FMI e patrões alinhados nas 35 horas e no salário mínimo

Aplicar nas empresas privadas o que o Estado vai repor no setor público está fora de causa para patrões. Mexer no salário mínimo também. Subir Lall faltou, mas deixou recados
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Os patrões recusam qualquer tentativa para replicar no setor privado o horário semanal de 35 horas que o governo vai repor no Estado. E deixaram bem clara esta mensagem na reunião que os parceiros sociais realizaram ontem com técnicos do Fundo Monetário Internacional. Futuras mexidas no salário mínimo foram também abordadas, até porque o FMI lançou vários recados ainda antes da reunião começar.

Num encontro que durou mais de duas horas e que ficou marcado pela ausência polémica de Subir Lall, o chefe de missão do FMI para Portugal, a CGTP acusou o organismo liderado por Christine Lagarde de "estar alinhado com a promoção de política de desigualdade e de empobrecimento" e de defender uma política de baixos salários.

Do lado dos patrões, o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) vincou as "linhas vermelhas" em matéria de legislação laboral. Uma delas tem que ver com as 35 horas. No final do encontro, António Saraiva afirmou "não estar disponível para discutir a aplicação desta medida no setor privado". Lá dentro já tinha referido tratar-se de um tema "que a CIP admita sequer abordar".

António Saraiva considerou que "não faz sentido" a redução do horário na função pública - medida que entra em vigor na sexta-feira. Uma posição surge alinhada com a dos técnicos do FMI. Num relatório sobre Portugal, assinado por Subir Lall e mais dois técnicos, o FMI advertiu que o regresso às 35 horas na função pública vai implicar o aumento de gastos em horas extraordinários e também poderá indiciar que o setor público "está sobredimensionado". O custo da medida ainda não é conhecido.

António Saraiva também duvida que, ao contrário do que garante o governo, as 35 horas não impliquem perda de qualidade ou quantidade nos serviços públicos porque, se assim fosse, "seria sinal de que a produtividade dos trabalhadores públicos está afinal muito aquém do seu potencial". João Vieira Lopes, da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, classifica como "desastrosa" a aplicação generalizada das 35 horas.

Entre as mudanças laborais que a CIP recusa mudar incluem-se ainda o aumento do número de dias de férias, o regime da contratação a termo (que o governo quer alterar) e do trabalho temporário ou a sobrevigência e caducidade das convenções coletivas de trabalho. E no salário mínimo (SMN), António Saraiva apenas aceitará negociar novos aumentos à luz do andamento da produtividade e da monitorização que for sendo feita. Tal como decorre do acordo assinado em janeiro deste ano. O primeiro-ministro, António Costa, já sinalizou que o SMN deve aumentar para os 600 euros até ao final da legislatura, mas os patrões não querem vincular-se a aumentos predefinidos. As centrais sindicais, por seu lado, salientam que o recente aumento revelou ter tido impacto marginal no desemprego e que foi acompanhado de ganhos de produtividade. Além disso, lembrou a representante da UGT, o mais recente estudo de impacto do SMN revelou que não implicou um arrastamento da massa salarial.

O salário mínimo é outro dos temas que tem merecido sérias reservas ao FMI. Este último relatório afina pelo mesmo discurso, acentuando que em Portugal há tendência para usar o SMN como instrumento de combate à pobreza, mas que existe "uma ligação fraca" entre os dois fatores.

"Portugal deve apoiar a criação de emprego dos trabalhadores com mais baixas qualificações, combinando reformas direcionadas para essas pessoas com uma política de salário mínimo prudente", defendeu Subir Lall, em entrevista à Lusa.

A atribuição de um crédito fiscal a pessoas de baixos rendimentos "tende a ser mais eficiente a reduzir a pobreza" do que a subida do salário mínimo, dizem os técnico do FMI. O crédito fiscal é uma das medidas que integra o programa do governo, mas a medida só deverá começar a ser aplicada em 2018.

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