Às vezes há mais semelhanças entre países do que parece à primeira vista. Aparentemente, a União Europeia, incluindo Portugal (mas com a significativa exceção da Grécia), está a regressar a uma certa normalidade após a crise do euro e o incremento no apoio a partidos de extrema-direita. O Reino Unido, pelo contrário, permanece em alvoroço na sequência de umas eleições gerais inconclusivas..O brexit - que inicialmente causou tanta consternação nas capitais da UE, incluindo Lisboa - há muito tempo perdeu o domínio da atenção do público europeu, enquanto no Reino Unido continua a ser uma obsessão..A primeira-ministra Theresa May convocou eleições para 8 de junho supostamente para fortalecer a sua posição nas negociações com a UE. Mas a sua campanha desastrosa para as chamadas "eleições do brexit" mal tocou no assunto, em vez disso prometeu um "governo forte e estável" e algumas novas políticas que mostraram ser muito impopulares..O tiro saiu-lhe espetacularmente pela culatra quando o seu partido perdeu a maioria "estável" no Parlamento, em vez de a aumentar. Para se manter no poder, ela prometeu mil milhões de libras extra para a Irlanda do Norte para garantir o apoio do Partido Unionista Democrático (DUP) daquela província, cujo extremo conservadorismo social assusta muitos membros do seu próprio partido..Quanto ao brexit, em relação ao qual ela estava a ter uma abordagem de confronto, a perda da maioria e a insistência do DUP numa fronteira aberta entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda foi obrigada a uma clara mudança de posição, reabrindo, por sua vez, as feridas internas do seu partido na Europa..O Partido Trabalhista na oposição rotulou alegremente o acordo com o DUP como "uma coligação do caos" - uma frase originalmente inventada pelos conservadores para alertar sobre o perigo de a votação nos trabalhistas poder significar a aliança destes com o Partido Nacionalista Escocês..Agora, é claro, o Partido Trabalhista gostaria de criar uma geringonça própria e prometeu apresentar um programa de governo alternativo ao Parlamento. Não é evidente que isso possa funcionar. No entanto, poucos eleitores querem novas eleições.."Recuperar o controlo" foi o slogan usado por aqueles que fizeram campanha para deixar a UE no referendo do ano passado. Mas agora muitas pessoas sentem que ninguém está no controlo ou, pelo menos, ninguém competente..Esse sentimento foi reforçado este mês, quando o incêndio mortífero da Torre Grenfell em Londres expôs os lapsos chocantes na elaboração e implementação de padrões de segurança contra incêndios pelo governo nacional e local..Para muitos, as revelações sublinharam a importância do papel do Estado e dos regulamentos na proteção do bem-estar e da vida das pessoas. Os conservadores que durante anos prometeram "uma fogueira de burocracia" (eliminando o que viam como burocracia excessiva) não usarão essa frase em particular novamente, quanto mais não seja por uma questão de bom gosto..Esta semana, outro escândalo funesto voltou às notícias, quando seis pessoas foram acusadas de crimes graves relacionados com o desastre de Hillsborough em 1989. Um ex-polícia, David Duckenfield (que alegadamente possui uma casa em Portugal), foi acusado de homicídio involuntário de 95 pessoas que morreram esmagadas no estádio, enquanto um colega foi acusado de má conduta num cargo público por mentir sobre os seus atos..Ao longo de décadas, o caso minou a confiança do público na polícia..Em Portugal, o fracasso do Estado e dos seus agentes em assegurar a segurança dos cidadãos em Pedrógão Grande levou muitos a questionar a competência das autoridades em vários níveis, sejam quais forem as instituições ou indivíduos que possam vir a acabar por partilhar a responsabilidade pelo que correu mal..No Reino Unido, o enorme aumento da votação e de lugares no Parlamento do Partido Trabalhista nas recentes eleições é visto em parte como uma reação contra a austeridade e, em Portugal, o Partido Socialista melhorou a sua posição nas sondagens virando a página da austeridade. Mas a verdade é que, em ambos os países, mesmo as pessoas que desejam um estado que corta menos e gasta mais, querem um estado que o faça com competência e eficácia, bem como com humanidade..Correspondente da BBC News