Hoje é última hipótese de rebelião contra Trump. Mas não vai acontecer
"Vocês têm o poder e a oportunidade para se tornarem nos livros heróis americanos que mudaram o rumo da História", lançam as estrelas que esta semana divulgaram um vídeo com um apelo aos grandes eleitores para se rebelarem e votar contra Donald Trump. Além de Martin Sheen, o presidente Bartlet da série West Wing, outros cinco milhões de pessoas assinaram uma petição a pedir uma revolta de última hora no Colégio Eleitoral. Mas poucas ou nenhuma acreditam que esta venha mesmo a acontecer.
Quando foram às urnas a 8 de novembro, o que os americanos fizeram foi escolher os 538 grandes eleitores que hoje se reúnem - nos respetivos estados - para votar no novo presidente dos Estados Unidos e no seu vice. Escolhidos pelos partidos, estes não estão obrigados por lei - salvo algumas exceções - a votar no candidato que venceu no seu estado. Mas tradicionalmente respeitam a vontade popular. E neste caso, Trump garantiu 306 votos no Colégio Eleitoral, contra 232 para a democrata Hillary Clinton. Mesmo se a ex-primeira dama conseguiu mais dois milhões e meio de votos populares. Uma realidade longe de ser inédita: em 2000 o democrata Al Gore obtivera mais meio milhão de votos que o republicano George W. Bush, mas perdeu as eleições.
Estabelecido pela Constituição de 1787, o Colégio Eleitoral pretende dar voz aos estados mais pequenos. Cada estado tem direito a dois votos - o equivalente aos dois senadores - a que se soma o número de votos correspondente aos eleitos na Câmara dos Representantes (proporcional à população). Assim, a Califórnia tem 55 grandes eleitores (2+53), mas Montana, Vermont ou Wyoming têm três (2+1), tal como o Distrito de Columbia.
Para travar a eleição de Trump, teria de haver uma rebelião de 38 grandes eleitores republicanos. Ora historicamente não costuma haver mais do que um ou dois votos contra o sentido da escolha popular. Este ano, só Christopher Suprun, um congressista do Texas, anunciou que irá desobedecer ao voto popular no seu estado e votar contra Trump hoje.
Mas numas eleições em que os resultados já provaram que nem sempre são aquilo de que estamos à espera, convém não pôr nenhuma hipótese de parte. E se de facto o Colégio Eleitoral - cuja votação final só será oficialmente anunciada a 6 de janeiro pelo Congresso - dão der a vitória a Trump, caberá então à Câmara dos Representantes escolher o sucessor de Barack Obama na Casa Branca. E aí os republicanos estão em larga maioria, o que poderia acabar por levar Trump na mesma à Sala Oval.
Do lado republicano, a mensagem é de tranquilidade. O presidente do partido e futuro chefe de gabinete de Trump, Reince Priebus denunciou uma tentativa por parte dos democratas de "deslegitimar o resultado das eleições". E acrescentou na FOX News: "Estamos convencidos que tudo vai decorrer com normalidade".
Instituição com quase dois séculos e meio, o Colégio Eleitoral costuma trabalhar na sombra aquando das eleições. Mas numas eleições tão disputadas como estas, em que a agressividade marcou a campanha e os resultados, apesar de claro em termos de grandes eleitores, dão mais votos populares a Hillary, este último processo ganhou nova relevância. E multiplicaram-se os apelos à reforma de uma instituição que os críticos definem como "arcaica".
"O novo interesse pelo Colégio Eleitoral sublinha a necessidade de nos livrarmos de uma instituição ultrapassada e fundamentalmente antidemocrática", escreveu David Pozen, professor de Direito na Columbia Law School.
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As críticas partiram do próprio presidente Obama que antes de deixar Washington para umas férias no seu Havai natal considerou o sistema "um vestígio do passado". Mas apelou ao campo democrático para tirar lições do fracasso e arranjar uma estratégia para vencer no futuro em vez de se lamentar sobre os resultados deste ano.
O próprio Trump parece ter mudado radicalmente de opinião sobre o Colégio Eleitoral ao longo dos anos. Em novembro de 2012 escrevia no Twitter que a instituição é "um desastre para a democracia". Mas depois da sua vitória nestas presidenciais, garantia na mesma rede social: "O Colégio Eleitoral é uma coisa genial, permite a todos os estados, inclusive os mais pequenos, ter uma palavra a dizer".
Fiel ao seu estilo de campanha, o presidente eleito terminou ontem em Mobile, no Alabama, a tournée de agradecimento que fez pelo país depois da vitória. De boné vermelho com o logótipo USA e entre canhões de água, o milionário criticou os comentadores das televisões que previram a sua derrota. E quanto ao sistema eleitoral, que tanto atacou na campanha, garantiu: "Nunca o apreciei tanto como agora!"