I Liga de volta mês e meio depois. Quem ganha, quem sai prejudicado e como recuperar os jogadores
AI Liga portuguesa está de regresso, depois da paragem de cerca de mês e meio, devido à realização do Campeonato do Mundo do Qatar. É certo que continuou a haver competição, com a realização da fase de grupos e quartos-de-final da Taça da Liga, mas quais poderão ser as consequências, em termos físicos, de tão longo interregno? Será que o líder Benfica, que estava em velocidade de cruzeiro, com 8 pontos de avanço sobre o FC Porto, 9 sobre o Sp. Braga e mais 12 do que o Sporting, poderá revelar dificuldades em voltar a arrancar? E dragões, arsenalistas e leões vão aproveitar para ganhar balanço?
O DN falou com dois especialistas na matéria: José Neto, metodólogo de treino desportivo com Psicologia Aplicada, e o preparador físico Fidalgo Antunes, para nos ajudarem a encontrar respostas. "Como vão surgir as equipas no reinício do Campeonato? É uma incógnita, porque cada treinador tem a sua metodologia e algumas equipas não tiveram jogos oficiais, vendo-se obrigadas a organizar jogos-treino, mas nós sabemos que não são o mesmo que competição a sério. O grande problema é os jogadores conseguirem voltar com o mesmo ritmo que tinham antes da paragem. Penso que será difícil, a não ser no caso daquelas equipas que foram para estágio e disputaram jogos a meio da semana e ao fim de semana", defende Fidalgo Antunes. No entanto, sublinha que "os clubes profissionais têm equipas técnicas bem apetrechadas, que realizam o trabalho mais adequado e estão certamente atentas a estas questões".
O ex-preparador físico do Sporting, Campeão Nacional em 2001/02, sublinha que "muitas vezes, ao longo da época, há jogos em que tudo sai ao contrário e existe a tendência para culpar a parte física, quando não teve nada a ver com isso, mas sim com a parte psicológica ou apenas com o fator sorte, que tem também muita importância num jogo de futebol".
Falando em concreto dos futebolistas que regressam dos trabalhos das seleções nacionais, José Neto, que foi Campeão Europeu ao serviço do FC Porto, em 1987, afirma que "parece pacífico que depois de várias semanas de interrupção das rotinas presenciais de treino no clube de origem, com uma passagem por outros perfis de exigência técnica e competitiva, possa haver alguma dificuldade".
Aponta, contudo, que "se os resultados nas seleções foram positivos individual e sobretudo coletivamente, será mais fácil readaptar esses atletas quando regressam aos clubes". E dá o exemplo dos argentinos do Benfica, Otamendi e Enzo Fernández, que se sagraram Campeões Mundias pela Argentina: "Mas se porventura os resultados não foram os esperados, como por exemplo com Portugal, poderá originar um estado crítico do atleta no clube de origem."
José Neto lembra outro problema adicional, de atletas que regressam com lesões das seleções, como sucedeu com Pepe, do FC Porto (recebe na quarta-feira o Arouca). "Se no clube qualquer lesão já provoca um tempo de readaptação, quando se está longe, mais difícil será regressar ao clube de origem, depois de o atleta ter experienciado outros métodos de treino". Sobre os diferentes ritmos que podem existir entre quem vem das seleções e quem ficou a trabalhar nos clubes, José Neto entende que "tem de se encontrar uma função de personalização de tarefa em termos de treino, inserindo os jogadores de forma gradual, quase como se fossem atletas lesionados, só sendo integrados em alguns momentos do treino".
De acordo com Fidalgo Antunes, "existe sempre dificuldade na reintegração dos futebolistas que vieram das seleções, pois as metodologias de treino são diferentes, sendo que tudo depende do tempo que estiveram em ação". Explica que "Enzo Fernández e Otamendi, jogadores do Benfica que chegaram à final pela Argentina, regressaram ao seu país para os festejos e depois tiveram de descansar, sendo progressivamente integrados no plantel, pois precisam de algum descanso depois da maratona de jogos no Qatar".
Já os atletas cujas seleções foram eliminadas mais precocemente, "foram integrados mais cedo e com mais tempo para se readaptarem ao ritmo, até ao recomeço da I Liga".
Por último, refere que "os futebolistas que não jogaram, necessitam de ter um trabalho à parte dos colegas de clube, com treinos mais intensos". Ainda assim, acha que "não é um trabalho difícil conciliar todas estas questões, com a parte psicológica por vezes a ser mais difícil de resolver do que a física, pois os atletas ganham ritmo rapidamente, e ao fim de dois/três jogos já estão bem".
Falando especificamente no caso do Benfica, Fidalgo Antunes refere que tudo dependerá dos primeiros jogos após a pausa. "Com o Moreirense as coisas não correram bem ao Benfica, a ver vamos o que vai suceder agora com o Sp. Braga [dia 30 de dezembro]. Os jogadores poderão começar a duvidar de como estão e as coisas encaminharem-se para o mal, ou, pelo contrário, a resposta ser positiva e a partir daí tudo começará a desenrolar-se de forma natural".
José Neto concorda que o Benfica poderá sentir algumas dificuldades nesta fase. "Sim, poderá acontecer porque a equipa estava numa fase extremamente rica a nível de resultados e esta grande pausa cortou os processos cognitivos. Vai depender muito do que forem os resultados destes primeiros jogos", afirma.
Já o Sporting (defronta na quinta-feira o Paços de Ferreira) apresentou-se revigorado nas últimas semanas, com quatro vitórias em quatro jogos na Taça da Liga e um saldo de 18-0 em golos. "A equipa passou por uma fase má, mas que nada tinha a ver com a parte física, e agora ganha aos cinco e aos seis. Rúben Amorim teve mais tempo para preparar os jogadores, que continuaram a ter competição, o que foi muito importante", afirma Fidalgo Antunes.