Guterres: Eleição pede último esforço diplomático
António Guterres venceu as três votações secretas para secretário-geral (SG) da ONU mas Portugal deve fazer um último esforço diplomático para garantir o sucesso da candidatura, afirma o embaixador António Martins da Cruz ao DN.
"Acabaram as votações exemplificativas. Agora é altura para uma última pressão, para ver bem o que esses países [membros do Conselho de Segurança] querem da máquina das Nações Unidas e reforçar ou propor troca de votos", assume o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, numa altura em que ainda se admite surgirem novos candidatos para além dos atuais 10.
Com apoiantes da neozelandesa Helen Clark (em sétimo lugar) a difundir nas redes sociais - após o resultado da terceira votação secreta realizada segunda-feira - um artigo crítico sobre os mandatos de Guterres como Alto Comissário para os Refugiados (2005-2015), o embaixador António Monteiro dá um argumento que, admite, também pode explicar o terceiro voto negativo dado agora ao português : "Quem é apoiante de um candidato procura eliminar o mais perigoso. É natural algum extremar de posições."
António Monteiro, contudo, não acredita que venham a existir "campanhas sujas" contra o candidato português (ou outros, como a búlgara Irina Bukova, que há dias disse haver uma "campanha indigna" contra si). Para este também ex-chefe da diplomacia portuguesa, "a reputação de António Guterres está consolidada e não é com fantasmas e alegações não fundamentadas que a poderão manchar".
Um diplomata desvaloriza, sob anonimato por não estar autorizado a falar, o referido artigo (de junho, na Fox News, sobre "centenas de milhões de dólares [entregues] sem verificação" a governos e organizações privadas): "São milhões porque há milhões de refugiados e foi António Guterres que mandou implementar um regime mais apertado de controlo, fiscalização e auditoria" das verbas geridas pela agência da ONU que liderou durante 10 anos.
"Tenho falado com muita gente e a opinião sobre [Guterres] é excelente e sem mácula, até pela lisura com que sempre procurou criar condições para os refugiados terem o apoio que necessitavam", enfatiza ainda António Monteiro, um antigo embaixador junto da ONU.
Com a Nova Zelândia - cuja candidata oficial é Helen Clark - a assumir hoje a presidência do Conselho de Segurança mas a delegar já na Rússia (que lhe sucederá no mês de outubro) a responsabilidade pelo processo eleitoral, Martins da Cruz dá outra explicação para haver um esforço diplomático final de Lisboa: "Quer António Guterres ganhe quer perca, a sua vitória ou derrota não são pessoais. Dado o empenho do Governo e a posição de respaldo dada pelo Presidente da República e pelos partidos da oposição, a candidatura é nacional e a sua derrota ou vitória seria também do país."
Quando parecem enfraquecidos os critérios apontados como decisivos na escolha do SG e que excluíam Guterres (único a receber mais de nove votos nas três votações) - ser mulher e da Europa de Leste -, Martins da Cruz alerta que a terceira semana de setembro "é essencial para a diplomacia portuguesa": muitos chefes de Estado e duas centenas de ministros dos Negócios Estrangeiros estarão na abertura da nova sessão da Assembleia Geral da ONU.