Governo recusa transformar a ADSE num "SNS II"

Ministra conta fechar tabelas das convenções do sistema público em abril e, depois, "agarrar o assunto das regularizações".
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A ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão, justificou ontem a exclusão de alguns trabalhadores do alargamento da ADSE a contratos individuais de trabalho, realizado no início deste ano, com a necessidade de não "desvirtuar" o subsistema de saúde dos funcionários públicos, apesar da "filigrana complexa" de que é feito o setor público.

"O critério é serem pessoas coletivas públicas e não serem sociedades anónimas ou sociedades por quotas", defendeu a governante, em resposta aos deputados sobre a exclusão das empresas municipais da lista de entidades abrangidas pelo alargamento legislado no início deste ano. De resto, também entidades como a RTP ou a Infraestruturas de Portugal ficam de fora.

Neste alargamento, ficam de fora trabalhadores de empresas municipais, de reguladores e dos hospitais de Loures e Cascais, em resultado do que a legislação definiu. Esta prevê que possam inscrever-se todos os trabalhadores com contrato de trabalho em funções públicas e contrato individual de trabalho das entidades públicas previstas na Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, das instituições de ensino superior públicas e ainda de "entidades públicas empresariais, independentemente de serem do Estado, regionais ou municipais, desde que não tenham caráter industrial ou comercial".

"Onde é que eu, decisor político, traço a fronteira para não desvirtuar a ADSE?", perguntou a ministra em audição a pedido do PSD na comissão parlamentar de Administração Pública, respondendo com exemplos: empresas de capitais públicos ("Se amanhã, os capitais públicos forem vendidos, tira-se a ADSE a essas pessoas?", atirou) ou parcerias público-privadas, como as concessionárias de autoestradas, por exemplo. "É a própria caracterização da ADSE que está em causa", defendeu.

Na audição, a deputada social-democrata Carla Barros considerou que o governo se comportou como "elefante numa loja de porcelana" na redação da lei.

Os deputados alertaram que há trabalhadores de serviço público que, por terem empregador privado, não têm acesso à ADSE, havendo colegas "ao lado" que têm - o que sucede entre os trabalhadores dos hospitais.

Alexandra Leitão defendeu, contudo, que o diploma vai ao encontro das preocupações do Conselho Geral e de Supervisão da ADSE de não tornar o subsistema de saúde um "seguro público de saúde" aberto a todos, ao mesmo tempo que assegurou ter ouvido os representantes dos trabalhadores "dezenas de vezes" apesar de o governo não ser a isso obrigado.

"A ideia de transformar a ADSE num Serviço Nacional de Saúde 2 não vai acontecer com este governo", lançou aos deputados, justificando que a matriz da ADSE é que esta é "uma responsabilidade do Estado enquanto empregador", conforme a origem histórica do subsistema.

Inicialmente, com este alargamento, o governo previu fazer chegar a ADSE a mais cem mil subscritores, acrescidos de mais 60 mil familiares, com a finalidade de aumentar a sustentabilidade financeira da ADSE e, também, de garantir mais justiça no acesso ao subsistema. Até esta terça-feira, inscreveram-se mais de 41 mil trabalhadores, segundo Alexandra Leitão.

Os deputados de PSD, CDS-PP e Iniciativa Liberal, e também do PCP, quiseram saber se haverá novo alargamento - só com a atual "matriz", sem considerar sociedades anónimas, respondeu a ministra - e a razão pela qual não é aberta a ADSE a ex-beneficiários "arrependidos".

Alexandra Leitão defendeu que não seria justo dar os benefícios sem os tempos de contribuição, considerando que os trabalhadores poderão ser menos "solidários" com o sistema e mais calculistas na sua adesão: "Tenho 30 anos, tenho mais 30 anos de vida sem doenças à minha frente. Aos 50 anos, entro", exemplificou.

Outra das questões dirigidas à ministra foi a possibilidade de os descontos de 3,5% dos trabalhadores públicos passarem a incidir apenas sobre 12 meses de salário, e já não sobre subsídio de férias e subsídio de Natal - uma hipótese que o governo exclui. "Só adoecemos em 12 meses, mas em Portugal ganhamos em 14 meses", respondeu a ministra.

Na audição, a ministra disse também acreditar que no próximo mês será possível fechar o acordo com prestadores de cuidados de saúde privados para novas tabelas de preços no regime convencionado da ADSE. A seguir, disse, o governo pretende "agarrar o assunto das regularizações".

"Uma vez aprovadas e aceites pelos operadores, o que tenho esperança que possa ocorrer ao longo do próximo mês, estaremos em condições de ter todo um novo enquadramento de relacionamento com os operadores privados que permita também reabrir outros dossiês, como o dossiê das regularizações", afirmou a ministra em resposta à deputada Paula Santos, do PCP.

A governante não quis adiantar pormenores sobre as tabelas, cuja negociação foi iniciada em 2018 com o objetivo de "fechar" preços a pagar pelo sistema e acabar com as regras que impõem devoluções de valores pagos aos prestadores de saúde quando estes se desviam dos preços mínimos ou das médias do mercado . Estas poderão implicar a devolução de um valor acima de 74 milhões de euros nas estimativas para os anos de 2015 a 2019.

As tabelas "estão exatamente neste momento em fase de serem aprovadas, numa última fase de discussão com os operadores privados, e, portanto, não é o momento mais apropriado para falar delas", defendeu.

Além da revisão da tabela de preços das convenções celebradas entre ADSE e prestadores privados, está prevista também a revisão dos preços no regime livre do subsistema.

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