Governo corta potencial de subida às acções da Galp
O Governo ignorou a sugestão dos bancos na fixação do preço da operação. Cada acção da Galp entra na Bolsa com um preço de 5,81 euros. Um valor muito acima dos 5,25 euros que os bancos queriam, tendo em conta as ordens que a maioria dos investidores institucionais tinha dado. Como consequência, os títulos ficam com uma margem de subida muito mais reduzida nos primeiros meses, embora possam valorizar nas primeiras sessões.
A forte procura registada na operação permitiu ao Governo maximizar o encaixe da venda dos 25% que ainda detinha na petrolífera. As acções ficaram na parte mais alta do intervalo de 5,06 a 6,12 euros definido inicialmente e colocam o valor da empresa acima dos 4800 milhões de euros, o que permite ao Estado obter uma receita de cerca de 1200 milhões de euros. Desta forma, só precisa de vender a sua participação na Portucel ao valor mais baixo do intervalo definido para cumprir as receitas previstas no Orçamento do Estado para 2006 (1600 mil milhões). E, neste cenário, fica adiada para o ano a venda da REN na Bolsa .
Segundo disse ao DN fonte do processo, "uma boa parte dos investidores estrangeiros ficou de fora da operação porque tinha fixado um limite de preços muito abaixo do valor final". Isto significa que muitos fundos de pensões ou de investimento preferidos pelos bancos - devido à estabilidade que trazem às acções - não farão parte do capital da Galp. Os portugueses BES e CGD e os estrangeiros Merrill Lynch e Morgan Stanley lideraram a operação.
Acções a 5,52 euros para pequenos subscritores
Os pequenos subscritores vão receber as suas acções - perto de 600 cada - com um desconto de 5%, mais precisamente nos 5,52 euros. Um valor que, ainda assim, não deverá permitir grandes lucros no curto prazo. Para a mesma fonte, "o potencial de valorização diminui com os valores fixados para as acções. E aumenta o risco de se verificarem quedas a dois ou três meses", precisamente o prazo a partir do qual as acções podem ser vendidas pelos pequenos investidores. Para Carlos Bastardo, director de private banking do BPN, "é um preço bom para quem vende, mas é mau numa perspectiva de investimento. Nos primeiros dias até pode subir, uma vez que ficaram muitos estrangeiros de fora. Mas depois esse potencial ficou bastante reduzido".
Na base da opção do Governo estiveram os elevados valores da procura: na oferta pública de venda (OPV) foram dadas mais de 200 mil ordens de compra para 1726 milhões de acções, o que excede a oferta em 21 vezes. No que diz respeito à venda directa a institucionais, a procura excedeu em 16 vezes a oferta ao preço máximo e 22 vezes ao preço mínimo. Hoje, às 17.00, terá lugar nas instalações do Euronext Lisboa a sessão especial de bolsa da Galp. Amanhã, as acções começam a ser negociadas na Bolsa.
Momento "negativo" em termos internacionais
Numa análise ao momento da operação, o actual contexto do mercado interno dificilmente seria mais positivo. A Bolsa de Lisboa negoceia nos valores mais altos desde 2001, estão em curso duas ofertas públicas de aquisição (OPA) no mercado envolvendo quatro das maiores empresas do País (Sonae sobre PT e BCP sobre BPI) e a economia dá os primeiros sinais de recuperação.
No exterior, o momento já não é tão favorável, sobretudo por questões sectoriais. Na carteira dos grandes investidores internacionais, a Galp terá de rivalizar com gigantes como a BP, Total, Shell ou Repsol. O preço do petróleo está a 25% do máximo histórico atingido em Agosto e as margens de refinação do sector iniciam um ciclo de queda. Por outro lado, os defeitos da Galp são mais visíveis a partir de fora, a começar por ter pouca exploração de petróleo e por viver um momento de indefinição na sua liderança. O Governo tem ainda a opção de vender mais 2,5% da empresa no primeiro mês de cotação, correspondentes a mais de 17 milhões de acções (green shoe). A decisão de o fazer será mais um sinal para perceber se a estreia da Galp na Bolsa correu bem.
O sucesso da operação só será, contudo, conhecido no início de 2007. Não só porque a Galp ganhará maior visibilidade com a inevitável entrada no PSI-20, mas sobretudo porque termina o prazo - a 21 de Janeiro - que impede os investidores de venderem as suas acções. Nessa altura - quando o preço justo das acções for mais claro - perceber-se-á se a Galp, com um preço inicial de 5,81 euros, ressuscitou a "democratização do mercado de capitais" ou se foi mais uma operação falhada no objectivo de tornar a Bolsa num instrumento de utilidade para investidores e empresas.