"Há tanta coisa boa na TV que é quase como os filmes que costumávamos fazer"
Em 1983, um rapaz desaparece sem deixar rasto numa pequena cidade do Indiana, onde experiências secretas do governo norte-americano se misturam com forças sobrenaturais. Começa aqui o enredo de Stranger Things, a nova série original do Netflix que se estreia nesta sexta-feira. Winona Ryder é a protagonista desta série estranhíssima, concebida pelos irmãos Matt e Ross Duffer como uma homenagem ao cinema dos anos 80. Tem um pouco de The Goonies com a emoção de Stand by Me e vai buscar referências aos Ficheiros Secretos. Numa altura em que a nostalgia da década antes da internet e dos telemóveis está a ressurgir, Stranger Things começa precisamente assim - de forma estranha. Mas, à medida que os epi- sódios se desenrolam, torna-se viciante. Tanto para quem viveu os anos 80 como para quem já nasceu depois e nunca viu um telefone analógico.
É uma estreia também para Winona Ryder em televisão, depois de ter construído toda a carreira no cinema e de se ter dedicado a filmes independentes nos últimos anos. O DN falou com ela em Los Angeles, num evento do Netflix, para perceber como foi parar a Haw-kings, Indiana, para uma aventura sobrenatural.
Como foi o convite para protagonizar esta série de televisão, algo que nunca tinha feito?
Foi muito generalista, enviaram-me a proposta e encontrei-me com eles. Venderam-me isto como, nas suas palavras, uma carta de amor aos filmes dos anos 80 que eles adoravam. Foi um pouco complicado, porque eu só tinha feito filmes. Fiz uma coisa para a HBO mas era algo diferente. Não ter todos os episódios na mão foi um desafio. Propuseram-me isto como uma série de género, mas com elementos muito humanos, engraçados. Foi estranho.
Aceitou imediatamente?
Sendo a minha primeira vez na televisão - chama-se a isto televisão? - a fazer uma série, levei algum tempo. Sou um bocado old school e sempre associei as séries a trabalhar dez meses por ano, a intervalos de publicidade. Tive de ir ver o que se passava para entender um pouco melhor. Também me disseram que ia fazer um "filme de oito horas", mas ia demorar como se fosse um filme muito longo. Foi assim um tiro no escuro, um salto de fé.
Os trailers que saíram fazem lembrar Spielberg e Steven King. Concorda?
Li The Dead Zone quando era mais nova, é um dos meus preferidos de Stephen King, e também gosto do filme de David Cronenberg, consigo concordar com isso. Tem um quê deste género. Obviamente não é tão aterrador. Mas eu não sou a pessoa certa para perguntar porque não tenho visto filmes de terror mais recentes, nem as coisas do King realmente horripilantes. The Shinning foi muito aterrador, deu cabo de mim. Em relação a Spielberg, sim, claro, o E.T. foi muito importante para os Duffers, tal como Encontros Imediatos e Stand By Me, esses foram os filmes de que eles me falaram.
Mas gosta deste género?
Os filmes mais assustadores que já vi foram Don"t Look Back e The Shinning. São brilhantes, mas histórias de terror psicológico assustam-me muito. Não gosto de torture porn, ou como se chama, aqueles filmes que são tão violentos que não consigo ver.
A parte das experiências governamentais na série é muito interessante, e eu gostaria de ver uma série sobre isso. Não sou grande fã deste género, mas queria tentar, simplesmente porque nunca o tinha feito. Pareceu-me uma excelente forma de tentar, porque não é superviolento ou superperturbador, não mete pedofilia - algo que eu nunca quereria explorar, uma energia que eu não quereria trazer para o mundo. No fim de tudo, há muito ali sobre amizade e família em situações extraordinárias. A amizade que os rapazes têm é muito doce.
O que acha deste novo mundo da televisão?
É a primeira vez que faço, e não sou realizadora - sou provavelmente a última atriz que não quer ser realizadora, mas parece-me muito bom. O mundo do cinema neste momento está complicado, porque ou são os super-heróis ou os filmes independentes muito pequeninos. Fiz um desses, The Experimenter, com o meu grande amigo Mike [Michael Almereyda], e adorei, foi um filme lindo e artístico. Mas ele levou seis anos a fazê-lo, e foi um filme pequeno. Não há pessoas como ele e como o Jim Jarmusch a fazerem filmes duas vezes por ano.
Há tanta coisa boa na televisão que é quase como os filmes que costumávamos fazer. Não me parece que hoje se fizesse um filme como Girl, Interrupted. Porque já não há esse tipo de orçamento médio, para filmes que são humanos. Se não tem super-heróis é difícil. Não tenho nada contra super-heróis, precisamos deles na vida real, mas é uma grande oportunidade para fazer bom material e boas séries. O que também é bom é que pessoas que normalmente teriam de esperar algum tempo, ou têm trabalho e filhos e precisam de tempo e dinheiro para ir ao cinema, poderem aceder a tudo isto em casa. Gosto disso.
Em Los Angeles