(In)Justiça
Depois do colapso persistente no SNS, da Escola Pública em estado de sítio com os professores na rua, da agonia na Defesa, que desde 2015 perdeu 19% dos efectivos, abrindo o PS a porta à possibilidade de contratação de estrangeiros, a Justiça é agora, no que tem que ver com o fracasso trágico da governação em áreas de soberania, o cliente que se segue.
Uma Justiça célere, equitativa e eficaz, é um pressuposto básico de funcionamento de qualquer democracia digna desse nome. Mas em Portugal, quando o ano judicial reabriu, o primeiro-ministro - apesar de 100 mil diligências suspensas e mais de 5 milhões de actos adiados até Julho em resultado de sucessivas greves e paralisações potenciadas pela incapacidade da tutela -, teve como prioridade o anúncio da intenção de aplicar às buscas em sedes de partidos políticos, o regime das buscas em escritórios de advogados. Tragicamente, as prioridades não poderiam estar mais invertidas.
Quando a Justiça não funciona capazmente, são dramas de vida, cobranças, vítimas e lesados, a resolução de litígios e conflitos em empresas, famílias, entre vizinhos e tanto mais, que ficam suspensos. As causas da erosão do funcionamento dos tribunais são estruturais e antigas, e as reformas necessárias e urgentes. Ter a este propósito as preocupações dos partidos, como cabeça de cartaz de um anúncio que não resolverá coisa nenhuma, roça o insulto.
Seria bom que, por exemplo, quando os funcionários judiciais insistem no recurso a greves, o governo explicasse como tenciona dar resposta à aposentação de cerca de 40% nos próximos 4 anos, sem que salários de perto de 800 euros resultem particularmente apelativos.
Já agora, o que o governo também não pode fazer é persistir na tentativa de controle do poder judicial, que tem de ser independente, para salvaguarda do regime democrático. A este respeito, não é aceitável que a propósito de uma lei de amnistia, a Direção-Geral da Administração da Justiça se tenha permitido enviar para os tribunais instruções de emissão de mandados de libertação dc presos até 31 de agosto, esquecendo que o princípio da Separação de Poderes não permite a interferência do poder político, naquilo que compete ao poder judicial. A pressa na libertação de pessoas, mesmo se ajuda a disfarçar a indecência de espaços prisionais lotados e muitas vezes incapazes da ressocialização que se deseja, não invalida este facto.
Por causa disso, justificadamente, juizes, advogados e funcionários judiciais verbalizam já com contundência a incapacidade da ministra e da tutela. Acontece que perante um governo totalmente em fim de ciclo, apesar da eleições recentes, os problemas já não se resolvem com a substituição da ministra da Justiça somente. A este ritmo e em tantas áreas, é cada vez mais evidente que Portugal, mais cedo do que tarde, terá de ser chamado a escolher uma nova solução.
Líder do CDS-PP