Huppert: a consagração em casa antes dos Óscares
A frieza de Isabelle Huppert compensa. Se em Cannes o júri se esqueceu da sua performance serenamente selvagem em Ela, a Academia francesa não. Depois do Globo Dourado, Huppert é premiada em casa. Uma justa vitória para um papel de uma mulher que reage de forma muito peculiar a uma violação. Huppert, que estará presente hoje na cerimónia dos Óscares, fez questão de desfilar o seu charme ao vivo não obstante os perigos do jet lag. Ela é o primeiro filme francês de Paul Verhoeven e foi também considerado o melhor filme do ano.
Na noite de sexta-feira o triunfo deste manifesto feminista não surpreendeu ninguém, mas Ela não foi o único vencedor da noite e repartiu com Divines, de Houda Benyanima, e Tão Só o Fim do Mundo, de Xavier Dolan, a glória num palmarés muito previsível. Divines arrecadou três Césares: melhor primeira obra, atriz secundária (Déborah Lukumuena) e melhor atriz revelação (Oulaya Amamra). Recorde-se que em Cannes já tinha vencido a Câmara de Ouro, prémio atribuído ao melhor primeiro filme, a Palma Queer e uma menção especial na Quinzena dos Realizadores. Divines é uma história de afirmação feminina na Paris dos nossos dias e toca em questões como o preconceito e o orgulho transgénero.
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Quanto ao caso Xavier Dolan e o seu Tão Só o Fim do Mundo, que em Portugal dividiu muito a crítica, venceu três importantes Césares: melhor montagem , melhor ator (Gaspard Ulliel) e melhor realização. Mais uma aclamação francesa para o canadiano que neste momento prepara a sua estreia em língua inglesa em The Life and Death of John F. Donovan, com um elenco recheado de estrelas de Hollywood. Tão Só o Fim do Mundo é inspirado na peça de teatro biográfica de Jean-Luc Lagarce. Uma história de uma família à beira de um ataque de nervos durante um longo almoço. A Academia francesa ficou sensível a uma respiração de cinema ofegante e com uma câmara sensualmente próxima dos rotos de Marion Cotillard, Vincent Cassel e Léa Seydoux.
Outro vencedor da noite foi a adorável animação Ma Vie de Courgette, de Claude Barras, que também hoje estará a concorrer na Academia de Hollywood para o Óscar respetivo. A história de um órfão chamado Courgette venceu melhor animação e argumento adaptado. Trata-se de uma animação em stop motion com uma solidez dramática a todos os níveis comovente. Tem distribuição garantida em Portugal.
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De alguma forma, Frantz, de François Ozon, foi o grande perdedor. Este épico romântico a preto e branco não tem ainda estreia marcada entre nós. O classicismo certinho de Ozon não foi suficiente para vencer a concorrência...
De referir que a vitória obrigatória de Huppert em ano de Óscar é ainda mais valiosa pela fortíssima competição que tinha. 2016 foi um ano de ouro para as interpretações femininas e seria complicado tentar perceber quem seria a dona do César se Huppert não fosse tremenda em Ela (não nos podemos esquecer do seu desempenho genial em O Que Está por Vir, de Mia Hansen-Love). Talvez Virgine Efira no muito elogiado Victoria ou a nórdica Sidse Babette Knudssen em La Fille de Brest. E havia ainda Marion Cotillard em Um Instante de Amor e Soko em A Dançarina...
O César de Honra foi atribuído a George Clooney. Um César que premeia a sua contribuição como ator, realizador e ativista. Clooney deu brilho a uma noite em que o cinema britânico levou a melhor ao de Hollywood no prémio para o melhor filme estrangeiro. Eu, Daniel Blake, de Ken Loach, venceu contra a fortíssima concorrência. Não é brincadeira vencer a Palma de Ouro e os Césares...
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