Figuras de alcance nacional e até internacional, como Fernando Haddad, candidato presidencial derrotado em 2018, Sergio Moro, o ex-juiz e ex-ministro de Jair Bolsonaro, ou Romário, o craque que trocou a grande área pela política, vão a jogo num domingo em que um eleitorado de 156.454.011 brasileiros vai eleger, além do presidente da República, os 27 governadores, 27 dos 81 senadores, os 513 deputados federais, os 1035 deputados estaduais e os 24 deputados distritais num total de 28 274 candidatos para 1607 vagas. Sim, há mais disputas eleitorais no Brasil além da presidencial, entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro..O politólogo Vinícius Rodrigues Vieira, da Fundação Armando Álvares Penteado, faz um tour pelo país para o DN, começando, claro, por São Paulo, dono de um terço do PIB brasileiro.."E a disputa lá tende a moldar a próxima eleição presidencial porque temos um embate entre Fernando Haddad e Tarcísio de Freitas, os delfins de Lula e de Bolsonaro respetivamente, mas com Rodrigo Garcia, atual vice-governador e representante da direita civilizada, o PSDB, pelo meio". Por outro lado, "se quem ganhar o Planalto não conquistar São Paulo enfrentará no estado uma espécie de bunker de oposição".."Mas, se quisermos falar de 2026, temos inevitavelmente de falar em Minas Gerais, o segundo estado mais populoso e considerado o Ohio brasileiro por normalmente replicar, como o estado americano nas eleições dos EUA, a disputa nacional", lembra o politólogo.."Candidato à reeleição, Romeu Zema é um caso de sucesso interessante por ter governado num jeito muito mineiro, isto é, por consensos, apesar de ser do Novo, um partido liberal, supostamente fora do establishment, vencendo, ele será, como eventualmente Tarcísio, mais um candidato a disputar os espólios do bolsonarismo à direita em 2026".."No Rio, o candidato Cláudio Castro representa o bolsonarismo e Marcelo Freixo, que trocou a esquerda mais radical, o PSOL, pelo centro-esquerda, o PSB, representa o lulismo", assinala Vieira. "Apesar de menos relevante demograficamente do que São Paulo e Minas, será o Rio que terá um potencial mais dramático para Bolsonaro em caso de eventual derrota, uma vez que Freixo, amparado por Lula, se este ganhar, combaterá as milícias, um dos principais apoios do atual presidente", diz Vieira.."Já se Castro vencer com Lula na presidência, o bolsonarismo deve recolher-se ao Rio, como ponto de partida para tentar voltar a espezinhar a política nacional", remata..No Sul, a tradição (recente) é o domínio da direita. "No começo da redemocratização, o Rio Grande do Sul estava conotado com a esquerda mas hoje é uma trincheira da direita, com Eduardo Leite, do PSDB, e o ex-ministro bolsonarista Onyx Lorenzoni, na disputa".."Assim como o estado vizinho de Santa Catarina, mais conhecido por "Santa CataReich", pela forte colonização alemã e pela simpatia por ideias de extrema-direita, onde os quatro principais candidatos são de direita", assinala o politólogo.."No Paraná, a maior curiosidade é a corrida de Sergio Moro ao Senado, uma corrida que deve naufragar pela disposição da esquerda em votar até em Álvaro Dias, candidato presidencial de direita em 2018 e ex-aliado de Moro, só para impedir o antigo juiz de ser eleito"..Se o Sul é de direita, o Nordeste vota à esquerda. "Na Bahia, há o regresso interessante dos "carlistas", isto é, dos herdeiros de Antônio Carlos Magalhães [governador da Bahia por 11 anos, falecido em 2006], conhecido como ACM, na pessoa do seu neto, conhecido como ACM Neto". "Caso ACM Neto ganhe, o PT perde um estado muito relevante e fica obrigado a vencer São Paulo para compensar", assinala Vieira.."Nos outros dois estados mais relevantes da região, em Pernambuco ganhará sempre alguém simpático ao lulismo, e no Ceará, origem de Ciro Gomes, ele pode perder o estado para o PT".."Com 42% da população concentrada no Sudeste [São Paulo, Minas e Rio], 30% no Nordeste e 15% no Sul, o Norte e o Centro-Oeste, as duas regiões menos populosas, são por isso, menos relevantes do ponto de vista eleitoral mas importantes por causa do agronegócio, no Centro-Oeste, e da Amazónia, no Norte", diz Vieira. "Será interessante saber se o bolsonarismo continuará a dominar essas regiões"..Como os mandatos dos senadores são de oito anos, dois terços dos 81 só vão a votos em 2026. O outro terço, 27, está na corrida. "Do Senado, costumam sair futuros candidatos presidenciais, como Simone Tebet ou Soraya Thronicke, na eleição atual, mas também Fernando Henrique Cardoso, José Serra ou Aécio Neves, em sufrágios anteriores", lembra Vieira.."Além do caso já referido de Moro, destaque para Romário, como expressão do bolsonarismo e o apoio tácito dos evangélicos, que deve ser eleito no Rio, já em São Paulo, Márcio França, o candidato de Lula, deve vencer uma direita dividida entre o astronauta Marcos Pontes [ministro da Ciência de Bolsonaro] e a deputada Janaína Paschoal [subscritora do impeachment de Dilma Rousseff]"..A eleição para a Câmara dos Deputados tem sido referida por todos os candidatos presidenciais, sobretudo Lula, como essencial. "É, de facto, talvez a mais importante das eleições porque, mesmo num regime presidencialista, o Congresso tem muitas prerrogativas dadas pela Constituição de 1988"."Lula sabe que, se ganhar, deve enfrentar oposição legislativa muito forte já que, desde 2014, o parlamento virou à direita com a chamada bancada BBB, da Bíblia, da Bala e do Boi, isto é, evangélicos, polícias e agricultores".."Como Dilma acabou por perder a batalha para Eduardo Cunha, então líder da Câmara dos Deputados, e acabou derrubada pelo legislativo, Lula, mais esperto, escolheu Alckmin como vice para reduzir tensões e gerar uma acomodação geral, uma espécie de geringonça à brasileira, com presidente de esquerda e maioria parlamentar de direita"..dnot@dn.pt