Há 50 anos a ditadura prendeu 151 "intrépidos adolescentes"

Exposição na Torre do Tombo, em Lisboa, vai assinalar como a resistência à ditadura também foi feita nos liceus de Lisboa e arredores por rapazes e raparigas dos 13 aos 18 anos.
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Nem só de estudantes universitários já jovens adultos, como os liderados por Jorge Sampaio em Lisboa em 1962, ou por Alberto Martins em Coimbra em 1969, se fez a contestação estudantil ao Estado Novo.

A partir de meados dos anos 60 do século passado, desenvolveu-se em Lisboa no Ensino Secundário, a partir de liceus como o Pedro Nunes ou o D. João Castro (que já não existe), mas também nas escolas técnicas, um movimento organizado cujas ações levaram o regime ao ato extremo de prender menores de idade. A coisa foi ao ponto de, num discurso na Assembleia Nacional, o deputado Casal-Ribeiro advogar a necessidade de "esmagar implacavelmente" estes "intrépidos adolescentes" - discurso que marcou um agravamento da repressão.

MAEESL, sigla de Movimento Associativo dos Estudantes do Ensino Secundário de Lisboa, foi o seu nome, e existiu de 1967 a 1974. E nele despontaram para a política ativa figuras como o jornalista José Manuel Fernandes (publisher do Observador), Nuno Crato (ex-ministro da Educação), Miguel Portas (1958-2012, fundador do Bloco de Esquerda), o ator Joaquim de Almeida, entre outros.

No próximo dia 16, sábado, passam 50 anos sobre o ato mais espetacular da vida do MAAESL: a prisão de 151 dos seus ativistas pela PSP quando estavam reunidos na Faculdade de Medicina de Lisboa, situada já, como hoje ainda é, no Hospital de Santa Maria.

Tinham idades entre os 13 e os 18 anos. Cercados por polícias armados com metralhadoras são levados para o Governo Civil de Lisboa. Cinquenta raparigas são enfiadas numa única cela. Doze estudantes do Secundário e cinco do Superior (que só tinham ido à faculdade ver pautas) são levados para Caxias, onde passam uns quatro dias. Os rapazes do Governo Civil são libertados na manhã seguinte -, mas não sem que antes os polícias lhes rapem o cabelo. Depois, nas ruas, alguns passam a andar de gorro enquanto outros exibem orgulhosamente a cabeça rapada, como troféu de guerra.

É sobre estes acontecimentos que hoje será inaugurada às 16h00 no Arquivo Nacional Torre do Tombo (ANTT), em Lisboa, a exposição Há sempre alguém que diz não - A oposição estudantil à ditadura no Ensino Secundário de Lisboa (1970-1974).

A organização coube ao Coletivo Que Diz Não!, composto por Rui Gomes, Miguel Mira, Jorge do Ó, Jorge Silva, Ivone Ralha, Rita Areosa, António Salgueiro, Rui Cartaxo e Rui Capão (já falecido).

Falando ao DN, Rui Gomes, hoje um professor universitário aposentado de 68 anos e naquela altura dirigente do MAEESL - conhecido por Tarzan devido à sua forte compleição física - diz que a exposição vai revelar, por exemplo, a lista que a PSP fez com os nomes dos 151 jovens detidos naquela fria noite de 16 de dezembro de 1973.

Também mostra exemplares dos relatórios diários feitos em liceus de Lisboa por agentes da PSP à paisana.

A exposição, montada sem qualquer apoio da Comissão das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, que invocou falta de verba, estará patente no ANTT até 28 de fevereiro de 2024.

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