Hoje Lisboa é um candongueiro em Angola a pedir liberdade
Candongueiros são as carrinhas pintadas de azul e branco que circulam em Angola, servindo de transporte à população. Não seria estranho entrar num e escutar a voz do rapper MCK. "Pela natureza crítica, teor político e social, essas músicas não encontram espaço nas rádios. É um espaço neutro, o candongueiro, é o meio de transporte que mais pessoas leva. Pessoas que sentem as suas vidas representadas nas mensagens" das músicas. Como A Téknika, as Kausas e as Konsekuências, que, a 26 de novembro de 2003, Arsénio Sebastião "Cherokee", lavador de carros de 27 anos, trauteava na rua. Foi assassinado por membros da Guarda Presidencial Angolana. MCK - nome no rap de Katrogi Nhanga Lwamba -, o autor da canção, tornou-se nesse momento "um ativista, defensor de direitos humanos" e compreendeu a música como "arma de intervenção social e um instrumento de transformação de consciência", diz ao DN.
A prisão - sem mandato de captura - de 15 jovens ativistas angolanos a 20 de junho último, acusados de planearem um atentado contra o presidente e outros membros dos órgãos de soberania, foi "uma das grandes razões" para o concerto que esta noite marca a rentrée do Musicbox, em Lisboa, e junta MCK, de 34 anos, com Bonga, prestes a fazer 73. Cinco letras que bastam para que se saiba que falamos de um dos maiores nomes da música angolana. A voz rouca que cantou em quimbundo para o mundo em Angola 72. O autor de canções independentistas proibidas pelo Estado Novo e de canções proibidas numa Angola já independente.
MCK é formado em Filosofia - leitor de Platão e Aristóteles, conta - e, hoje, estudante de Direito, para ter "uma intervenção com muito mais qualidade. Em vez de respeitarmos ordens superiores como nos é imposto em Angola, devemos respeitar e compreender as leis". Convidou Bonga - "dianteiro nesse exercício de liberdade politica" - para mostrar que "há uma geração que está a dar continuidade ao que ele fez". E mesmo que o faça num "estilo completamente diferente, é o mesmo discurso, a mesma abordagem".