Frente Favela Brasil nasce para "romper as barreiras"
Num país com quase 30 partidos no Congresso Nacional e mais 56 à espera de legalização, é difícil ser notícia por fundar uma nova força política. Mas o Frente Favela Brasil (FFB), que se apresentou na segunda-feira no carioca Morro da Previdência, a mais antiga favela brasileira, conseguiu. Com o objetivo de representar os 15 milhões que moram em comunidades carenciadas e a maior parte dos 54% de cidadãos que se declaram negros ou pardos [a expressão oficial para definir descendentes de brancos, negros e ameríndios miscigenados], a FFB tem potencial para baralhar as contas nas eleições de 2018.
"Representamos os negros e os moradores de favela, pretendemos dar poder a quem só é usado eleitoralmente", disse ao jornal El País Brasil Celso Athayde, idealizador do movimento e um dos porta-vozes do grupo [ver caixa]. "Todos os partidos dizem que vão governar em nome dos marginalizados e oprimidos, o que propomos é que os marginalizados e oprimidos façam o seu próprio governo", prosseguiu o empresário de 54 anos em reportagem do HuffPost Brasil.
Além de segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 54% da população brasileira se declarar negra ou parda, o Ministério das Cidades estima que nas favelas espalhadas pelo país morem perto de 15 milhões de brasileiros e dados do Instituto Data Brasil, empresa fundada por Athayde, calculam que essas comunidades gerem um PIB de 70 mil milhões de reais [quase 20 mil milhões de euros] por ano. "Somos do tamanho da Bolívia e temos a economia do Paraguai", disse à Agência Brasil Anderson Quack, coordenador do partido no Distrito Federal.
"E, no entanto, os negros que estão na política resumem-se a uma salinha reservada para eles", lamenta Athayde, referindo-se, entre outros, ao "tucanafro", pequeno núcleo do PSDB para políticos negros. O fundador da FFB pergunta "se em 513 deputados federais não pode haver, pelo menos, uns 100 negros?". "Nós não queremos revanche, nem inverter a lógica, não recusamos brancos no partido, nem desejamos tirar os não negros do poder mas queremos que as nossas exigências sejam ouvidas e votadas".
Para atrair quadros para a FFB, Athayde vai fazendo prospeção em favelas: "Buscamos líderes que se sintam potentes, não que se sintam carentes e impotentes". O partido pretende que 50% dos seus membros sejam mulheres e que também um em cada dois militantes tenha de 18 a 35 anos e abre espaço à heterogeneidade. Na copresidência do partido estão Patrícia Alencar, do Morro do Papagaio, em Belo Horizonte, educadora e candomblecista, e Wanderson Maia, cientista político, católico, homossexual, criado nos subúrbios do Rio. Os vice-presidentes são uma indígena do Pelourinho, no centro de Salvador, e um pastor evangélico da favela de Vila Clara, em São Paulo. "Os negros e favelados estão na periferia da política, é a classe branca e burocrática que legisla no nosso nome, está na hora de romper essas barreiras", defende o copresidente.
Ao longo da semana, representantes da FFB foram a Brasília entregar os papéis para formar o partido e iniciar o processo de recolha das 510 mil assinaturas necessárias. Os membros do FFB são voluntários e, caso eleitos deputados ou senadores, devem doar metade do ordenado a um fundo dedicado a projetos sociais nas favelas. Candidato próprio à presidência? Para já nada decidido. E à pergunta se o partido é de esquerda ou de direita, Anderson Quack responde "nem esquerdista, nem direitista, favelista".
Em São Paulo