Há mais famílias sobreendividadas devido a penhoras

Gabinete de Apoio ao Sobre-Endividado da Deco abriu 2712 processos de ajuda no ano passado e 13% foram por causa de penhoras
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Aos 81 anos, José (nome fictício) viu a sua reforma e o apartamento onde mora serem penhorados por causa de um crédito pessoal do filho, de quem aceitou ser fiador. Esta situação obrigou-o a recorrer ao Gabinete de Apoio ao Sobre-Endividado da Deco, mas o seu caso está longe de ser único. Em 2015, o GAS abriu 2712 processos de ajuda e 13% foram motivados por penhoras de rendimentos e de bens. Esta foi mesmo a causa de sobre--endividamento que mais aumentou face a 2014.

O desemprego continua a ser a principal razão para as famílias entrarem em rutura financeira e ficarem sem condições para pagar todos os créditos, mas os dados do gabinete coordenado por Natália Nunes mostram que estas situações estabilizaram em 2015 em 31% - em linha com o valor observado em 2014.

Inversamente, as penhoras, que em 2013 representavam apenas 6%, pularam para 9% em 2014 e em 2015 representaram 13% dos processos abertos. Traduzindo em números: foram 353 dos 2712 casos que reuniam condições para ser acompanhados pelo GAS.

Em causa estão, segundo referiu Natália Nunes ao DN/Dinheiro Vivo, penhoras de salários, de subsídios de desemprego e de doença e de bens para fazer face a dívidas de empréstimos e de impostos. A evolução observada nestes dois últimos anos, diz a responsável pelo GAS, "tem que ver com o arrastar da situação económica que estamos a atravessar, em que as pessoas continuam com dificuldades para fazer face a todas as despesas e gastos".

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Parte destas penhoras incidem sobre os responsáveis diretos pelo incumprimento, mas há uma parcela significativa que está a chegar aos fiadores. Tal como José, que responde atualmente por uma dívida de 10 500 euros contraída pelo filho.

Ao longo de 2015, o GAS recebeu 29 056 pedidos de ajuda - um número que revela estabilização face aos 29 mil casos registados em 2014. Deste total, menos de 10% reuniam os requisitos ou as condições necessárias para que pudessem beneficiar do apoio deste gabinete, ou seja, tinham ainda margem para que pudesse haver uma reestruturação dos créditos, ou por não terem sido causados por má gestão das finanças pessoais. Esta relação entre pedidos e processos foi semelhante em 2014.

Os dados do GAS mostram que no ano passado registou-se uma subida do número médio de créditos por sobre-endividado, que passaram de quatro para cinco. O que explica esta mudança? Os casos que vão chegando ao GAS mostram que as famílias estão (de novo) a recorrer mais aos créditos pessoais e ao cartão de crédito. Resta saber, diz Natália Nunes, se esta tendência foi pontual ou se irá manter-se em 2016. "Vamos ver como vai evoluir, mas todos os sinais indicam que infelizmente esta tendência poderá acentuar-se ao longo deste ano", refere, dando como exemplo os indícios de maior flexibilização no acesso ao crédito que começaram a sentir-se recentemente e que cortaram com as restrições registadas durante a fase mais aguda da crise.

Naqueles cinco créditos médios por sobre-endividado cabem um empréstimo da casa, dois créditos pessoais e dois cartões de crédito. Ora, assinala Natália Nunes, apesar de todos contribuírem para desequilibrar os orçamentos familiares, a experiência mostra que as pessoas começam a recorrer mais aos cartões e aos créditos pessoais quando deixam de conseguir fazer face a todas as despesas.

A questão é tão ou mais preocupante quanto se constata que o rendimento disponível das famílias não sofreu nenhuma alteração que justifique esta maior procura de crédito. "Os salários não aumentaram e, se é verdade que há menos desempregados, também é verdade que muitas das pessoas que voltaram a trabalhar estão em empregos precários e a ganhar rendimentos muito baixos", adverte.

Os dados falam mais uma vez por si: a taxa média de esforço dos sobre-endividados rondou os 77% em 2015 (foi de 73% em 2014). Cruzando estes dados com o facto de a maior fatia dos que pedem ajuda (44%) terem um rendimento mensal entre 531 e 1060 euros, verifica-se que no final do mês lhes sobra apenas entre 150 e 300 euros para fazer face a todas as outras despesas. A estes somam-se os 13% de situações de sobre-endividados que dizem receber menos do que um salário mínimo nacional.

Em média, 66% das pessoas que solicitaram a intervenção do GAS fizeram-no quando tinham já prestações de créditos em atraso, contra 63% em 2014.

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