Investimento em imobiliário através de vistos gold cai 12,5% no trimestre

Alterações à lei dos vistos dourados fizeram disparar as transferências de capital. Verba aplicada subiu 146% e títulos de residência aumentaram 187%.
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O investimento em vistos gold está em clara transformação. Nos primeiros três meses deste ano, verificou-se uma quebra de 12,5% no capital aplicado em aquisição de imóveis, consequência que se poderá justificar pelas alterações ao regime, que entraram em vigor no início deste ano e que impedem a atribuição de Autorização de Residência para Atividade de Investimento (ARI) por compra de casa em Lisboa e Porto, e em grande parte do litoral português. Em contrapartida, observou-se um crescimento exponencial de vistos dourados por transferências de capital.

No primeiro trimestre deste ano, o investimento total em ARI ultrapassou os 124,7 milhões de euros, o que representa um crescimento de 2,1% face ao homólogo de 2021, segundo os dados estatísticos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). O organismo revela que foram concedidos 261 títulos de residência neste período, mais 33 que nos três primeiros meses de 2021. Na aquisição de imóveis foram atribuídos 195 vistos gold (menos 10), que originaram negócios de mais de 97 milhões, valor que representa uma quebra de 12,5%.

Nesta análise trimestral ao regime, destaca-se a procura de ARI via transferência de capitais. Este instrumento permitiu a obtenção de título de residência a 66 cidadãos estrangeiros, que investiram 27,6 milhões. Estes números representam um aumento de 187% e de 146%, respetivamente, face ao trimestre homólogo. Este desvio do investimento explicar-se-á pela rentabilidade do produto, numa altura em a aquisição de imóveis nos locais mais lucrativos do país está vedada. Desde o início deste ano que se vinha a observar que o veículo transferências de capitais estava com uma boa dinâmica. Nestes primeiros meses, o valor investido esteve sempre acima dos nove milhões de euros. No que toca à origem do investimento, o Top cinco é liderado pelos EUA (52 vistos), seguido da China (43), Brasil (17), Índia (15) e a fechar Rússia (sete).

De acordo com o SEF, que ontem divulgou os dados das ARI respeitantes a março, o investimento total no terceiro mês do ano foi superior a 34,6 milhões, uma quebra de 6% face a igual período de 2021, tendo sido concedidas 73 autorizações de residência. O capital investido em aquisição de imóveis caiu 18,5% para 25,5 milhões, e receberam visto gold 51 cidadãos. Já por transferência de capitais, foram atribuídos 22 títulos, que resultaram num aumento de 67% do investimento face ao mesmo mês de 2021, totalizando nove milhões.

Russos ausentes

Em janeiro deste ano, ainda os russos se destacavam no Top cinco das nacionalidades que mais vistos gold obtiveram. Mas desde essa data que não há registo desta nacionalidade entre os cidadãos que mais procuram os vistos dourados, apesar da apreciação das candidaturas russas só ter sido suspensa no início de março. A Vogue Capital, empresa do universo da imobiliária Vogue Homes, tem aplicações financeiras ao abrigo deste programa "por parte de cidadãos de nacionalidade russa, as quais foram subscritas no final do ano de 2021", revela Joaquim Lico, CEO da empresa. Entretanto, soube "pela comunicação social que a apreciação dos processos destes cidadãos havia sido suspensa" e nada mais. Contudo, "as aplicações financeiras foram mantidas", afirma.

Desde o início do programa dos vistos gold que Portugal concedeu 431 autorizações a cidadãos russos, que aplicaram no país 278 milhões de euros. Mas os agentes imobiliários não parecem muito preocupados com a impossibilidade de fazer agora negócio com estes investidores. "O volume de investimento não tinha uma dimensão muito impactante", diz Beatriz Rubio, CEO da Re/max. Na sua opinião, as implicações serão "sempre limitadas a algumas situações específicas, não influenciando grandemente a conjuntura do mercado".

Segundo Miguel Poisson, CEO da Portugal Sotheby"s, o investimento de clientes russos através da agência era "residual" e, por isso, a suspensão "não teve um impacto significativo no negócio". Mas no contexto de conflito armado em que vivemos "têm surgido pessoas de países ameaçados ou potencialmente ameaçados pela guerra a interessar-se pelo programa golden visa", como polacos e ucranianos, avança. Já Pedro Lancastre, CEO da JLL, reconhece que esta sanção pode influenciar negativamente a dinâmica dos vistos gold. "Podem vir a existir implicações, uma vez que muitas empresas multinacionais, como é o caso da JLL, se posicionaram na rutura de negócios com investidores russos", mas só nos próximos meses é que se poderá confirmar, diz. Neste momento e antes da suspensão, a consultora não tinha negócios a decorrer com investidores russos.

Os vistos gold têm estado na mira dos organismos europeus e em cima da mesa está a possibilidade de eliminar o programa até 2025. Para Miguel Poisson, os esforços deveriam estar concentrados em tornar o "programa à "prova de bala" do ponto de vista da sua credibilidade, fazendo as devidas verificações e análises dos candidatos para garantir que são idóneos" e não na sua extinção. Como frisa, "esta possibilidade do término do regime em 2025 pode vir a pressionar potenciais investidores para acelerar as suas decisões de adesão".

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