Há mais verdade num meme
Quem odeia o Nord Stream (NS)? Os EUA. Quem ditou sanções às construtoras do Nord Stream? Os EUA. Quem afirmou que o Nord Stream será bloqueado logo que seja considerado necessário? Os EUA. Quem sabotou então o Nord Stream? A Rússia? Num outro meme escarnece-se ainda: a Rússia investiu milhões no NS, navegou despercebidamente em águas hipervigiadas e, logo no dia em que os EUA testavam drones subaquáticos, pronto: destruiu o seu próprio gasoduto! Enfim, sem ser rir, há quem responda que à Rússia não bastaria apenas fechar a torneira porque só assim, rebentando tudo, lançaria o caos, esquecendo-se, inclusive, que estes pipelines eram o mais poderoso instrumento de pressão de Putin contra as sanções da UE.
Esses disparates lembram aquela diatribe sobre a central nuclear na qual se alardeava que a Rússia se bombardeava a si mesma. Já se sabe que a cobertura noticiosa da invasão tem sido paupérrima e torta, mas quem é que consegue encontrar gota de lógica, racionalidade ou simples bom senso nestes (e noutras) encadeados de patranhas? O curioso é que quem os contesta ou desafia é que é apodado de conspiracionista ou chalupa. Já tínhamos visto este filme com a covid.
Ainda assim, é interessante assistir ao desdobrar e enrodilhar de argumentos para justificar que Moscovo arriscou uma operação de elevado perigo para destruir aquilo que é seu, quando bastava carregar num botão e quando os ganhos objectivos com tal loucura são zero. Raspas.
Mas quem aproveita, afinal? Cui bono? Cui prodest? Já que se armam em peritos forenses, pelo menos respondam à mais essencial questão em qualquer cena de crime: quem mais lucra? Siga-se esse rasto. E, realmente, nem a Rússia, nem a Ucrânia nem a Alemanha e o seu velho continente beneficiam desta calamidade. Antes pelo contrário. De resto, isto só lembra o slogan da NATO sobre a Europa: "Keep the Americans in, the Russians out and the Germans down".
Isso significa que foi o governo Biden?
Não se sabe, mas pessoas como o ex-ministro da Defesa da Polónia - membro do Parlamento Europeu e peso pesado político - tuitou "Thank You. USA", acompanhando as suas palavras com uma foto da explosão. Certo é que as terras do Tio Sam seriam as que mais teriam ganhar, além de que não moraria aqui algo inédito - esta não seria o seu primeira conflito contra oleodutos e gasodutos.
Seja como for, minar infraestruturas submarinas consiste numa táctica geopolítica perigosa, considerando a sua crescente diversidade e importância. Mas também significa subir mais um degrau nesta insana escalada belicista cujo próximo capítulo pode mesmo ser o nuclear. Representa aumentar a tensão e o depauperar até ao osso da Europa, num processo que só é possível contando com a credulidade e a dormência dos nossos povos, ainda zonzos da anestesia geral destes dois últimos anos. Está visto que quando acordarmos será de estremeção e tarde demais. Que tristeza.
Psicóloga clínica. Escreve de acordo com a antiga ortografia