se encontra desde 19 de junho de 2012, será detido.
Nascido na Austrália e hoje com 46 anos, Assange procurou refúgio na representação diplomática equatoriana, violando as regras do regime de liberdade condicional a que se encontrava sujeito na Grã-Bretanha. Assange receava ser entregue às autoridades da Suécia, país no qual pendia então sobre ele acusações de assédio e violação. Temia que a justiça sueca o extraditasse para os Estados Unidos, onde é procurado pela divulgação de documentos diplomáticos e militares pela WikiLeaks. A ser julgado nos EUA, poderia ser condenado a prisão perpétua.
Dois meses após ter entrado na embaixada, o Equador concedeu-lhe asilo político.
Um dos advogados que representa Assange, Mark Summers, argumentou perante a juíza Emma Arbuthnot, responsável pelo tribunal onde se decidem casos de jurisdição especial e de extradição, que perante a anulação do mandado de detenção europeu pedido pela Suécia em finais de 2010, deixava de ter sentido a justiça britânica insistir na detenção do seu cliente. O caso perante a justiça sueca foi abandonado em maio de 2017.
Opinião contrária foi a do procurador Aaron Watkins, que salientou estar Assange "em liberdade condicional com as consequências decorrentes. Entre as quais, apresentar-se ao tribunal quando isso foi requerido, o que não fez. Como tal, o mandado deve manter-se". E foi neste sentido que decidiu a juíza Arbuthnot, continuando Assange na situação em que já viveu mais de dois mil dias na embaixada. Logo após a decisão, os advogados do australiano apresentaram novo recurso que a juíza irá apreciar na próxima terça-feira. Para estes, o estado de saúde de Assange, a quem os filhos ofereceram um gato em maio de 2016, está a deteriorar-se, física e psicologicamente.
Em fevereiro de 2016, os advogados de Assange levaram o caso ao grupo de trabalho sobre prisões arbitrárias das Nações Unidas, que decidiu a seu favor. Nem Londres nem Estocolmo reconheceram a decisão.
"Um aborrecimento"
Numa tentativa de ultrapassar o impasse, o Equador concedeu no início do ano nacionalidade equatoriana a Assange e tentou convencer Londres a aceitar que este obtivesse imunidade diplomática, o que lhe permitiria sair da embaixada e do país sem ser detido. Londres recusou.
Assange permanece assim num beco sem saída e está a tornar-se um elemento embaraçoso para o governo do Equador ao mesmo tempo que algumas das suas intervenções estão provocar perplexidade nos apoiantes. O exemplo mais flagrante foi o seu comportamento nas presidenciais americanas de 2016, com a divulgação pela WikiLeaks de mails da direção dos democratas e do diretor de campanha de Hillary Clinton. Assange foi considerado indiretamente responsável pela vitória de Donald Trump.
As autoridades equatorianas chegaram a bloquear o acesso do australiano à Internet a três dias da votação nos EUA, invocando o princípio de não intervenção nas questões internas de países terceiros. E o atual presidente, Lenin Moreno, no final de janeiro, qualificou a situação como "problema" e "muito mais do que um aborrecimento". Moreno declarou mesmo que Assange "devia imiscuir-se menos em assuntos de países" com os quais o Equador mantém "boas relações", isto quando o australiano multiplicava as mensagens no Twitter em defesa dos independentistas catalãs.
Mesmo nos meios normalmente afetos a Assange, como a Fundação para a Liberdade de Imprensa, começaram a mostrar algumas reticências sobre algumas das suas tomadas de posição.