Governo diz que acordo "fecha com chave de ouro" a participação de Portugal na COP28

A declaração final da COP28 está "muito mais em linha" com o que diz a ciência, com uma linguagem "do fim dos fósseis", destaca o ministro do Ambiente português, que fala numa "perspetiva de esperança".
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O ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, considerou que o acordo alcançado esta quarta-feira na Cimeira do Clima "fecha com chave de ouro" a participação de Portugal na COP28 e dá uma perspetiva de esperança.

"O facto de termos conseguido uma declaração fecha com chave de ouro a participação de Portugal na COP, mas dá-nos também uma perspetiva de esperança, que é muito necessária na política climática", disse Duarte Cordeiro, no Dubai.

As declarações, à Lusa, surgem, após ter sido conseguido um acordo para desbloquear as negociações sobre o clima no Dubai, apelando ao abandono dos combustíveis fósseis, para alcançar a neutralidade carbónica até 2050.

Duarte Cordeiro afirmou que esta declaração, "do ponto de vista daquilo que é o texto e a sua ambição", está "muito mais em linha" com o que diz a ciência, com uma linguagem "do fim dos fósseis".

O governante destacou o facto de, no que diz respeito ao fim dos subsídios fósseis, ter sido retirada do texto inicial "alguma da linguagem que abria alçapões para a sua utilização", tendo o texto sido alinhado "com aquilo que era o mandato da União Europeia".

Reconheceu que não é exatamente o que a União Europeia queria, mas "é um compromisso" e destacou a consagração, na declaração, de compromissos relativamente aos oceanos:

O ministro realçou que para Portugal "foi importante" que a declaração consagrasse "aspetos relativos aos oceanos".

"Sem a consagração internacional dos oceanos, depois, nós não conseguimos fazer migrar para os planos nacionais o impacto que os oceanos podem ter, desde logo na capa na captura de carbono", referiu.

Já a secretária de Estado da Energia, Ana Fontoura Gouveia, considerou que o dia de hoje é "muito feliz".

"Na verdade, 30 anos depois, 28 COP depois, começámos finalmente o fim dos combustíveis fósseis e, por isso, temos de estar muito contentes por termos conseguido que 197 países decidissem em conjunto, por unanimidade, começar este caminho de afastamento dos combustíveis fósseis e também dotar os países mais vulneráveis, que estão mais expostos às alterações climáticas, dos meios para se defenderem, para se protegerem e para assegurarem a qualidade de vida dos seus cidadãos", afirmou a governante.

A associação ambientalista Zero considera que o acordo alcançado esta quarta-feira na Cimeira do Clima do Dubai (COP28) é um "avanço importante", mas tem um "sabor agridoce" porque ainda deixa em aberto muitas opções "falsas e contraditórias".

Em comunicado, a Zero diz que de uma forma geral, o documento final abre caminho para o fim da era dos combustíveis fósseis, mas "não reflete a necessidade de financiamento necessária, nomeadamente na questão das perdas e danos e também no equilíbrio entre os esforços de mitigação e adaptação".

A Zero destaca que o Balanço Global foi acolhido com satisfação "após a inclusão e reforço das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC, em inglês), as fortes referências à ciência, além dos diversos elementos que serão a base para garantir um caminho do próximo balanço global".

O documento, realça a Zero, inclui igualmente referências importantes sobre o "oceano, onde se reconhece a importância do restauro dos ecossistemas marinhos e das ações de mitigação e adaptação marinhas, reforçando o nexo Oceano-Clima".

A associação considera que o texto não fala especificamente sobre a eliminação progressiva e mitigação dos combustíveis fósseis de uma forma que seja de facto "a mudança radical necessária".

A Zero realça também que a linguagem do documento final apresenta uma "série de lacunas que podem ser usadas a favor de países que ainda não estão alinhados com a ação climática", sublinhando que no parágrafo 26 do balanço global, "não é apresentado qualquer compromisso ou mesmo um convite para as Partes atingirem o pico de emissões até 2025".

No entendimento da Zero, a posição de Portugal foi sólida, tendo desempenhado um papel ativo, incluindo a disponibilidade para coordenação política de temas em discussão, bem como a responsabilidade de ter uma presença física nos recintos através de um Pavilhão de Portugal.

"Portugal também precisa de não falhar em setores como os transportes cujas emissões têm estado em contramão, apostando nas renováveis mas de forma sustentável e não se distrair com soluções erradas como a exportação de hidrogénio verde", realça a associação.

A Zero sublinha ainda que os próximos anos deverão ser de "reforço na cooperação internacional, esforços locais, regionais e nacionais para manter o 1,5.ºC vivo e por uma eliminação dos combustíveis fósseis completa, financiada, justa, rápida, feminista e para sempre".

O grupo Climáximo denuncia a ausência de objetivos vinculativos no acordo alcançado hoje na COP28, que aponta pela primeira vez para o abandono dos combustíveis fósseis, sublinhando que o documento reconhece falhanços na luta contra as alterações climáticas.

Em declarações à Lusa, Noah Zino, membro da organização ativista ambiental, sustenta que a declaração dos países reunidos na Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP28), no Dubai, não difere muito do que foi feito nas anteriores cimeiras e reforça a convicção de que "nenhuma instituição é capaz de parar de produzir a crise climática".

"Liderada pelo executivo de uma petrolífera, o texto nem sequer vincula nada nem nenhum país e o que vemos é uma espécie de cadáver do Acordo de Paris [de 2015], que já está morto há anos e foi maquilhado, apesar do seu falhanço óbvio. 2023 é o ano com mais emissões de sempre e continuam a passar falsas soluções que não vinculam nada a ninguém", refere.

O texto da COP28 apela à "transição dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos, de forma justa, ordenada e equitativa, acelerando a ação nesta década crucial, a fim de alcançar a neutralidade de carbono em 2050 em acordo com recomendações científicas".

No entanto, Noah Zino realça que o documento da cimeira também assume que "os esforços atuais só vão reduzir as emissões por 2% até 2030", sem mudanças realmente visíveis no clima, e que nem a meta de triplicar o uso de energias renováveis será efetiva perante a dependência dos combustíveis fósseis.

"Triplicar renováveis não serve para nada se não for para cortar uns 70% de emissões até 2030. Isto é, têm de falir algumas das maiores petrolíferas do mundo. Nenhuma desta expansão energética está associada a uma redução de emissões, simplesmente querem produzir mais energia e tentam passar uma narrativa de que isso está associado a alguma espécie de corte de emissões. E isso não está escrito em lado nenhum. Nada disto é vinculativo", observa.

A ativista contesta ainda a aposta em "falsas soluções" sem provas científicas de viabilidade, como a tecnologia de captura de carbono ou ao hidrogénio, mas também a aposta em Portugal em projetos que podem vir a reforçar as emissões de carbono, nomeadamente "o novo aeroporto, um gasoduto ou a expansão do terminal fóssil em Sines".

"É mesmo impossível resolver a crise climática no modelo económico que temos e precisamos urgentemente de uma resposta de crise, da mesma forma que tivemos ao covid, porque, efetivamente, estamos numa emergência", afirma, continuando: "Nada disto é um compromisso sério para lidar com a crise climática e a crise social".

Noah Zino lamenta ainda que o acordo não deixe vinculada uma transição justa para os trabalhadores da indústria fóssil e apela a uma mudança sustentável na política económica para os países em vias de desenvolvimento, que são mais afetados pelas alterações climáticas.

"O que desenvolve economias não são os combustíveis fosseis, mas sim a energia. Se houver um esforço global - que parta das pessoas - de resistir contra a economia fóssil e de colocar energia renovável, transportes públicos coletivos acessíveis e uma indústria de 'emissões zero' no centro da economia, é muito mais fácil desenvolver estes países, porque estão a sofrer as consequências de décadas de colonialismo fóssil", conclui.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, aplaudiu hoje o acordo alcançado na COP28 e considerou que "uma parte crucial" só foi possível por causa da União Europeia (UE).

"Felicitações COP28! Uma parte crucial desde acordo histórico é verdadeiramente feito na Europa", escreveu a presidente da Comissão na rede social X.

Ursula von der Leyen acrescentou que "o mundo inteiro apoiou" os objetivos da UE para 2030, nomeadamente triplicar a utilização de energias renováveis e duplicar eficácia energética nos próximos seis anos.

"O acordo de hoje é o início do fim da era dos combustíveis fósseis", finalizou.

Os países reunidos na cimeira do clima aprovaram hoje "por consenso" uma decisão que apela a uma "transição" no sentido de abandonar os combustíveis fósseis, anunciou o presidente da COP28, no Dubai.

Trata-se de uma "decisão histórica para acelerar a ação climática", afirmou Sultan Al Jaber, presidente da conferência da ONU.

O documento, com publicação aguardada durante toda a noite pelos negociadores desta Conferência da ONU sobre Alterações Climáticas (COP28), propõe, pela primeira vez na história destes encontros, mencionar todos os combustíveis fósseis, principais responsáveis pelas alterações climáticas, numa decisão a adotar por todos os países.

O texto apela à "transição dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos, de forma justa, ordenada e equitativa, acelerando a ação nesta década crucial, a fim de alcançar a neutralidade de carbono em 2050 em acordo com recomendações científicas".

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