Goa: de paraíso turístico a porto de carvão?

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Desde há tempos Goa é centro nevrálgico de construção de habitações, de escritórios e, sobretudo, hotéis, de forma desordenada, com alta densidade de construção. É a resposta à imensa procura de aquisição de andares para "segunda morada" de pessoas de toda a Índia, que lá querem passar as suas férias e temporadas de descanso; ou ao crescente turismo, que já ronda números de quatro vezes a população do pequenino Estado. Igualmente anárquica e volumosa tem sido a exploração mineira, que chegou em dado momento a mais de 50 milhões de toneladas por ano, de minério de ferro e manganês, que vai poluindo as águas dos rios e as encostas dos montes, fazendo lembrar o rio Amarelo, de tanta terra dissolvida e lodo que arrasta. Apesar dos protestos vigorosos de ambientalistas, pouco se conseguiu, porque estão em jogo interesses milionários.

Mais recentemente, aparece uma atividade ainda mais destrutora e mortífera: os grandes grupos económicos como o Adani, Jindal e Vedanta, produtores de energia elétrica em centrais térmicas a carvão, de aço e produtos de refinação, no estado de Karnataka, estão a importar carvão de países exteriores, nomeadamente da Austrália, pelo porto de Mormugão, para levarem depois, atravessando toda a Goa e mais de 300 km para o interior, até às instalações onde é utilizado.

Foram 12,75 milhões de toneladas (MT) importadas em 2016-17; e serão 25 MT por ano, em 2020, que poluem a zona portuária onde é desembarcado e todo o trajeto por onde segue. O transporte é por camiões, por comboios de carga - cerca de nove comboios por dia, hoje, com 58 vagões cada um -, e também por barcaças, pelos rios acima. A zona portuária e todas as aldeias nas redondezas das linhas de transporte enchem-se de finíssimo pó de carvão, um veneno para quem o vai respirando por força da sua localização. Se tudo continuar como previsto, aqueles industriais contam alcançar 52 MT em 2030!, para as suas usinas de capacidade redobrada.

De acordo com uma ampla reportagem do The Indian Express, nos dias 25 a 28 de outubro, são 25 toneladas por minuto do caudal de carvão que circulam pelas três vias. A inalação do carvão já está a provocar graves problemas respiratórios. No desembarque e armazenamento e depois no seu manuseio e transporte, põe pois em causa a saúde das populações; a maioria das aldeias de Goa tem elevada densidade populacional. Além disso, no trajeto está a pôr em perigo dois santuários de vida selvagem e um corredor de tigres (os tigres na Índia, ainda que não sagrados, são muito respeitados e protegidos).

Há grupos de defesa do ambiente, goeses, que estão a batalhar e espera-se que consigam parar a receção deste poluente, que vai provocando a morte lenta das pessoas e animais sob a sua influência.

No último ano de 2016, Goa recebeu 6,33 milhões de turistas: domésticos, na sua grande maioria e, em menor proporção, cerca de 0,68 milhões, estrangeiros. A atividade carbonífera virá a ter consequências drásticas no turismo. As leis que determinam os índices admissíveis de concentração do carvão, na zona da descarga, no transporte pelas três vias, devia ser cuidadosamente revisto, de acordo com os conhecimentos científicos atuais e, em qualquer caso, muito exigentes e de grande rigor na aplicação, porque se está a brincar com a saúde e vidas humanas.

Infelizmente, os grupos económicos só pensam nos benefícios imediatos, pouco se importando com as consequências no médio e longo prazos. Eles afirmam ater-se às exigências legais, que na Índia são frouxas ou afrouxadas pelo enorme peso do dinheiro.

Goa tem uma elevada densidade de hotéis de cinco estrelas, mais de 23 numa área de 3700 km2; eles perfazem 11% dos hotéis de cinco estrelas da Índia toda. A redução de turistas, por causa do carvão, será uma grande perda para a economia de Goa e da Índia, para além da perda de vidas intoxicadas!

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