Fundador da República Islâmica regressou ao Irão do exílio há 40 anos

O ayatollah Ruhollah Khomeini regressou ao Irão faz na sexta-feira 40 anos, após 14 anos de exílio, e foi recebido triunfalmente num prenúncio da proclamação da República Islâmica exatamente dois meses depois.
Publicado a
Atualizado a

De "rostos radiosos" e "concentrados em mais de 32 quilómetros" milhões de iranianos receberam nas ruas de Teerão a 1 de fevereiro de 1979 o líder religioso, "cujo carro esteve imerso durante horas numa maré humana em delírio", descreveu na altura um dos enviados especiais da agência France Presse, Patrick Meney.

Aos 76 anos, Khomeini regressou ao país duas semanas após crescentes protestos terem forçado o Xá Reza Pahlavi a abandonar o Irão. Um avião fretado da Air France transportou-o desde Paris, juntamente com vários apoiantes e cerca de 150 jornalistas.

A França foi o seu último país de exílio, onde esteve apenas um ano, depois de passar primeiro pela Turquia e depois pelo Iraque, após ter sido forçado a abandonar o Irão em 1964.

Foi no Iraque, na cidade santa xiita de Najaf, que Khomeini desenvolveu a teoria do "governo do jurista muçulmano ("Velayat-é faqih"), consagrando o poder de um ulema escolhido para dirigir o Estado e a comunidade de crentes, princípio na base da República Islâmica.

O avião aterrou às 09:00 locais e alguns minutos mais tarde o primeiro Líder Supremo dos iranianos dirigia-se aos seus concidadãos: "A luta não acabou, a partida do Xá é apenas a primeira parte do caminho a fazer", disse, segundo a AFP.

"O Xá destruiu tudo, a nossa cultura, a nossa universidade, a economia, a agricultura. Demoliremos o sistema que ele criou", prometeu Khomeini na mesma altura.

Patrick Meney contou que "as mulheres vieram com o 'chador' (véu negro), um cravo vermelho na mão" e que cantavam desde o amanhecer "Khomeini é o nosso líder".

"Chorávamos de alegria, mas também tínhamos muito medo", recorda à AFP 40 anos depois o agricultor de 62 anos Golberar Naghipour. "O país ainda estava sob o controlo do regime do Xá", explica.

Khomeini não ignorava os riscos que corria, segundo o seu assessor no exílio em Paris Sadegh Ghotbzadeh, que disse aos jornalistas durante o "voo da revolução" que levou o ayatollah de Paris até Teerão que Khomeini tinha reunido os "seus fiéis" antes da partida para um alerta.

"Esta viagem envolve riscos que não subestimo: posso ser assassinado. Posso ser preso. Posso ficar em prisão domiciliária", terá dito Khomeini segundo o seu assessor citado pela AFP na altura.

Mas, segundo Patrick Meney, os militares abandonaram a capital naquele dia e numa Teerão "ensolarada (...) soa um único clamor: Khomeini, Khomeini".

Nascido em 1902 no centro do Irão, Ruhollah ("espírito de Deus) Khomeini segue estudos religiosos e só se envolve na política em 1962, aos 60 anos, criticando as medidas do Xá para modernizar as zonas rurais do país. Em 1963 alerta Reza Pahlavi para o risco de ser derrubado pelo povo e em 1964 é detido e forçado ao exílio.

Dos subúrbios de Paris conduz a fase final da sua luta, cassetes com discursos de violento ataque ao Xá chegam aos seus partidários no Irão, onde a repressão das manifestações leva cada vez mais iranianos para as ruas, muitos comunistas e nacionalistas laicos.

A revolução é considerada vitoriosa a 10 de fevereiro, quando as forças armadas renegam o regime do Xá, e a República Islâmica é proclamada a 1 de abril.

A legislação do país é baseada na 'sharia' (lei islâmica) e a nova constituição cria o cargo de Líder Supremo, a mais alta autoridade política e religiosa da nação, que Khomeini ocupa até à morte em junho de 1989.

Pouco antes da sua morte, o austero ayatollah lança uma 'fatwa' (decisão jurídica baseada na lei islâmica) apelando ao assassínio do escritor Salman Rushdie devido ao livro "Versículos Satânicos", que considera blasfemo.

A imagem de Khomeini continua espalhada por todo o país, frequentemente ao lado do atual Líder Supremo, Ali Khamenei, que lhe sucedeu. O mausoléu do que é considerado o pai da República Islâmica, no sul de Teerão, recebe anualmente milhões de iranianos e tornou-se um local de peregrinação.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt