Francisco: o Papa argentino que ainda não regressou à Argentina

O facto de o ex-cardeal Jorge Bergoglio ser uma figura política, não só religiosa, na sua terra natal terá influenciado a ausência até agora. Antes de festejar cinco anos de pontificado, terá visitado nove dos 12 países da América do Sul
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Em janeiro, a dois meses de completar cinco anos de pontificado, Francisco viaja até ao Chile e ao Peru. Nessa altura terá visitado nove dos 12 países da América do Sul. Mas nem uma só vez o Papa argentino voltou à sua terra natal, onde mais do que uma figura religiosa é também uma referência política. E essa poderá ser a razão da ausência do líder da Igreja Católica, que além de falhar em 2018 (o Papa já tem 80 anos e não é hábito regressar ao mesmo continente duas vezes num ano) deverá também evitar voltar à Argentina em 2019, quando há presidenciais.

O jesuíta Jorge Mario Bergoglio, então arcebispo de Buenos Aires, deixou a capital argentina em finais de fevereiro de 2013 para participar no conclave, em Roma, que iria escolher o sucessor de Bento XVI. Acabaria por se tornar o primeiro Papa oriundo da América Latina e, desde então, não regressou à Argentina, apesar de receber frequentemente várias personalidades e anónimos do seu país e manter o seu fanatismo pelo futebol argentino.

"Ele tem um sentimento muito profundo com a Argentina, ama este país. O seu lugar no mundo é Buenos Aires, mas daí a estar pendente da Argentina, de se tem de vir ou não e quando é outra coisa. O Papa é argentino mas não é dos argentinos", disse à agência EFE a jornalista Alicia Barrios, autora do livro O Meu Amigo o Padre Jorge - conhecem-se há duas décadas - e do programa de rádio A bergogliana.

Numa mensagem de vídeo de setembro, o próprio Papa disse: "Para mim, o povo argentino é o meu povo. Vocês são importantes, eu continuo a ser argentino. Ainda viajo com passaporte argentino", referiu, indicando não ser possível visitar o país em 2017 por já ter compromissos na Ásia e em África. "O mundo é maior do que a Argentina."

O Papa esteve no Brasil em julho de 2013 (para a Jornada Mundial da Juventude, que já estava prevista) e na Bolívia, no Equador e no Paraguai em julho de 2015. Para setembro de 2017 já está prevista uma visita à Colômbia, tendo Francisco dito que queria visitar o país depois de o Vaticano ter participado nas negociações de paz com a guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Em janeiro de 2018, viajará para o Chile e para o Peru. Dos países que fazem fronteira com a Argentina, só não terá visitado o Uruguai.

Além dos nove países da América do Sul, Francisco também já esteve em Cuba, em setembro de 2015 e em fevereiro de 2016, tendo seguido na primeira viagem para os EUA e na segunda estado também no México. Em 2019 já está prevista uma ida ao Panamá, para a Jornada Mundial da Juventude.

Desde que foi eleito Papa que os argentinos dão como certo que Francisco não visitaria a Argentina em ano ímpar - isto é, em ano eleitoral. De origem política peronista, o ex-arcebispo de Buenos Aires foi durante muitos anos visto como um opositor ao kirchnerismo (Néstor e Cristina Kirchner estiveram na presidência entre 2003 e 2015). Mas isso não significa que tenha uma boa relação com o presidente Mauricio Macri, que não é peronista. A foto do primeiro encontro do Papa com Macri (já tiveram dois) mostrava Francisco particularmente tenso.

Muitos políticos usam as fotos com o Papa, ou cartas ou chamadas que recebem dele para autopromoção. De tal forma que em abril Francisco terá dito à chefe da diplomacia argentina Susana Malcorra que até às eleições legislativas de outubro não iria receber mais políticos do país. "O Papa não apoia, não defende nem postula nenhum candidato político. Os que dizem que os apoia são uma farsa", indicou a amiga Alicia Barrios noutra entrevista à rádio Rivadavia.

"A mim, Francisco disse-me em finais do ano passado que virá à Argentina quando perceber que é um fator de unidade, quando sentir que a sua visita vai construir uma ponte entre todos os argentinos", disse ao jornal digital Infobae outro amigo do Papa, Gustavo Vera, líder da organização social La Alameda e deputado em Buenos Aires. Com a sua presença, Francisco não quer aumentar mais a divisão entre kirchneristas e antikirchneristas.

A situação era bastante diferente para os anteriores papas, ambos europeus: João Paulo II visitou nove vezes a sua Polónia natal, a primeira vez logo no ano a seguir a ser eleito, sendo reconhecido pelo seu papel no fim do comunismo no seu país. Já a primeira visita fora de Itália de Bento XVI foi precisamente à Alemanha, para a Jornada Mundial da Juventude, que já estava prevista. Voltaria mais duas vezes ao país antes de abdicar do cargo.

Planos de viagem
Colômbia

› Francisco irá à Colômbia de 6 a 11 de setembro, visitando Bogotá, Villavicencio, Medellín e Cartagena. O Vaticano ajudou a negociar o acordo de paz com as FARC, pondo fim a 50 anos de conflito. "Vamos dar o primeiro passo" é o mote da viagem. João Paulo II, conhecido como "Papa peregrino", foi o último a visitar o país, em 1986.

Chile

› De 15 a 18 de janeiro de 2018, o Papa fará uma viagem apostólica ao Chile, passando por Santiago, Temuco e Iquique, a convite da presidente Michelle Bachelet, que nessa altura já terá deixado o cargo. O Papa peregrino" esteve neste país em 1987.

Peru

› Papa segue depois para o Peru, onde ficará até 21 de janeiro, visitando Lima, Puerto Maldonado e Trujillo. João Paulo II visitou o Peru em 1985 e 1988.

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