Gasolineiras acusam governo de "suspeita permanente" sobre setor
O governo prometeu que a redução do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP) num valor equivalente à descida do IVA para 13% se traduziria, a partir desta segunda-feira, dia 2 de maio, num desconto de 15,5 cêntimos na gasolina e de 14,2 cêntimos no gasóleo. Na verdade, a descida foi menor, já que, diz a Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas (Apetro), nas suas contas, o executivo não teve em conta a subida das cotações internacionais dos produtos refinados nem a desvalorização do euro, que vieram "atenuar" a descida do ISP. E lamenta que "estejam constantemente a ser lançadas suspeições sobre o setor".
António Comprido, secretário-geral da Apetro, refere-se às publicações do primeiro-ministro, logo pouco depois das 8.00 da manhã de segunda-feira, no Twitter, de que a ASAE iria estar atenta à aplicação da redução do ISP, mas recomendando a todos os portugueses que olhassem "com atenção" para a fatura, "de modo a garantir que o desconto é mesmo aplicado". E os primeiros dados da fiscalização da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica mostram que só um caso de alegado incumprimento foi detetado. Mesmo assim, o ministro do Ambiente já veio garantir que o governo "não hesitará em atuar" caso se venham a comprovar incumprimentos na redução do ISP. Mas não especificou que "medidas extraordinárias" poderão vir a ser tomadas.
Em comunicado, a ASAE admite que recebeu cerca de 200 denúncias sobre a matéria e que estão em fase de averiguação. No entanto, e até ao momento, o que encontrou foi a "aplicação correta da redução do ISP na maioria das situações e apenas uma situação de alegado incumprimento, a qual será comunicada à Autoridade Tributária".
Explica a ASAE que dos 71 postos de abastecimento fiscalizados, a nível nacional, encontrou variações de preços de venda ao público que vão desde "um mínimo de 0% (sem alteração) e um máximo de menos 9,3%", correspondendo a uma descida "máxima de 18 cêntimos por litro".
Já a Apetro lembra que a redução do ISP, antes de IVA, é de 12,6 cêntimos por litro na gasolina e de 11,5 cêntimos por litro no gasóleo, tal como definido pela portaria publicada na passada sexta-feira. "Mas, entretanto, nos mercados internacionais, fruto da valorização dos produtos [petrolíferos] e da desvalorização do euro, a gasolina sofreu um incremento de 3,6 cêntimos e o gasóleo de 2,8 cêntimos por litro que, obviamente, atenuaram a descida do ISP", diz António Comprido, explicando que, após a aplicação do IVA sobre o preço da cotação e do ISP, a variação final do preço ao consumidor deveria ser uma descida de 11,3 cêntimos na gasolina e de 10,7 cêntimos no gasóleo.
A Associação garante, ainda, que comparou a evolução dos preços, entre domingo e segunda, num conjunto de postos selecionados - são 3200 a nível nacional - e concluiu que as descidas na gasolina variaram entre os 10 e os 13,5 cêntimos e no gasóleo foram dos 10 aos 15,5 cêntimos de redução. "Números perfeitamente compatíveis com o impacto que teve a descida do ISP e a subida dos refinados", refere, sublinhando que "é completamente falso que os operadores estejam a apropriar-se de qualquer valor adicional de margem".
Questionada a Galp, o maior operador do mercado e que ontem apresentou contas, fonte oficial garante que "a Galp repercutiu integralmente a descida do ISP sobre o gasóleo e a gasolina a partir das zero horas de segunda-feira, como não podia de forma alguma deixar de fazer". Assegura ainda que "refletiu rigorosamente" a diferença entre as cotações médias do gasóleo e da gasolina da semana passada face às da semana anterior, em euros, "como faz todas as semanas, tanto em períodos de subida como de descida das cotações".
No caso específico desta semana, o efeito conjunto da subida das cotações médias dos refinados associado à desvalorização do euro face ao dólar, "teve um impacto próximo dos quatro cêntimos por litro" em cada um dos combustíveis e, por isso, a Galp desceu a gasolina em 11,5 cêntimos e o gasóleo em 10,2 cêntimos.
Questionada pelo DN/Dinheiro Vivo sobre eventuais queixas de consumidores, a Deco Proteste admite que tem "poucas reclamações", precisando que são cerca de uma dúzia. Não incidem propriamente sobre o preço final, denotando sim "incompreensão/desconhecimento sobre a formação do preço e sobre a forma como o desconto funciona sobre o imposto".
Considerando que a questão da "pesada fiscalidade" sobre os combustíveis deve ser abordada de forma estrutural, a Deco Proteste considera que "não é legítimo que o governo aumente a sua receita fiscal além do orçamentado em resultado de uma crise energética e, por isso, considera que está em dívida para com os consumidores". Além disso, defende que "a parcela correspondente aos biocombustíveis, pela sua natureza, não deve estar sujeita a ISP, e que a componente de contribuição para o serviço rodoviário deve manter a neutralidade fiscal, tal como definido na lei".