Guterres com israelitas e palestinianos para ressuscitar processo de paz

Na primeira visita à região desde que tomou posse em janeiro, secretário-geral da ONU vai estar com Netanyahu e Abbas.
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Em 2001, António Guterres presidia ao Congresso da Internacional Socialista em Lisboa. E se o encontro contava com figuras como o moçambicano Joaquim Chissano, o o espanhol, José Luis Zapatero ou o peruano Alan García, foram o israelita Shimon Peres e o palestiniano Yasser Arafat a dominar as notícias ao apertarem as mãos sob o olhar do então primeiro-ministro de Portugal. Hoje é como secretário-geral da ONU que Guterres chega a Israel, de onde segue para uma visita aos territórios palestinianos. Os protagonistas, de ambos os lados, são diferentes, mas o objetivo é o mesmo: "ressuscitar um processo de paz" parado há três anos.

Com encontros previstos com o presidente, o primeiro-ministro e o ministro da Defesa israelitas - Reuven Rivlin, Benjamin Netanyahu e Avigdor Lieberman -, Guterres deve reunir-se ainda com o presidente palestiniano, Mahmoud Abbas, em Ramallah, na Cisjordânia. O secretário-geral da ONU tem também na agenda, na quarta-feira, último dia da visita, uma visita à Faixa de Gaza onde a ONU gere um programa de apoio aos palestinianos. Governada pelo Hamas desde 2007, o pequeno território de 40 km por dez de largura e uma população de quase dois milhões, foi palco em 2014 do último grande confronto entre Israel e palestinianos, com o primeiro a lançar a operação Escudo Protetor com o objetivo anunciado de pôr fim aos tiros de rockets a partir de Gaza. No conflito morreram 67 soldados israelitas e, segundo dados da ONU, 1462 civis e 789 militantes palestinianos.

Guterres chega a Israel num altura em que o Estado hebraico - que nasceu em 1948 de uma resolução da ONU - reteve nove milhões de dólares dos 47 milhões (11 milhões para taxas operacionais e 36 para missões de manutenção da paz) com que contribui para as Nações Unidas. Esta foi a medida retaliatória das autoridades israelitas depois de a UNESCO e a Comissão de Direitos Humanos da ONU terem aprovado resoluções que Israel considera discriminatórias.

Num artigo a anunciar a visita de Guterres, o Jerusalem Post sublinhava, contudo, que o novo secretário-geral da ONU estará a tentar "combater a inclinação anti-israelita" na organização. E segundo o mesmo jornal, o português será "mais recetivo do que o antecessor [o sul-coreano Ban Ki-moon] às queixas de Israel de discriminação e tratamento prejudicial".

Em março, no Congresso Judaico Mundial, o secretário-geral da ONU garantiu que Israel "tem de ser tratado da mesma forma que os restantes" membros da organização e explicou que a "moderna forma de antissemitismo é a negação da existência do Estado de Israel". Mas outras declarações de Guterres caíram menos bem junto dos israelitas. Como a que fez nos 50 anos da Guerra dos Seis Dias em que dizia que "a ocupação impôs ao povo palestiniano um fardo pesado em termos humanitários e de desenvolvimento", acrescentando: "A ocupação alimentou ciclos de violência e retaliação. A sua perpetuação envia uma mensagem inequívoca a gerações de palestinianos de que o seu sonho de um Estado está destinado a não passar disso - um sonho; e aos israelitas de que o seu desejo de paz, segurança e reconhecimento regional continua inalcançável".

A visita de Guterres surge dias depois da ida à região de Jared Kushner, o genro e conselheiro de Donald Trump. Judeu praticante, Kushner liderou uma delegação americana que se reuniu com Netanyahu, primeiro, e depois com Abbas. Aos 36 anos e sem experiência diplomática, depois do encontro com o primeiro-ministro israelita Kushner garantiu que Trump "está empenhado em conseguir uma solução que traga paz e prosperidade a todos os povos da região".

Pressionado pela extrema-direita sua parceira de coligação, Netanyahu não pode aceitar o fim da construção de colonatos na Cisjordânia. Este foi um dos motivos que levou à rutura das negociações há três anos. Uma posição que deve tornar difícil para Trump conseguir "o maior de todos os acordos", mesmo contando com os préstimos no terreno do genro, que a quem o presidente terá dito ainda antes de tomar posse: "Se tu não consegues levar a paz ao Médio Oriente, ninguém vai conseguir".

Mas Kushner já se deparou antes com a dificuldade da sua tarefa. Depois de uma visita a Israel e aos territórios palestinianos em junho, passou horas ao telefone para lidar com a crise gerada pela instalações de detetores de metal na Esplanada das Mesquitas, onde fica o Muro das Lamentações, santo para os judeus, e a mesquita de Al-Aqsa, terceiro lugar mais santo dos muçulmanos.

No encontro desta semana com Abbas, Kushner terá - segundo fontes diplomática disseram ao jornal árabe Al-Hayat - citado pelo israelita Haaretz, confessado ao presidente palestiniano que será "impossível parar a construção de colonatos porque isso levaria à queda do governo de Netanyahu". Abbas, de 82 anos e cujo mandato já expirou há muito, é acusado pelos israelitas de não travar o incitamento à violência entre os jovens palestinianos, além de lidar com lutas internas pelo poder dentro da Fatah.

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