IGAPHE põe Misericórdias em risco de falência

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Um dezena de Misericórdias vai abrir falência caso o IGAPHE (Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional) insista em cobrar os empréstimos concedidos na década de 70 para a construção de habitação social (ver DN de ontem). "Algumas instituições receberam há mais de duas décadas 30 e 40 mil contos. Agora foram notificadas para restituir, com juros, entre 300 e 400 mil contos".

"Se pagarem vão ter de cessar toda a actividade social que realizam nas localidades", declarou ao DN Júlio Feire, tesoureiro da União das Misericórdias Portuguesas (UMP).

"O mais surrealista", frisou aquele responsável, "é que, até final de 2003, o IGAPHE tinha oferecido, gratuitamente, 6071 fogos de habitação social a 55 autarquias ".

Ao que o DN apurou, aqueles fogos, à data, valiam cerca de 143 milhões de euros. Mas, como ainda lhe sobravam 22 mil fogos, fez diligências para os oferecer a outras 10 autarquias. Estas entidades não os quiseram, mesmo dados. A oferta abriu-se então às instituições de solidariedade social, incluindo as Misericórdias.

Juntamente com aqueles 22 mil fogos, no valor de 4 650 661,99 euros, o IGAPHE quis também libertar-se do valor das prestações das propriedade resolúveis, que era de 16 067 612,33 euros. Ou seja, até há pouco mais de um ano, aquela instituição procurava quem recebesse, gratuitamente, bens imóveis no valor de quase 21 milhões de euros.

Só o município lisboeta foi contemplado com 11 bairros, correspondendo a 75 edifícios que somavam 1550 fracções. Tudo isto valeria, a preços de habitação social, cerca de 35 milhões de euros. No mercado livre seria 10 vezes mais.

"É estranho que, depois de se ter desfeito de património de valor superior a 140 milhões de euros, o IGAPHE venha agora reclamar dívidas que as Misericórdias contraíram nos anos 70 para construção de habitação social", disse Júlio Freire, lembrando que, à época, "milhares de retornados desesperavam por um tecto" .

"Isto é o fim das Misericórdias", sublinhou. "Se pagarem, terão de suspender toda a actividade social que desenvolvem junto de crianças, idosos e doentes, a quem o Estado é incapaz de apoiar", garantiu Júlio Freire, para quem "tudo isto é uma maldade que estão afazer às instituições".

Apelando à calma dos provedores envolvidos, aquele responsável informou que a UMP está a estudar o assunto de forma a chegar-se a um acordo com o IGAPHE. "Uma das soluções é deixar que se penhorem os imóveis de habitação social, e depois aceitá-los de volta, gratuitamente, no seguimento do que já se viu em 2003", explicou, em tom irónico.

Esta reacção da UMP surgiu depois de o DN ter ontem noticiado que o IGAPHE, no mês passado, notificou uma centena de entidades para pagar dívidas contraídas há mais de 25 anos ao extinto Fundo de Fomento de Habitação, sendo que, até agora, nenhuma amortização tinha sido reclamada. Os créditos, a que se somam os juros acumulados, foram concedidos a todo o tipo de entidades que podiam construir habitação social.

Durante a tarde de ontem ninguém atendia os telefones no IGAPHE, pelo que foi impossível ao DN contactar os responsáveis.

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