Gestão danosa
Há mais "Europa" no Reino Unido do que se pensa, a começar pela erosão bipartidária. Os dois grandes valiam 95% em 1955, hoje andarão pelos 70%. Mesmo com proteção do sistema eleitoral, nenhum está imune à erosão do tempo. A identidade partidária degradou-se, a confiança nos líderes é cada vez menor, há cristalização das propostas e dos métodos, e bloqueios à renovação e a uma correspondência com mudanças étnicas e culturais da sociedade. Começa a ser difícil sair deste beco e é mais do que provável que pela segunda eleição consecutiva não haja maioria de um só partido, ou sequer de dois. Ou ainda que os três que a possam engendrar não se suportem para garantir sequer meia legislatura. Entrámos, assim, na era das coligações sem sólida tradição de compromisso ou concordância programática capaz de assegurar estabilidade política. Apesar do desemprego baixo e do ritmo a que cresce a economia, a incerteza governativa e o rumo internacional do Reino Unido podem levar alguns, como fez há dias o HSBC, a ameaçar tirar a sede de Londres. Temos assistido à ausência de "Europa" na campanha, embora a pertença à UE seja o assunto decisivo desta eleição. A saída pode custar à economia britânica 300 mil milhões de euros até 2030, com impacto directo na Irlanda, Bélgica, Alemanha, França ou Portugal. Se os conservadores ganharem e formarem maioria, o referendo acontecerá, embora a primeira premissa seja mais evidente do que a segunda, que dependerá do Lib Dem e outros pequenos partidos. Seria uma coligação pró-UE à exceção dos Tories, o que obrigaria Cameron a escolher salvar o governo (votando pela manutenção, como Thatcher em 1975) ou salvar-se no partido (votando pela saída). Qualquer das duas revela igual padrão: a gestão danosa de Cameron para o Reino Unido e para ele mesmo.