Habitantes de La Palma ainda sofrem um ano após erupção vulcânica

Governo espanhol forneceu mais de 500 milhões de euros para habitações temporárias, reparações de estradas, limpeza de cinzas e apoio financeiro a pessoas que perderam o emprego, mas muitos moradores queixam-se do ritmo muito lento da reconstrução da ilha.
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Os habitantes da ilha espanhola de La Palma ainda sofrem com os efeitos da erupção vulcânica de há um ano.

"O nosso plano agora é... não fazer planos", disse à AFP Leticia Sanchez Garcia, emocionada, um ano depois de a sua casa ter ficado soterrada pela lava de um vulcão.

Depois de morar com amigos durante meses, a mulher de 34 anos finalmente conseguiu voltar à normalidade em maio, ao ir viver juntamente com o marido e três filhos pequenos para uma casa pré-fabricada de madeira fornecida pelo governo. No entanto, para ela e muitos outros na pequena ilha, parte da cadeia das Ilhas Canárias na costa noroeste da África, a vida continua difícil.

Na segunda-feira, fará um ano desde que o vulcão Tajogaite - anteriormente conhecido como Cumbre Vieja pelo cume em que se encontra - entrou em erupção. Um ano depois, Leticia e muitos outros enfrentam um futuro incerto.

Leticia trabalha como auxiliar de enfermagem geriátrica, mas o seu contrato termina em dezembro. O seu marido perdeu o emprego quando a plantação de bananas onde trabalhava foi destruída pelo vulcão e agora é empregado do governo local como varredor de ruas, mas o seu contrato também termina no final do ano. E a casa onde vivem, com três quatros, pode ser habitada por eles gratuitamente apenas durante um ano.

"Ainda estou em negação", admitiu Leticia, sentada no pátio da sua nova casa em Los Llanos de Aridane, o centro económico da ilha, que tem cerca de 83 mil habitantes. "Ainda acho que voltarei um dia", prosseguiu.

Do pátio, a mulher pode ver o vulcão que derrubou a sua vida e a encosta da montanha onde ficava a sua casa, mas evita olha nessa direção, assume, confessando sentir falta do seu "jardim, galinhas e de fazer planos com os amigos".

O vulcão esteve em erupção durante 85 anos, ejetando cinzas e rios de lava que destruíram mais de mil casas, além de escolas, igrejas, centros de saúde, estradas e plantações de banana, tão importantes para a economia da ilha.

Até agora, o governo forneceu mais de 500 milhões de euros para habitações temporárias, reparações de estradas, limpeza de cinzas e apoio financeiro a pessoas que perderam o emprego, mas muitos moradores queixam-se do ritmo muito lento da reconstrução da ilha.

Os pedidos de ajuda pública são complexos, dizem eles: os artesãos são frequentemente contratados, os materiais de construção são escassos e as licenças de construção demoram a chegar.

Até agora, apenas cinco das 121 casas pré-fabricadas compradas pelo governo foram destinadas a pessoas desalojadas pelo vulcão, diz o governo regional.

Cerca de 250 pessoas cujas casas foram destruídas ainda vivem em hotéis, segundo a Plataforma das Vítimas do Vulcão, que faz lobby por aqueles que perderam os seus bens. Outros 150 estão hospedados em casas de amigos e familiares.

"Ninguém morreu na erupção, mas alguns de nós prefeririam estar mortos a sofrer todas estas emoções fortes, todos estes problemas que estamos a enfrentar", disse o presidente da plataforma, Juan Fernando Perez Martin, um ex-professor de ensino de 70 anos e que tem poliomielite.

A sua casa, que foi adaptada para a sua cadeira de rodas, ficou enterrada por baixo de 20 metros de rocha derretida.

Frustrado com os atrasos na obtenção de ajuda do governo, Martin fez um empréstimo bancário para comprar uma casa mais modesta na cidade central de El Paso e adaptá-la à sua deficiência. E é lá que mora com a mulher.

Um dos poucos objetos que Martin e a mulher conseguiram levar quando fugiram da antiga casa foi um retrato da Virgem de Guadalupe, que agora aparece com destaque na cozinha da nova habitação. Todo o resto se foi, incluindo a premiada coleção de quase 6000 livros.

"Nunca poderei recuperar isso", disse à AFP no pátio da sua nova casa, onde gosta de fumar charutos.

Embora a erupção tenha sido oficialmente declarada no dia de Natal, o vulcão continuará libertar gases tóxicos durante muito tempo. É por isso que cerca de 1100 pessoas ainda não podem voltar para as suas casas nos arredores de Puerto Naos, uma cidade turística na costa sudoeste da ilha.

Os níveis de gás naquela zona são considerados muito perigosos. Placas com caveiras e ossos cruzados na entrada da cidade alertam para o "risco de asfixia".

"Estamos no limbo", disse Eulalia Villalba Simon, 58 anos, dona de um restaurante e apartamento em Puerto Naos ao qual não tem mais acesso. Agora, vive num apartamento no outro lado da ilha e sobrevive graças à ajuda do governo e de instituições de caridade. "Não sabemos quando poderemos voltar ou até mesmo se alguma vez poderemos voltar porque nos disseram que pode durar meses ou anos. Não sabemos o que vai acontecer", lamentou.

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