Fomos à guerra, mas estava fechada
Em dezembro de 2007 cheguei ao Kosovo, de autocarro, vinda da Antiga República Jugoslava da Macedónia. Estava iminente a declaração unilateral da independência kosovar. As televisões internacionais falavam em grande tensão e até na hipótese de uma nova guerra. Em reportagem para o DN, com o fotojornalista Orlando Almeida, fomos à procura dessa realidade. E o que encontrámos mostra porque é imprescindível ir ao terreno ver o que se passa com os próprios olhos. Era notório que existia - e continua a existir - tensão entre grupos étnicos, sobretudo albaneses e sérvios, era óbvio que estes viviam vidas paralelas, por exemplo na cidade de Mitrovica. Mas guerra, guerra, não havia. Estava fechada, como diria Raul Solnado, na sua adaptação do sketch "A Guerra de 1908". Muitos acusam os jornalistas de só procurarem sangue e tragédia e, se assim fosse, teríamos ficado desiludidos. O que ficámos foi surpreendidos. Com uma população extremamente jovem. As gerações mais velhas tinham sido dizimadas pela guerra do passado. Extremamente sonhadora. Jovens que não queriam saber de ouvir falar em guerra. Mas sim de estudar. Viajar. Poder ir trabalhar para outros países da UE ou para os EUA. Que treinavam já na futura seleção de futebol. Mesmo se o campo disponível na altura era de lama e pedaços de relva. Jovens que sonhavam em ter emprego. Poder pedir um crédito para comprar casa. Formar família. "És de Portugal?! Conheces o Cristiano Ronaldo?! Diz-lhe que gosto muito dele", pediu-me uma universitária que encontrei a caminho da Biblioteca Nacional em Pristina. Dois meses depois, a 17 de fevereiro de 2008, o Kosovo declarou-se independente da Sérvia. Guerra, guerra, pelo menos não voltou a haver. O que foi feito com essa independência é, porém, toda uma outra história.