Não vale a pena procurar mais a Travessa do Asse dos Três, na vila de Cascais, que se situava próximo da estação dos comboios. Esta pequena artéria, no prolongamento da Travessa da Conceição com saída para o Largo da Praia da Rainha, desapareceu. Já não existe. O Ministério Público (MP) acusa o Hotel Albatroz de, alegadamente, ter "engolido" aquele arruamento público para seu uso privado. Câmara Municipal de Cascais e a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT) foram igualmente acusadas. O Procurador da República junto do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra considera que estas entidades, sabendo o que estava a acontecer, pactuaram com a alegada usurpação ao nada terem feito para a travar..Segundo o MP, o Albatroz ocupou uma parte da Travessa da Conceição e a Travessa do Asse dos Três. Para isso, colocou um portão a nascente, onde agora termina a Travessa da Conceição, e outro a sul, onde terminava a Travessa do Asse dos Três e começava o Largo da Praia da Rainha (junto ao muro sobre o mar). Aquele espaço, que era um arruamento público pedonal, passou então a estar inserido na propriedade privada do complexo hoteleiro. É agora um jardim. Garante o Procurador da República do TAF de Sintra que tudo foi feito com o conhecimento da câmara e do CCDR-LVT sem que tivessem protegido o bem público. Assim, interpôs contra as três entidades uma acção administrativa especial para condenação à prática de acto devido. Mas a autarquia contesta, lembrando que mandou embargar a obra. Também a CCDR lembra que indeferira a solicitação do hotel para usar aquele arruamento sob a forma de concessão..Licença só para construir.Carlos Simões de Almeida, proprietário do hotel, explicou ao DN que em 2005 solicitara à CCDR-LVT uma licença de utilização daquele espaço, mediante o pagamento de uma taxa. Seria um processo idêntico ao das concessões para esplanadas. Porém, adiantou, a diligência foi interrompida a partir do momento em que o MP interpôs a acção judicial agora em curso, no seguimento de uma queixa anónima. Disse Simões de Almeida estar confiante numa decisão favorável do TAF de Sintra de forma a obter a concessão. .A Travessa da Conceição, segundo nos explicou, apenas dava acesso a um palacete localizado quase "em cima" do mar, conhecido por Casa de Hóspedes D. Nuno, antiga propriedade da família Espírito Santo, já na Travessa do Asse dos Três - onde está agora um dos portões. Este imóvel foi entretanto adquirido pelo Albatroz, assim como um outro prédio, designado por Chalet Mary, que se encontrava em ruínas . Este último imóvel situa-se mesmo ao lado do edifício do hotel, separados apenas pela Travessa da Conceição, onde está o outro portão. Neste momento ambos os edifícios já estão ligados por passagem área. Ou seja, sendo agora o Albatroz proprietário de todos estes imóveis, o uso público daquele arruamento já não se justificaria, argumentou aquele responsável. Por isso, decidiu fechar o espaço.. Assim, a par das obras no Chalet Mary, também o espaço público foi todo ajardinado. "Ora, não obstante apenas estar autorizada a efectuar obras de construção na estrutura do edifício, o certo é que o Hotel Albatroz efectuou todas as obras que pretendia, apesar de não dispor de licença camarária para tanto", acusa o MP..Também o presidente da câmara de Cascais, António Capucho, esclareceu(ver caixa em cima) que o projecto de obras apresentado pelo Albatroz em Outubro de 2004 foi aprovado a 21 de Janeiro de 2005, tendo sido emitido o respectivo alvará de licença parcial de obras, explicitando-se aí que "a obra na sua globalidade só seria licenciada após o estabelecimento das condições de utilização do espaço público e do seu enquadramento jurídico". Segundo o autarca, "os projectos aprovados não contemplam intervenção nos arruamentos públicos em causa.".CCDR-LVT indeferiu.Também a CCDR-LVT, embora esteja acusada pelo MP de nada fazer para evitar aquela ocupação ilegal, enviou a 7 de Janeiro de 2006 ao Albatroz um ofício a indeferir o pedido de licença de concessão para utilização daquele arruamento. Nesse ofício, a CCDR explicita que o espaço público pretendido pelo hotel não só dava acesso à Casa de Hóspedes D. Nuno, como também permitia o acesso ao Largo Praia da Rainha. .O pedido foi indeferido porque, entre outras coisas, existia um despacho de Outubro de 2005, do então Ministro do Ambiente, que obrigava à remoção de todos os obstáculos no acesso ao litoral. "Portanto, a CCDR-LVT é muito clara no sentido de que não autorizava a ocupação do arruamento público", insiste o MP. Mas, o Albatroz fez obra. |