Há crianças que tentam suicídio num campo de refugiados grego

Reportagem da BBC denuncia, através dos Médicos Sem Fronteiras, as condições desumanas em que vivem milhares de refugiados no campo de Moria, na ilha de Lesbos
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A denúncia partiu dos Médicos Sem Fronteiras: no campo de refugiados de Moria, na ilha grega de Lesbos, há crianças com menos de 10 anos que se tentam suicidar porque não aguentam a violência que ali se vive e as condições desumanas. O cenário descrito é de horror - violência extrema, sobrelotação e péssimas condições sanitárias.

"É algo que estamos constantemente a ver. Apesar de estarmos a pressionar ao máximo para tentarmos levar estas crianças para Atenas o mais rápido possível, isso não está a acontecer. As crianças continuam cá", diz o médico Luca Fontana à BBC, adiantando que os Médicos Sem Fronteiras (MSF) têm relatado as condições existentes no campo ao ACNUR (agência das Nações Unidas para os Refugiados) e ao Ministério da Saúde da Grécia.

Luca Fontana que já trabalhou em várias zonas de conflito, nomeadamente na África Ocidental aquando dos surtos de ébola, diz que este é o pior sítio onde esteve em missão: "Nunca vi um grau de sofrimento como o que testemunhamos aqui todos os dias. Mesmo os afetados pelo ébola têm esperança de sobreviver ou têm o apoio de sua família, da sua sociedade, da sua aldeia, dos seus parentes. Aqui, a esperança é tirada pelo sistema."

Os Médicos Sem Fronteiras denunciam ainda as condições higiénicas e sanitárias sub-humanas em que vivem cerca de oito mil pessoas num campo com capacidade para duas mil: uma casa de banho para cerca de 70 pessoas, refugiadas a viverem em tendas com panos de lona, sendo que algumas delas chegam a abrigar 17 pessoas.

Além de problemas do foro mental, as crianças que estão a ser tratadas pelos MSF têm graves problemas de pele devido à falta de higiene, bem como doenças respiratórias causadas pelo gás lacrimogéneo usado pela polícia para acabar com as lutas entre grupos rivais.

A reportagem da BBC permite perceber o quanto o campo de Moria é violento. Em maio, centenas de curdos fugiram por causa de uma grande luta entre árabes e curdos. Mas também há conflitos entre grupos sírios.

"É como a guerra na Síria e até mais feia. Ouvimos falar de casos de violações e assédio sexual", conta Ali que já deixou Moria e que na entrevista à televisão britânica fala do "sectarismo e racismo" que lá encontrou, fosse entre sunitas e xiitas, curdos, árabes e afegãos.

De transitório a permanente

O campo de refugiados de Moria foi criado em 2015 para servir de placa giratória a refugiados que ali deviam ficar apenas alguns dias. Mas desde então, há pessoas que lá estão há anos. A sobrelotação deve-se à aplicação pelo governo grego do acordo entre a União Europeia e a Turquia, que visa a devolução de milhares de refugiados àquele país.

O governo grego que tutela Moria culpa, aliás, a União Europeia pelas péssimas condições do campo. George Matthaiou, representante do executivo em Moria, desculpa-se com a situação económica do país: "Não temos dinheiro. Sabem bem a situação económica na Grécia. Quero ajudar mas não posso fazer nada, a União Europeia fechou as fronteiras", afirma.

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