Flotilha para proteger Europa de mísseis está completa
Mal acabaram de tocar no cais de Rota os hinos espanhol e americano, saudando o USS Carney e a tripulação comandada pelo capitão Ken Pickard, seguiram-se os discursos da praxe, mas com uma mensagem importante: com a chegada deste destroyer completa-se o conjunto de quatro navios que assegurará no Mediterrâneo o projeto MBD (defesa contra míssil balístico), baseado no sistema de combate Aegis, que inclui potentes radares, capazes de detetar ameaças e desencadear de imediato o disparo de mísseis antimísseis. Foi o que relembrou o almirante Mark Ferguson, chefe máximo da Marinha americana na Europa e África, que falou de "uma maravilha da tecnologia", perante quem viu aportar o navio por volta das 12.30, depois de um compasso de espera no golfo de Cádis. Estiveram também presentes os almirantes espanhóis Franco Suances e Jaime Muñoz-Delgado, que elogiaram o empenho dos EUA em garantir que a NATO "protege todos os aliados contra todos os inimigos".
No mastro principal do USS Carney, um conjunto de coloridas bandeiras cumprimentava quem está no cais. "HOLA ROTA, é o que dizem", descodificou o segundo em comando do navio, Peter Halvorsen. Na enorme base espanhola na Andaluzia, que os EUA ocupam em parte desde o tempo do franquismo, são mais de quatro mil os militares americanos, mas com a chegada deste destroyer (que se junta ao USS Cook, ao USS Ross e ao USS Porter), o número de envolvidos com o sofisticado sistema Aegis atinge os 1200, incluindo cem civis.
Baseada em Rota, a flotilha de que faz parte o USS Carney terá agora em permanência dois navios ao serviço do Aegis e dois noutra missão momentânea ou no estaleiro da base espanhola para revisão. "A área de nossa atuação será no Mediterrâneo e proximidades" explicou, ainda a bordo, o capitão Pickard, sem dar mais pormenores. Há duas décadas na Marinha, e no currículo com outras missões no Mediterrâneo mas também no Médio Oriente, deverá regressar aos Estados Unidos e deixar o comando do USS Carney depois de completar este destacamento.
Esta é uma missão complexa, com instalações de radares Aegis também a serem construídas na Roménia e na Polónia, destinada a proteger a Europa de eventuais ataques com mísseis balísticos disparados do Médio Oriente, nomeadamente do Irão (apesar do acordo sobre o nuclear). A Rússia, porém, tem contestado o BMD, alegando que desrespeita os acordos e dando a entender que se considera o verdadeiro objetivo. Fala-se também do risco de o Estado Islâmico - Ferguson referiu-o ontem sem especificar - se apoderar de mísseis balísticos com capacidade para atingir a Europa.
O USS Carney partiu de Mayport, na Florida, no dia 6. E fez uma escala de algumas horas em Ponta Delgada a 22 para reabastecimento. Pelo meio, uma rotina apertada, cumprida com rigor por marinheiros cujos rostos e nomes no uniforme mostram a diversidade étnica da população americana, e são tanto homens como mulheres. Treinos constantes foram feitos, seja de combate a um fogo no navio seja de abordagem a uma embarcação suspeita. A bordo seguia uma tripulação de 300 pessoas, entre marinheiros e oficiais. Alguns conhecem bem Rota, como é o caso de Nasy Tun, americano de origem cambojana que se casou com uma espanhola e tem casa perto da base. E há também quem venha instalar-se pela primeira vez, como é o caso do oficial Halvorsen, cuja família estava à espera no cais, os dois filhos pequenos e a mulher grávida.
As cerimónias oficiais tiveram de esperar uns bons minutos até acabarem os abraços e beijos entre marinheiros e famílias. Para desespero de uma americana (e a filha de 6 anos), logo o pai foi um dos tripulantes que tiveram de estar de guarda no USS Carney até ao final dos discursos. E apesar dos acenos cá do cais, o militar manteve-se impassível lá em cima, como manda a disciplina. No final, foi vê-los a encontrar-se em festa a meio da escada que dava acesso ao navio.
Para alguns marinheiros americanos, esta é a primeira grande aventura da sua vida militar. Como David Nelson, que teve os estudos de Biomedicina na universidade pagos pela Marinha, e agora começa a sério a carreira, ambicionando ser médico de bordo. Sabe tudo sobre a importância estratégica do Aegis, mas está também entusiasmado com a ideia de conhecer a Europa. E não pensa falhar Portugal: "Lisboa fica só a cinco horas de carro? Tenho de lá ir", diz o texano, de 22 anos.