Golda, a Dama-de-Ferro israelita
Esta semana, o filme Golda estreia nas salas de cinema portuguesas. Haverá melhor altura para evocar esta mulher e a sua liderança?
Golda Meir nunca se viu como heroína, nem como pioneira, nem tão pouco se rotulou como feminista e, no entanto, esta mulher derrubou muros, virou convenções do avesso e pelo caminho foi estilhaçando uns quantos tetos de vidro.
Há mais de 50 anos, numa época em que muitos pensaram tal ser inimaginável, a Dama-de-Ferro israelita desbravou o caminho das mulheres de todo o mundo na ascensão a cargos de liderança. Aquela que foi a primeira mulher a chefiar Israel assumindo o cargo de primeira-ministra em 1969, aos 70 anos, demonstrou que as mulheres podem, sim, servir como primeiras-ministras, presidentes e ministras da Defesa. Volvido meio século após a sua morte, o percurso que traçou continua a ser uma fonte de inspiração, conquanto reconheçamos o ainda longo caminho a percorrer. Precisamos de mais mulheres em lugares de decisão.
Golda foi uma líder notável em tempos muito sensíveis. Teve de atuar em circunstâncias ingratas e de tomar decisões difíceis.
O filme retrata esse momento absolutamente pivotal na sua liderança - a Guerra do Yom Kippur -, um ponto de viragem histórico para Israel, inicialmente sombrio e incerto aos primeiros dias da guerra, mas que acabou por simbolizar a certeza inquebrantável na capacidade de sobrevivência do jovem Estado.
Foi preciso cerca de uma semana de combates sem tréguas para um volte-face a favor de Israel. A guerra deixou, contudo, marcas na nossa sociedade. Posso atestar pessoalmente da sua profundidade pois a minha própria família sentiu o seu impacto, tendo o meu pai nela combatido e sofrido ferimentos graves.
A Guerra do Yom Kippur continua a ser um trauma nacional gravado na psique da sociedade israelita e ensinou-nos uma lição crucial:
- Não basta sermos a nação mais forte da nossa região. Temos de procurar incessante e obsessivamente a paz, pois nenhuma guerra pode elevar-se aos benefícios que aquela pode trazer.
Esta aspiração conduziu aos tratados de paz com o Egito e a Jordânia, bem como às recentes adições à paz dos EAU, do Bahrein e Marrocos que sobrevieram através dos Acordos de Abraão. Também iniciámos um processo de paz com os palestinianos e almejamos testemunhar, em breve, o seu resultado.
Não podemos deixar de salientar a importância da ajuda americana que Israel recebeu durante a guerra (que vemos muito bem retratada no filme), e sem a qual o desfecho do conflito poderia ter sido muito diferente. Mas há, também, uma perspetiva portuguesa na Guerra do Yom Kippur e é, na minha qualidade de embaixador de Israel em Portugal, que, precisamente 50 anos após a guerra, tenho a oportunidade de expressar a nossa sincera gratidão a este país:
Portugal foi o único país europeu que autorizou os aviões americanos a reabastecerem, na Base das Lajes, a caminho de Israel. Sem esta autorização os abastecimentos americanos nunca teriam chegado ao seu destino.
O apoio de Portugal foi um testemunho da força das nossas parcerias globais e do empenho partilhado na paz e na segurança. 50 anos depois dizemos, uma vez mais, muito obrigado.
É a propósito deste agradecimento a Portugal e do nosso anseio nacional por paz que quero encerrar esta homenagem à estadista Golda Meir com chave de ouro, com uma das suas das citações mais inspiradoras: "Confia em ti próprio. Cria a pessoa com a qual terás prazer em viver durante toda a tua vida. Tira o máximo partido de ti próprio transformando pequenas faíscas de possibilidade em chamas de realização."
Embaixador de Israel