O presidente da Câmara de Pedrógão Grande ficou em silêncio, na segunda-feira à tarde, optando por não prestar qualquer declaração no processo de instrução do incêndio, com base num requerimento apresentado ao Tribunal de Leiria, e depois ao Tribunal da Relação..Se for considerado esse recurso, apresentado pelo advogado Magalhães e Silva, "Valdemar Alves não poderá continuar a ser arguido, porque esta senhora não tem legitimidade para o acusar", disse no final aos jornalistas. "O Ministério Público não o acusou, e é apenas esta senhora (Carina Abreu) que vem considerar responsabilidades a Valdemar Alves, mas nem sequer relativamente aos familiares dela", acrescentou..Foram os advogados Ricardo Sá Fernandes e José Marques - que representam nos processos os assistentes Carina Abreu e José Carlos Dias, respetivamente, que conseguiram arrastar o presidente da Câmara de Pedrógão para o rol de arguidos, há poucos meses. De início, o MP optou por acusar apenas o vereador José Graça, que detinha, entre outros, os pelouros do Ambiente e Floresta. Mas os advogados em causa invocaram as responsabilidades máximas do presidente na área da Proteção Civil. De resto, em entrevista recente ao DN, o próprio Valdemar Alves estranhava "não ter sido chamado na altura"..Ricardo Sá Fernandes considera que este requerimento de Magalhães e Silva "é uma defesa técnica, que respeito, porque faz parte da luta processual" e por isso não vê nele "nada de ilegítimo". Porém, sublinha a insuficiência da acusação do MP, que incluiu um vereador e uma funcionária, excluindo o presidente. "Não há nenhuma razão para isso. A situação dele não é diferente da dos outros presidentes de Câmara"..Quando à questão da legitimidade de Carina Abreu - que perdeu os pais e avós no incêndio de Pedrógão - Sá Fernandes recorda que "quando se é assistente no processo é para todo o processo, independentemente dos factos terem ocorrido em Pedrógão, Castanheira ou Figueiró dos Vinhos"..José Marques representa José Carlos Guia dos Santos, um dos acidentados na estrada secundária que liga as aldeias de Troviscais e Mosteiro (Pedrógão Grande), e que ficou com queimaduras em 60% do corpo. Seguia de carro com Carlos Guerreiro e Vítor David, ambos feridos graves do incêndio..No final da sessão, justificou aos jornalistas a pertinência de acusar o presidente de Pedrógão: "Não porque eu pessoalmente queira incriminar o Valdemar Alves como responsável do incêndio", até porque o advogado (natural de Pedrógão Grande) entende que "o responsável [do fogo] não sabemos quem foi, se existem fisicamente ou são contingências da natureza, o que sabemos é que somos todos culpados, todos os cidadãos portugueses, enquanto a Assembleia da República não legislar para alterar a propriedade minifundiária"..O constituinte de José Marques é um dos que sustentam os crimes de ofensa à integridade física, além dos sete homicídios por negligência apontados ao então vice-presidente da Câmara, José Graça, que foi ouvido esta tarde, a par de Fernando Lopes, ex-presidente da Câmara de Castanheira de Pera. Em junho de 2017 José Graça era vice-presidente da Câmara, naquele que seria o seu último mandato - era autarca desde 2005..O juiz Gil Vicente quis saber o que fazia, em concreto, no âmbito da Floresta e quais eram as suas funções. E José Graça disse em tribunal que "não tinha competências delegadas", pelo que se limitava a acompanhar os funcionários da câmara e o trabalho que desenvolviam, com as máquinas, como "a desmatação de mato, o corte de árvores". Mas a última grande limpeza terá sido feita em 2016..O juiz insistiu em esclarecer o que consta de uma ata de 23 de fevereiro de 2017: "Tive alguma dificuldade em perceber o que lhe incumbia a si e ao presidente da Câmara", disse Gil Vicente, que quis saber ainda se José Graça conhecia algum protocolo feito com exército português no primeiro semestre de 2017. O ex-autarca recordava-se de "falarmos nisso na reunião de Câmara", mas disse não saber os desenvolvimentos, sequer se chegou a concretizar-se..E afinal, que funções lhe cabiam em concreto? "Fui fazendo ao longo dos anos o mesmo serviço. Orientava aquilo que houvesse necessidade. Os funcionários só me perguntavam o que fazer"..Ricardo Sá Fernandes quis saber, em detalhe, "quem é que tinha competência para dar ordens aos funcionários na gestão de combustível". "O presidente", respondeu José Graça, que imputou as responsabilidades maiores a Valdemar Alves..O ex-presidente da Câmara de Castanheira de Pera, Fernando Lopes, foi o último arguido a ser ouvido em tribunal. Bem preparado, respondeu a tudo se hesitações, fez-se acompanhar de mapas e outra documentação, explicando que o plano municipal de defesa contra incêndios estava em vigor desde 17 de fevereiro de 2011, aprovado pela comissão de defesa da floresta e depois pela antiga Autoridade Florestal, atual ICNF. "Estava em fase de atualização", disse, pois afinal "não chegou a ser emitido esse parecer".."No primeiro trimestre de 2017 já tínhamos feito a gestão de combustível em terrenos que eram propriedade da câmara, que tem uma área florestal substancial, de quase 40% do município. O resto é floresta privada e nacional"..Fernando Lopes - que foi autarca durante 24 anos, 12 dos quais presidente - referia-se à limpeza das ervas, cortes de árvores e todo esse trabalho florestal, sublinhando que "somos um concelho pequeno, conhecemo-nos todos, trabalhamos em parceria com junta e assembleias de compartes".."Sabíamos que não era possível fazer tudo, mas todos fazíamos o que era possível", concluiu..Na sessão desta tarde o Tribunal de Leiria anunciou que vai ouvir o perito Xavier Viegas, no próximo dia 26 de março. E admitiu ainda um vídeo, a pedido do comandante Mário Cerol, para visualizar uma filmagem de duas frentes de incêndio.